Imprensa é oposição. O resto é armazém de secos e molhados."

(Millôr Fernandes)

segunda-feira, 9 de janeiro de 2012

Rumo à cruz

Segunda, 9 de janeiro de 2012
Por Ivan de Carvalho
Grupos e governos extremistas muçulmanos têm, ao longo de várias décadas, hostilizado o povo de Israel, sob alegações diversas. No início, para impedir a divisão da Palestina, determinada em 1948 pela Organização das Nações Unidas – um Estado de Israel e um estado palestino.
 
       Este último não chegou a instalar-se, porque os líderes do povo palestino (em verdade, a parte do povo árabe que residia, em 1948, na pequena e polêmica Palestina e não nas amplas terras ocupadas pelos 22 países árabes que existem hoje) e os países árabes rejeitaram a criação do Estado palestino para rejeitar também o Estado de Israel, ao qual declararam guerra.
 
         Israel venceu, a duras penas, pois acabara de nascer. Ou renascer. Mas, durante toda a sua história, as coisas nunca foram fáceis para os filhos de Jacob. Depois da referida guerra, já ocorreram mais duas, a de 1967, que o Egito (aliado a Síria e Jordânia) provocou ao bloquear o Golfo de Aqba e a de 1973, que o mesmo Egito (aliado à Síria) iniciou com o objetivo de recuperar perdas que sofrera na guerra de 1967. Acabou recuperando, apesar da derrota militar, por um tratado de paz, ainda vigente (por enquanto, pelo menos).
 
       Mas houve a servidão no Egito até Moisés retirar de lá o seu povo, os dois cativeiros de Babilônia, o domínio romano, a destruição de Jerusalém por Tito Vespasiano e a diáspora, a perseguição em tantos países, os campos de concentração de Hitler. E há os terroristas, os carros-bomba, os homens-bomba, as mulheres-bomba (em boa parte contidos por aquele muro do qual tão mal se fala), os esforços iranianos e do Hamas para “varrer Israel do mapa” e “jogar Israel no mar”. E está aí a Primavera Árabe, que ninguém sabe para onde vai e sobre cujas consequências para Israel é arriscado até especular.
 
       Bem, estivemos falando dos hebreus, naturalmente também dos israelitas, mas os que estão sofrendo, nestes dias, são os cristãos. Parece que está chegando a nossa vez. Outra vez. Porque já tivemos a primeira fase de grande sofrimento sob o Império Romano. E uma segunda fase, menos barulhenta, semi-camuflada, mas dolorosa, sob os regimes marxistas-leninistas, na URSS, Europa Oriental, mesmo na China.
 
       Agora, a perseguição começa a revelar-se no chamado mundo islâmico, embora a doutrina do Islã não a autorize. Mas a doutrina cristã jamais autorizou as fogueiras da Inquisição e elas foram acesas. Felizmente alguns séculos já nos separam delas.
 
       Faz pouco tempo, comunidades da Igreja Coopta do Egito foram alvo de ataques violentos. Dos cerca de 16 milhões de cristãos cooptas, oito a 12 milhões estão no Egito. É uma parcela muito expressiva, em um país que, por estimativa, tem cerca de 60 milhões de habitantes.
 
       A situação no Egito, neste aspecto – não nos políticos, que podem mais tarde se refletir neste relacionado com os cristãos – está ultimamente mais calma. No entanto, na Nigéria, o mais populoso país da África – 160 milhões de habitantes –, onde o Islã é a religião dominante, a situação é crítica. Ataques de muçulmanos contra prédios de igrejas católicas e evangélicas e contra fiéis resultaram em dezenas de mortes nas últimas semanas. Desde o Natal, seis ataques causaram a morte de mais de 80 pessoas. A maioria dos ataques é reivindicada pela seita islâmica Boko Haram, que quer impor a Sharia (lei islâmica) no país.
 
       Ayo Oritsejafor, chefe da Associação Cristã da Nigéria, que agrupa católicos e evangélicos, afirmou que “este tipo de ato nos lembra o início da guerra civil que ocorreu na Nigéria”, ente 1967 e 1970, deixando um milhão de mortos. As lideranças cristãs estão considerando os ataques como uma espécie de “limpeza religiosa”, numa comparação com as “limpezas étnicas” que têm ocorrido em alguns lugares do mundo. E que atingiram os judeus sob o nazismo.
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Este artigo foi publicado originalmente na Tribuna da Bahia desta segunda.
Ivan de Carvalho é jornalista baiano.