Imprensa é oposição. O resto é armazém de secos e molhados."

(Millôr Fernandes)

segunda-feira, 5 de maio de 2014

Breves comentários ao Marco Civil da Internet

Segunda, 5 de maio de 2014
Do Blog do Vlad


 em 

Marco-Civil-da-Internet








Se será um marco para a afirmação dos ciberdireitos, ainda não sabemos. Mas o Marco Civil da Internet é uma lei tão necessária quanto mal compreendida. Muita gente criticou o projeto sem jamais tê-lo lido. Estamos na Sociedade da Informação e da Comunicação há algumas décadas. A Internet comercial no Brasil já tem uns vinte anos. Mas ainda não tínhamos uma carta de direitos digitais, um estatuto dos usuários de Internet. Não o chamo de “Constituição da Internet”, porque não é disso que se trata. Há muitos temas ainda por regular, especialmente no plano global. Ademais, a maior parte dos direitos listados no Marco Civil já está prevista na Constituição de 1988, no Código Civil ou em tratados.

Mesmo assim, temos um avanço significativo. Elaborado pelo Ministério da Justiça com sugestões da sociedade civil e da academia, o projeto de Lei do Marco Civil da Internet (Projeto de Lei 2.126/11) foi sancionado pela presidente Dilma Rousseff em 23 de abril de 2014 e converteu-se na Lei 12.965/2014. Muita polêmica se criou em torno da proposta, relatada pelo deputado Alesssandro Molon. Mas depois de mourejar por longos meses na Câmara dos Deputados, como se transitasse por uma conexão discada, o projeto passou rapidamente no Senado, num clique.

2. Publicação e vigência
A Lei 12.965/2014 foi publicada no Diário Oficial da União em 24 de abril de 2014. Seu prazo de vacatio legisé de 60 dias, conforme o seu artigo 32. A contagem desse prazo deve observar a regra do artigo 8º, §1º, da Lei Complementar 95/1998, segundo o qual a contagem do prazo para entrada em vigor das leis que estabeleçam período de vacância faz-se com a inclusão da data da publicação e do último dia do prazo,entrando em vigor no dia subsequente à sua consumação integral. Logo, o Marco Civil entrará em vigor em 23 de junho de 2014.

3. Novos velhos direitos
As idéias nucleares (e potentes) do Marco Civil da Internet são a liberdade de expressão, a neutralidade da rede (net neutrality) e a proteção à vida privada (privacy) dos usuários. Não poderia ser diferente. Os direitos fundamentais à liberdade de expressão e à intimidade estão consagrados há muito tempo na Constituição Federal de 1988 (artigo 5º) e em tratados, a exemplo da Convenção Americana sobre Direitos Humanos (Pacto de São José da Costa Rica, de 1969) e no Pacto Internacional de Direitos Civis e Políticas (Pacto de Nova York, de 1966).  A novidade, portanto, é a neutralidade da rede, um novo ciberdireito, e o regulamento estrito para o tratamento de dados pessoais no ciberespaço.

4. O princípio da neutralidade da rede
Sem dúvida, o princípio da neutralidade da Internet é o mais criticado dos pilares da Lei 12.965/2013. Embora tenha recebido aplausos do físico Tim Berners-Lee, considerado o pai da World Wide Web, e do ideólogo da neutralidade, o professor Tim Wu, da Universidade de Columbia, não foi e continua não sendo fácil convencer grande contingente de especialistas de que é boa e necessária a ideia de neutralidade da rede.
Porém, nem isto é novo. A primeira manifestação legislada da ideia de neutralidade remonta ao século XIX. A Lei Telegráfica do Pacífico, de 1860 (Pacific Telegraph Act), aprovada pelo Congresso dos Estados Unidos, declarava que mensagens recebidas de um indivíduo, empresa ou companhia, ou de qualquer outra linha telegráfica deviam ser “imparcialmente transmitidas na ordem em que forem recebidas”, excetuando-se apenas os despachos governamentais, que tinham prioridade de transmissão.