Sexta, 28 de junho de 2013
Por Ivan de Carvalho
Está
evidente que os políticos foram apanhados completamente de surpresa pela onda
de manifestações populares de rua desencadeada a partir da passeata convocada
pelo Movimento Passe Livre, de São Paulo, por intermédio das redes sociais da
Internet. E muitos deles estão se desdobrando para ficarem bem ou, tarefa mais
exequível, não ficarem muito ruins na fita.
Alguns
prefeitos e governadores baixam tarifas de transporte coletivo que haviam
acabado de aumentar e até o momento têm se restringido a esse tipo de medidas,
às quais se acrescenta apenas o milagroso surgimento da polícia nas ruas,
coincidentemente nas cercanias das manifestações populares – polícia que antes
das passeatas andava sumida no país inteiro, há muito entregue à criminalidade.
Levar a população
a redescobrir que existe polícia e, ainda por cima, capaz de atuar com certa
eficácia – reprimindo manifestantes ordeiros e baderneiros infiltrados em
manifestações pacíficas, prendendo alguns deles e também bandidos que
aproveitam a situação para saquearem casas comerciais – já é um benefício a ser
creditado ao movimento popular em curso. A polícia existe. Existe, gente, ela
existe.
Mas, se
prefeitos e governadores baixam tarifas e estes últimos dizem um abracadabra
que faz aparecerem as polícias, o ambiente de barata voa é muito mais notório
no Palácio do Planalto e no Congresso Nacional. Foi de dois pronunciamentos
sobre as manifestações populares, impressionou a reunião convocada pela
presidente Dilma Rousseff para, ante 27 governadores e 26 prefeitos de
capitais, fazer o terceiro discurso. Ela falou, falou, apresentou propostas –
algumas abiloladas, a exemplo da inviável convocação da “Constituinte
exclusiva” para fazer a reforma política, da qual desistiria já no dia seguinte
–, não passou a palavra a sequer um representante dos governadores ou dos
prefeitos – uma certa falta de gentileza ou educação, eu diria – e então as
câmeras de televisão foram desligadas. A reunião continuou, digamos, no escuro,
longe dos olhos e ouvidos da população.
Já no
Congresso, a tendência é outra. Há um esforço imenso para mostrar serviço, para
aparecer fazendo coisas, aprovando ou rejeitando propostas de normas legais,
conforme as julguem simpáticas ou antipáticas à opinião pública. Porque, como a
população descobriu que a polícia existe, deputados e senadores (e os políticos
em geral) descobriram que a opinião pública também existe. Um terrível
incômodo, mas ela existe, gente, ela existe.
Assim foi
que a PEC 37 (a emenda constitucional que retirava do Ministério Público o
poder de investigar e daria grande impulso à impunidade) foi rejeitada pela
Câmara, quase à unanimidade e arquivada. Assim foi que o Senado deu o golpe
publicitário de aprovar, ligeirinho, a destinação dos “royalties do pré-sal” para educação (75 por cento) e saúde, que não
estava no script nem do Congresso nem
do governo (25 por cento).
Mas por que golpe publicitário?
Primeiro, porque esses royalties só
terão alguma expressão financeira no final da década e a saúde precisa de amplo
socorro imediato. Segundo, porque no caso específico do pré-sal, não haverá royalties sobre o petróleo que a
Petrobrás extrair e nem sobre o que extraírem empresas terceirizadas por ela.
Somente sobre o petróleo extraído por empresas vitoriosas em leilões,
desvinculadas do complexo Petrobrás e suas terceirizadas, pagará royalties. Isso acaba rendendo uma
ninharia, se render alguma coisa.
Na aflição para tirar o foco do
movimento popular e minimizar suas consequências, o Palácio do Planalto, com o
beneplácito de sua base de apoio, especialmente no Congresso, quer tirar de
foco o protesto sobre o aumento dos preços dos produtos e serviços (inflação),
a péssima qualidade dos serviços públicos padrão Brasil (a exemplo de saúde,
segurança, educação e transportes coletivos), corrupção e má aplicação do
dinheiro público – a exemplo dos mais de R$ 7 bilhões gastos somente com os
estádios padrão Fifa. E então traz mais uma vez ao palco a reforma política,
com ingredientes que a fazem parecer uma coisa de doidos.
Este artigo foi publicado originariamente na Tribuna da
Bahia desta sexta.
Ivan de Carvalho é jornalista baiano.