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(Millôr Fernandes)

sábado, 18 de janeiro de 2014

Prisões, segurança e emoção

Sábado, 18 de janeiro de 2014
Por Ivan de Carvalho
      Enquanto o complexo prisional da Papuda, administrado pelo governo do Distrito Federal, vai, com todas as suas mazelas, surfando na onda da fama proporcionada pelo recolhimento de alguns dos condenados no processo do Mensalão, em dois Estados da Federação ocorrem crises agudas especialmente agudas no sistema penitenciário.
      Um desses Estados é o Maranhão, administrado pela governadora Roseana Sarney, do PMDB e filha do senador José Sarney, que domina a política estadual há décadas. A crise no Maranhão se concentra, agora, no Complexo Penitenciário de Pedrinhas, onde esta semana já ocorreram duas tentativas de fuga coletiva, apesar do pesado reforço policial posto para supostamente bloquear qualquer ideia de rebelião.
      Mas as fugas e tentativas de fuga, tão comuns no sistema prisional nacional, bem como as costumeiras rebeliões geralmente causadas pela superlotação, mas não só por isto – também por outras condições desumanas que prevalecem na quase totalidade das prisões brasileiras – não representam a essência da crise atual no Complexo Penitenciário de Pedrinhas.
      A verdadeira crise é composta pela existência de facções de presidiários que, de dentro, têm o controle de fato do complexo penitenciário e, além dos meios, a autoridade para comandar a criminalidade do lado de fora. Assim, enquanto dentro do complexo penitenciário presos sofrem torturas medievais ou chinesas e outros são decapitados, do lado de fora os bandidos obedientes aos “comandos internos” incendeiam ônibus para mostrar a inconformidade dos “comandos internos” com uma ou outra medida que lhes desagrade.
      O outro Estado é o Rio Grande do Sul, administrado pelo governador Tarso Genro, do PT e ex-ministro da Justiça. Lá, parece que o silêncio e a solidão das madrugadas são cúmplices da criminalidade interna, dos assassinatos dentro do Presídio Central de Porto Alegre. O juiz da Vara de Execuções Criminais, Sidinei Brziska, que tem uma responsabilidade que não lhe permite dar informações irresponsáveis, afirmou haverem ocorrido 12 assassinatos dentro do presídio no período de 2011 a 2013. O secretário-adjunto da Segurança Pública, Juarez Pinheiro, alegando que ele está se colocando no lugar dos peritos criminais.
      Isto porque o juiz da VEC disse que a morte dos detentos ocorre de madrugada, com indicação de parada cardíaca ou edema pulmonar e presença de cocaína no sangue, em grande quantidade. Ele disse entender que os presos seriam mortos de forma discreta e com uso de artifícios que dissimulam os homicídios, fazendo-os parecer mortes naturais. Isso foi o que indignou o secretário adjunto da Segurança Pública, aparentemente defensor da tese de que as mortes teriam mesmo sido naturais. Em outras palavras: ao invés de atacar o problema, prefere (talvez para “limpar a barra” da sua Secretaria e do próprio governo estadual) atacar quem o denuncia.
      A Corte Interamericana de Direitos Humanos, vinculada à Organização dos Estados Americanos (OEA) – a partir do exame de denúncia feita pela seção gaúcha da OAB, Conselho Regional de Medicina e Conselho Regional de Engenharia e Agronomia, após vistoriarem o presídio em abril de 2012 – pede providências para garantir “a vida e a integridade pessoal dos detentos”, assegurar as condições de higiene e tratamentos médicos adequados, bem como medidas para recuperar o controle de segurança e reduzir o número de presos (por causa da costumeira superlotação).
      Dos muitos casos explosivos em presídios brasileiros vale lembrar o que era e, pelo que era, o que acabou acontecendo no Carandiru, em São Paulo, com aquela chacina dos presos pela PM. Mas se o Carandiru obteve na sua época fama internacional, como ocorre agora (com estardalhaço menor, pelo menos por enquanto) com o Complexo Penitenciário das Pedrinhas e o Presídio Central de Porto Alegre, há uma constatação geral a fazer. O sistema prisional brasileiro está superlotado com uma população de mais de 200 mil presos e há mais de 300 mil mandados de prisão não cumpridos, grande parte deles porque, se cumpridos, não haveria onde por os novos presos – e outra grande parte pela incapacidade do aparelho policial de cumprir os mandados. É essa preocupação das autoridades com a segurança pública que nos deixa, a todos, tão emocionados.
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Este artigo foi publicado originariamente na Tribuna da Bahia deste sábado.
Ivan de Caralho é jornalista baiano.