Imprensa é oposição. O resto é armazém de secos e molhados."

(Millôr Fernandes)

sexta-feira, 12 de agosto de 2016

Postalis (dos servidores dos Correios): MPF/SP denuncia quatro pessoas por lavagem de dinheiro e fraude fiscal

Sexta, 12 de agosto de 2016
Empresário Fabrizio Neves usou contas bancárias de familiares e forjou operações financeiras para ocultar dinheiro desviado do fundo de pensão

O Ministério Público Federal em São Paulo denunciou quatro pessoas pelos crimes de lavagem de dinheiro e fraude fiscal, cometidos para ocultar a origem de recursos desviados do Postalis entre 2006 e 2011. Esta é a segunda denúncia do MPF contra envolvidos no esquema que causou rombo superior a US$ 140 milhões aos cofres do instituto de previdência complementar dos Correios. Entre os acusados está o mentor do esquema, o empresário Fabrizio Dulcetti Neves.
Os desvios se basearam no superfaturamento de títulos negociados no mercado de capitais. A transação dos ativos se dava por meio de duas corretoras sediadas nos Estados Unidos, que adquiriam os papéis no mercado internacional e os revendiam a fundos ligados ao Postalis por preços muito acima dos valores reais. O esquema utilizava uma série de offshores, muitas delas pertencentes a sócios da Atlântica Administração de Recursos, empresa de Fabrizio responsável pela gestão dos fundos no Brasil.

Veja como funcionava o esquema.

APARTAMENTO. Assim como os demais beneficiários, Fabrizio recebia os recursos desviados a título de comissões. Para omitir a ilegalidade dessas quantias, utilizou-se de contas bancárias de parentes e forjou doações, empréstimos e aquisições de bens. Entre essas operações está a compra de um apartamento no bairro do Ibirapuera, zona sul de São Paulo, em 2011. O imóvel teve valor declarado de R$ 4 milhões, mas valia até quatro vezes mais, segundo apuração à época.

O empresário e a esposa, Laura Neves, simularam uma troca para adquirir o apartamento. Na tentativa de mascarar a origem dos recursos e evitar problemas com a Receita Federal, o casal comprou dois imóveis - cada um avaliado em R$ 2 milhões -, fez a permuta pela unidade da zona sul e a transferiu para as duas filhas. Todas essas transações foram realizadas no mesmo dia, 6 de maio de 2011. Há fortes indícios de que a diferença entre o valor declarado e o real tenha sido paga no exterior por meio de offshores.

CONTAS. Até 2011, Fabrizio recebia as quantias por meio de contas bancárias vinculadas à esposa e à sogra, Mercedes Serruya Monteiro. As investigações demonstraram que Mercedes, além de ser proprietária de uma das offshores utilizadas no superfaturamento dos títulos, realizou pelo menos duas transferências para o genro. Já Laura Neves, embora não tenha feito aportes financeiros ao marido, recebeu, em nome dele, parte dos recursos ilegais transferidos por uma das corretoras envolvidas no esquema e foi beneficiária direta dos desvios.

Após as autoridades norte-americanas constatarem as fraudes praticadas pela Atlântica, em 2010, Fabrizio passou a simular operações financeiras para ocultar a origem ilícita do dinheiro. Além do apartamento adquirido em 2011, ele forjou transferências e doações envolvendo a própria empresa e familiares. Duas dessas transações tiveram a participação de sua cunhada, Rayana Serruya Monteiro, e de Mercedes. Em 2012, elas declararam à Receita ter concedido ao empresário, no ano anterior, empréstimos de R$ 250 mil e R$750 mil, respectivamente. Os repasses nunca ocorreram, mas Fabrizio fez com que o fato fosse informado na declaração de rendimentos de ambas para justificar às autoridades o aumento de seu patrimônio.

Fabrizio, Laura e Mercedes devem responder por lavagem de dinheiro. Os três constam também da primeira denúncia, acusados por condutas como organização criminosa e apropriação ilegal de recursos financeiros. Rayana foi denunciada por fraude fiscal, crime atribuído também ao empresário e a sua sogra devido ao registro de informações falsas em declarações de imposto de renda para mascarar a ilicitude dos recursos.

A autora da denúncia é a procuradora da República Karen Louise Jeanette Kahn. O número processual é 0009729-53.2016.403.6181. A tramitação pode ser consultada em http://www.jfsp.jus.br/foruns-federais/.

RECURSO. Juntamente aos novos pedidos de condenação, o MPF/SP protocolou recurso contra a decisão da 2ª Vara Criminal de São Paulo de remeter à Justiça do Distrito Federal a denúncia anterior contra os responsáveis pelos desvios no Postalis. A Procuradoria rebateu o argumento de que a cidade onde o fundo de pensão está sediado, Brasília, determine a vara em que o caso deve ser julgado. Segundo a procuradora Karen Kahn, os autos devem permanecer em São Paulo, onde a corretora Atlântica, pivô do esquema, está instalada.

“O núcleo protagonista das fraudes operava diretamente a partir de São Paulo, por meio da Atlântica, possuindo esta uma atuação ampla e  desenvolta em termos de negociação e manipulação de preços dos títulos negociados”, escreveu Karen. “A Atlântica, sob comando e ordem de Fabrizio Neves, procedeu a diversas compras de títulos no exterior, não havendo nos autos, por ora, prova de que tais iniciativas decorressem exclusivamente da atuação de Alexej (Predtechensky, então presidente do Postalis) ou do diretor financeiro Adilson Florêncio a partir da sede do Postalis em Brasília.”

O número processual da primeira denúncia é 0008115-81.2014.403.6181. Caso a 2ª Vara Criminal de São Paulo não reconsidere a decisão mas aceite o recurso, os contra-argumentos do MPF serão julgados pelo Tribunal Regional Federal da 3ª Região.