A análise da Conjuntura
da Semana é uma (re)leitura das Notícias do Dia publicadas diariamente no sítio
do IHU. A análise é elaborada, em fina sintonia com o Instituto Humanitas
Unisinos – IHU, pelos colegas do Centro de Pesquisa e Apoio aos Trabalhadores –
CEPAT com sede em Curitiba-PR e por Cesar Sanson, professor na Universidade
Federal do Rio Grande do Norte – UFRN.
CEPAT-IHU
Sumário:
Uma copa anti-popular
Comitês Populares da Copa: Resistência e potência
Lei Geral da Copa – Cavalo de Tróia
FIFA. Uma grande multinacional despótica
Remoções arbitrárias e o legado oculto
Cidades privatizadas. Sociedade submetida à lógica do capital
Elitização e privatização do futebol
*****
Uma copa anti-popular
Não é exagero afirmar que
a realização da Copa do Mundo no Brasil encontra-se ameaçada. Uma pergunta
persegue e preocupa o governo, a FIFA e os organizadores do evento: Como serão
as manifestações durante Copa do Mundo? Já não há dúvidas de que haverá
manifestações durante o Mundial. A dúvida é o tamanho das mesmas, o receio da
necessidade de colocar o exército nas ruas, o uso desmedido da ‘mão pesada’ do
Estado que pode arruinar a imagem do país lá fora, já agravada pós-Copa das
Confederações.
Seis anos atrás quando o
Brasil foi escolhido para sediar a Copa do Mundo de 2014, certo ufanismo tomou
conta do país. Já faz tempo, porém, que a Copa deixou de ser uma unanimidade e
se torna cada vez menos na medida em que se toma conhecimento dos desmandos que
a envolvem.
Nesses dias, o acidente com
um guindaste na Arena Corinthians e a morte de dois operários maculou ainda
mais a realização da Copa do Mundo no Brasil. Às mortes de trabalhadores
somam-se uma série de outros problemas: greves, atrasos, remoções, abandono de
projetos de mobilidade, gastos exorbitantes, falta de transparência, imposições
da FIFA etc.
O sinal de que as coisas
não iam bem com a Copa foi dado em junho de 2013 com as grandes manifestações.
As multidões sitiaram as arenas de futebol e manifestaram indignação com a
exorbitância de gastos, com a falta de transparência, com as imposições da
FIFA. As ruas disseram que entre investimentos em estádios e em saúde e
educação, ficam com a segunda opção.
Aos poucos foi crescendo
a percepção na sociedade de que a Copa não passa de um grande negócio. Um
negócio que subordina o Estado brasileiro – a ingerência da FIFA; um negócio
que privatiza espaços públicos, que elitiza os estádios, que expulsa milhares
de seus locais de moradia, que utiliza dinheiro que falta em áreas mais
necessárias.
As manifestações voltarão
às ruas por ocasião da Copa do Mundo, ainda mais com os holofotes do mundo todo
voltados ao Brasil. Há quem inclusive considere possível até inviabilizar a
realização da Copa como o ativista Rodrigo Brizola para quem “não vai ter
copa”. Diz ele: “Depende de nós. Vamos resistir, vamos desobedecer. Pra essa
Copa já começou a resistência, a palavra de ordem é essa: não vai ter Copa. Se
a massa levantar de novo… temos que saber se os movimentos organizados estão
com condições de dialogar com essa massa. Se conseguirmos dialogar com a massa,
não vai ter Copa”.
Independente do que venha
acontecer, quebrou-se o mito do “país do futebol”, o mito de que a Copa do
Mundo é sagrada. As ruas mandaram o recado “da Copa eu abro mão, quero mais
dinheiro para saúde e educação”.
Quem primeiro levantou a
série de equívocos envolvendo a organização do evento foram os Comitês
Populares da Copa. Na raiz dos cartazes de rua criticando o ‘modelo da Copa’
estão os Comitês Populares que denunciaram a Lei Geral da Copa, as remoções, os
gastos absurdos, as imposições da FIFA.
Comitês Populares da
Copa: Resistência e potência
Os Comitês Populares da
Copa foram o embrião daquilo que depois se viu nas ruas. Foram eles que alertaram
para os desmandos na organização do evento. Chamaram a atenção para a
ingerência de fora para dentro com a Lei Geral da Copa, as violações de
direitos, as remoções indevidas, o uso exorbitante e sem consulta popular do
dinheiro público, entre outros.
Em todas as cidades que
sediarão os jogos da Copa do Mundo – Belo Horizonte, Brasília, Cuiabá,
Curitiba, Fortaleza, Manaus, Natal, Porto Alegre, Recife, Rio de Janeiro,
Salvador e São Paulo – foram formados Comitês Populares da Copa.
Em junho desse ano,
alguns dias antes de explodirem as manifestações de rua, a revista IHU On-Line produziu
um número exclusivo sobre a Copa do Mundo. A revista intitulada Copa do Mundo.
Para quem e para quê? entrevistou vários estudiosos e integrantes dos Comitês
Populares da Copa.
Uma leitura atenta da
revista permite a compreensão do que se viu dias depois nas ruas de todo o
Brasil. A tarefa dos Comitês, na opinião da arquiteta e urbanista Claudia
Favaro, integrante do Comitê Popular de Porto Alegre e entrevistada pela IHU
On-Line tem sido a de “monitorar os gastos e ser um agente mobilizador da
sociedade para garantir que os direitos humanos não sejam violados”, uma vez
que todos os megaeventos trazem “impactos muito característicos que ocorrem em
função dessas violações pela necessidade de reestruturação urbana”. Assim, “a
proposta do comitê é articular os atingidos, monitorar as violações e dar voz
aos mais variados setores, principalmente os mais vulneráveis”. Os Comitês
gestaram o início da resistência aos equívocos na organização do Mundial.
Na opinião de Julia Ávila
Franzoni, integrante do Comitê de Curitiba, assessora da Organização Terra de
Direito se também entrevistada pela revista IHU On Line, a principal
contribuição dos Comitês foi o da “produção de um contra discurso que discute
os megaeventos nos marcos do seu modelo de desenvolvimento violador dos
direitos humanos”.
Na origem dos Comitês
Populares da Copa e durante sua articulação foi lançado, em 2011 um Dossiê intitulado
‘Megaeventos e Violações de Direitos Humanos no Brasil’. O dossiê foi entregue
aos governos e prefeituras das doze cidades-sede da Copa, e para outros órgãos
municipais, estaduais, federais e internacionais. Nele estão presentes as
denúncias que irão aflorar posteriormente nas manifestações:
-Moradia: despejos
arbitrários e remoções inteiras em processos ilegais de desapropriação para as
obras da Copa;
-Trabalho: as greves e
paralisações são resultados de baixos salários, más-condições de trabalho e super-exploração
da mão de obra em função de atrasos e cronogramas apertados;
-Acesso à Informação,
Participação e Representação Popular: criação de instâncias paralelas de poder,
que estão isentas de qualquer controle social;
-Meio ambiente:
facilitação de licitações ambientes para obras;
-Mobilidade: expulsão das
famílias mais pobres das áreas centrais e valorizadas e investimentos em
transporte e mobilidade urbana sem considerar prioritariamente as demandas da
população;
-Acesso a Serviços e Bens
Públicos: diante da resistência dos moradores, prefeituras cortam serviços
públicos de comunidades em processo de remoção;
-Segurança Pública:
perspectiva de militarização das cidades durante os megaeventos;
-Elitização,
‘Europeização’ e Privatização do Futebol: fim dos setores populares nos
estádios e aumento dos preços dos ingressos;
Lei Geral da Copa –
Cavalo de Tróia
Dentre as várias
denúncias na preparação da Copa do Mundo, os Comitês destacaram o caráter
autoritário, abusivo e de ingerência inscritos na Lei Geral da Copa. Uma
legislação imposta de fora para dentro a partir dos interesses da FIFA- um
verdadeiro ataque à soberania do país, segundo os Comitês Populares da Copa.
A Lei Geral da Copa altera
“sumariamente a legislação brasileira, normas amplamente debatidas e, em muitos
casos, fruto histórico de pressão e reivindicações dos movimentos sociais para
atender a exigências de organismos internacionais como a FIFA e o Comitê
Olímpico Internacional –COI” destacavam ainda em março do ano passado, Guilherme
Varella, do Instituto de Defesa do Consumidor e Thiago Hoshino, da Organização
Terra de Direitos em entrevista ao IHU.
Segundo eles, a FIFA e o COI”
são verdadeiras empresas transnacionais, mais preocupadas com o jogo do mercado
do que com os jogos esportivos”. De acordo com Guilherme Varellae Thiago Hoshino,
a Lei Geral da Copa pode ser considerada “um cavalo de troia que abre perigosos
precedentes no ordenamento jurídico brasileiro. Ela não é a primeira medida e
tudo indica que não será a última a regulamentar ‘o regime de exceção’ para os
jogos”.
O advogado Paulo Lemos,
presidente do Colégio de Ouvidorias das Defensorias Públicas do Brasil e
entrevistado pela revista IHU On-Line considera estranho ver o Brasil fiel aos
ditames da FIFA, uma vez que ela “só tem dado ordens, enquanto o pagamento da
fatura tem sido feito, cem por cento, com o dinheiro do contribuinte
brasileiro, que não poderá assistir aos jogos da copa, presencialmente”.
Diante da abusiva
ingerência da FIFA, exigindo, determinando, cobrando, alterando a legislação
brasileira, não é surpresa que a mesma tenha se tornado um dos alvos preferidos
dos manifestantes. Dentre os absurdos, um dos que mais gerou indignação está a
proibição de vendedores ambulantes comercializar produtos num raio de dois
quilômetros dos estádios, ou seja, a FIFA criou um território que é governada
por ela e não pelo governo brasileiro.
FIFA. Uma grande
multinacional despótica
O presidente da FIFA,
Joseph Blatter durante a Copa das Confederações se deu conta da ira dos
manifestantes e chegou a fugir do país com medo dos protestos. O jornalista Juca
Kfouri conta que “eles [FIFA] ficaram muito assustados, tiveram medo de gente
deles morrer, pensaram em suspender a Copa das Confederações”. Segundo ele, “em
Salvador, eles tiveram funcionários agredidos, carros depredados”.
Kfouri comenta, “o
Blatter foi embora, ele tinha um almoço marcado aquele dia com o Eduardo Campos
[governador de Pernambuco] e com o prefeito do Recife e se mandou para a
Turquia, pô, que estava pegando fogo, mas ele preferiu a Turquia do que ficar
aqui. Aí quando o governo deu a resposta que eles esperavam, com Força Nacional
nas ruas e tudo mais, ele veio. Veio e não foi anunciado nem no Mineirão e nem
no Maracanã. Passou quase incógnito”. Segundo Juca Kfouri, “a FIFA é uma grande
multinacional, que ganha aos tubos, pouco transparente”.
AFIFA arranhou tanto a
sua imagem com o seu despotismo no Brasil que é uma das concorrentes ao prêmio
de “pior corporação do mundo”. A FIFA” contribui para a violação dos direitos
humanos, assim como ao direito à moradia, direito de protestar e de trabalhar”,
destaca o site promotor do prêmio Public Eye Awardsque desde 2000 elege a “pior
corporação do mundo” e o parâmetro para que se alcance tal “honraria” é a
“prática de negócios irresponsáveis”. Em 2014, a Fifa, é a favorita para ganhar
o “prêmio. A indicação da Fifa foi feita pela Articulação Nacional dos Comitês
Populares da Copa.
Remoções arbitrárias e o
legado oculto
A realização da Copa do
Mundo tem sido perversa para muitas pessoas. Em nome da necessidade de construção
das arenas, da reestruturação viária nos seus entorno e até mesmo por
higienização e esteticização, milhares estão sendo expulsos do lugar em que
vivem há décadas.
De acordo com dados de um
mapeamento divulgado pela Articulação Nacional dos Comitês Populares da Copa
(Ancop), em parceria com a ONG Conectas, calcula-se que 250 mil famílias correm
o risco de serem despejadas por causa das obras em preparativo para a Copa do
Mundo.
Falta de transparência,
indenizações insuficientes e reassentamentos inadequados para as famílias
removidas são marcas de um modelo de gestão empreendedora neoliberal no
interior das cidades-sede da Copa.
Na opinião de Orlando
Alves dos Santos Junior, pesquisador da Rede Observatório das Metrópoles do Rio
de Janeiro em entrevista à IHU On Line há um legado oculto nesse processo das
remoções. Segundo ele, “todas estas grandes obras se dão no marco do
neoliberalismo, pois existe a subordinação do poder público aos valores do
mercado, que promove a privatização e a mercantilização da cidade na
perspectiva de atração de investimentos”.
Nisso tudo, diz o
pesquisador, “há um legado oculto que não oferece informações ao cidadão sobre
o que, de fato, está ocorrendo na sua cidade, ou seja, trata-se de um processo
que não conta com mecanismos de participação nas decisões, sendo que tais
decisões estão legitimadas pelos eventos da Copa do Mundo e Olimpíadas, como se
sediar tais coisas justificasse as opções que estão sendo definidas”. Tudo isto
produz uma elitização e mercantilização de certas áreas da cidade, destaca.
Nesse mesmo contexto da
mercantilização da cidade, a arquiteta e urbanista Claudia Favaro também
entrevista pela IHU On Line, aponta para o fato das populações mais pobres
estarem sendo removidas de forma violenta, sem nenhuma alternativa, ocorrendo
verdadeiras tentativas de higienização e elitização dos espaços públicos, com a
expulsão dos mais pobres de determinadas áreas.
Cidades privatizadas.
Sociedade submetida à lógica do capital
Na opinião do urbanista
Carlos Vainer, professor do Instituto de Pesquisa e Planejamento Urbano e
Regional (Ippur) da UFRJ,” os megaeventos aparecem como pretexto para a
realização de uma série de anseios econômicos, políticos e ideológicos de uma
direita conservadora que pretende submeter a sociedade à lógica do grande
capital”.
Segundo ele, “para isso é
necessário limpar a cidade, retirando os pobres das áreas destinadas a receber
investimentos públicos mais expressivos para que os ganhos fundiários
resultantes desses investimentos com a valorização imobiliária sejam destinados
a quem interessa”.
Para Vainer, as obras de
mobilidade urbana incluídas na Matriz de Responsabilidades da Copa refletem
isso: “Na maioria das cidades, os investimentos de mobilidade não têm atendido
as demandas das camadas populares com transporte público de massa”, opina,
exemplificando em seguida: “No Rio de Janeiro, onde 80% da demanda de
transporte público de massa está nos subúrbios, na Baixada Fluminense e na
grande Niterói, os investimentos estão sendo feitos para áreas em grande parte
vazias da Barra da Tijuca e Recreio, onde temos menos de 5% da população da
região metropolitana do RJ. Esses investimentos, na verdade, estão é
valorizando os grandes latifúndios vazios da Barra da Tijuca e Recreio”, avalia
o pesquisador.
Análise semelhante é
feita por Paulo Roberto Rodrigues Soares, professor do Departamento de
Geografia –UFRGS e membro do Observatório das Metrópoles – Núcleo Porto Alegre.
Segundo ele, “entendemos que os pontos críticos do novo modelo urbano são as
políticas de mobilidade baseadas no transporte individual, a política
habitacional regulada exclusivamente pelo capital privado e a atração de
megaeventos como alavanca para projetos desenvolvimentistas. Os três
entrelaçados estão produzindo cidades mais privadas, mais fragmentadas, menos
solidárias e de pior qualidade de vida. Bem ao contrário do que poderíamos
esperar de um efetivo programa de reforma social”.
Gastos exorbitantes que
não tem fim
Há outro escândalo que
cerca a organização do Mundial. Gastos exorbitantes que não tem fim. Não falta
dinheiro para as obras da Copa frente às imensas carências de serviços de
saúde, educação, saneamento, entre outros. Esse é um dos fatores que constrange
a realização da Copa.
O Brasil já bateu a soma do
que a África do Sul e a Alemanha desembolsaram para os dois últimos Mundiais. O
valor gasto para reforma ou construção dos 12 estádios chega próximo a 8
bilhões de reais segundo dados do Sindicato Nacional de Arquitetura e da
Engenharia –Sinaenco, que conta com correspondentes nas 12 cidades-sedes e
realiza acompanhamento mensal de projetos ligados à competição.
O valor total,
entretanto, chegará a R$ 28 bilhões. Além de estádios (R$ 7,5 bilhões), obras
de mobilidade urbana (R$ 8,9 bilhões), ampliação de aeroportos (R$ 8,4 bilhões)
e portos (R$ 675 milhões), gastos com segurança (R$ 1,9 bilhão),
telecomunicações (R$ 371 milhões) e infraestrutura de turismo (R$ 212 milhões).
Segundo a Auditoria Cidadã da Dívida, os R$ 28 bilhões que serão gastos com a
Copa – evento que vai durar um mês – representam em torno de metade do valor
destinado para a Educação no Orçamento Geral da União para todo o ano de 2012,
que foi de R$ 57 bilhões, e cerca de 40% do destinado para a Saúde, de R$ 71
bilhões.
Os gastos suntuosos
revelam ainda outro caráter perverso, o de que tem muita gente ganhando muito
dinheiro com a Copa – particularmente as empreiteiras e os consórcios que irão
administrar as arenas. Majoritariamente estão sendo construídas com recursos
públicos, mas serão privatizadas em suas administrações.
Um seleto grupo de
empreiteiras está à frente das obras da Copa, entre elas, Odebrecht–
responsável pela obra do Itaquerão onde morreram os operários –, Camargo
Correa, Andrade Gutierrez, Queiroz Galvão, OASeJBS. Essas mesmas empresas também
são generosas doadoras de recursos para campanhas eleitorais destaca João
Roberto Lopes Pinto, coordenador do Instituto Mais Democracia.
O dinheiro para a
construção das arenas vem do BNDES. Comenta João Roberto Lopes Pinto: “É um
financiamento subsidiado, porque o BNDES trabalha com uma taxa de juros de
longo prazo e tem um percentual de juros abaixo do mercado e um período longo
de carência para começar a pagar. Além disso, é dinheiro público oferecido com
condicionalidades muito frágeis. Do ponto de vista social e ambiental, não há
ação mais efetiva em termos de contrapartidas que os empreendimentos devem
observar. Não é a toa que o Eike Batista falou que o BNDES era uma mãe”, diz.
Aliás, um caso
emblemático da farra do dinheiro público com a Copa do Mundo envolve Eike
Batista. Segundo coordenador do Instituto Mais Democracia, “o caso do Maracanã
é emblemático”. Destaca que “o orçamento final da reforma do estádio superou em
quase 70% a previsão inicial, passando de R$ 705 milhões em setembro de 2010
para R$ 1,2 bilhão em julho deste ano. As obras foram tocadas por um consórcio
entre a Odebrecht, Andrade Gutierrez e Delta, que abandonou as obras em meio a
um escândalo de corrupção. Somados os gastos com a reforma do estádio e do
ginásio do Maracanãzinho para os Jogos Panamericanos de 2007, foram gastos R$
1,5 bilhão em recursos públicos no Maracanã”.
Ainda assim, diz ele, “o
governo estadual optou por entregar a administração do Complexo do Maracanã
(que além do estádio e do Maracanãzinho, conta ainda com o Parque Aquático
Julio Delamare e do Estádio de Atletismo Célio de Barros) para a iniciativa
privada, gerando questionamentos do Ministério Público do Rio de Janeiro, que
tentou, sem sucesso, impedir a licitação para a concessão do estádio, vencida
pelo Consórcio Maracanã S.A, integrado pela Odebrecht, IMX, de Eike Batista, e
AEG, que vai administrar o complexo pelos próximos 35 anos”.
Como diz o presidente da
Associação Nacional dos Torcedores e Torcedoras Marcos Alvito em entrevista
para o IHU,”o Estado paga a conta e a iniciativa privada fica com o lucro”.
Elitização e privatização
do futebol
Junto com os exorbitantes
gastos nas arenas para cumprir o padrão FIFA vem outra consequência: a elitização
do futebol brasileiro. Cerca de 203 mil pessoas assistiram à final da Copa do
Mundo de 1950 no Maracanã, o que representava por volta de 8,5 por cento da
população do Rio de Janeiro. As entradas para secções de assentos “geral” e
“popular,” de onde pessoas das classes média e trabalhadora assistiram ao jogo,
representavam 80 por cento do total de assentos. Boa parte dos espectadores
assistiu à partida de pé, num estádio com capacidade para 199 mil pessoas.
Para além da elitização,
assiste-se ainda a uma privatização dos espaços públicos. Antes da atual
remodelagem muitos estádios eram públicos e agora se tornarão privados. Entre
eles, por exemplo, o Maracanã uma “arena multiuso” que albergava, além de
eventos desportivos, recitais musicais e espetáculos dos tipos mais diversos.
Agora, sobre as arquibancadas foram construídos camarotes com ampla visão do
campo, com vidros que separam os espectadores VIP do resto dos espectadores.
Contam com bares, televisão e ar condicionado, costumam ser alugados por
empresas que convidam sócios e funcionários que têm o privilégio de chegar
diretamente de carro por uma rampa sem o mínimo contato com as ‘massas’.
Nas suítes privativas dos
estádios reformados com dinheiro público, milionários e empresas pagam 2,3
milhões de dólares por ingresso vendido por associada da FIFA, comenta Andrew
Jennings.
Outro exemplo, entre
outros, é a arena das Dunas construída em Natal-RN. A arena foi construída
sobre os escombros do antigo Machadão– estádio público. Com a destruição do Machadão
se destruiu também o Machadinho– ginásio de esportes que abrigava jogos
esportivos da rede pública de ensino. Agora o espaço, anteriormente público, se
tornou privado e o Estado não tem mais nenhuma ingerência sobre ele. Tampouco
os pobres. Os preços dos ingressos se tornaram proibitivos. Somente entram nas
arenas privadas quem ganha muito bem.
O claro caráter
anti-popular da Copa do Mundo 2014ficou evidente na interpelação dos cartazes
nas ruas:
“Não queremos estádios –
Queremos escolas e hospitais”
“Queremos escolas e
hospitais no padrão Fifa”
“Quando seu filho ficar
doente leve-o ao estádio”
“Quantos hospitais cabem
em um estádio de futebol?”
“Quantas escolas valem um
maracanã?”
“Enquanto a bola rola,
falta saúde e escola
“Era uma vez o dinheiro
do Brasil, veio a FIFA, ele sumiu”
“Copa é prioridade no
Brasil?”
“Eu não votei na FIFA”
“Go home Blatter”
“Fora FIFA”