Quarta, 25 de janeiro de
2012
Por Ivan de Carvalho

À voz da presidente brasileira, que na época
era ainda candidata à sucessão de Lula, mas após a posse manteve a posição a
respeito, juntaram-se muitas outras, em um clamor mundial que levou o governo
iraniano a um recuo estratégico. Suspendeu a execução e submeteu Sakineh a um
novo julgamento, sob a acusação de cumplicidade no homicídio do marido pelo
amante. E fixou-se por isto a pena de morte por fuzilamento. Os dois
julgamentos estão valendo e Sakineh está presa e ameaçada de morrer por
apedrejamento ou fuzilamento.
Lamentavelmente, a
presidente Dilma Rousseff nunca se manifestou sobre a pena por fuzilamento,
tendo apenas reforçado sua objeção a formas “medievais” de punição, numa
referência óbvia ao apedrejamento (na Idade Média existiam pedras, mas não
fuzis), embora este fosse um castigo largamente aplicado na antiguidade (Maria
Magdalena, por exemplo, ia ser apedrejada) muito mais que na Idade Média. Há
uma suspeita muito forte de que pode ser falsa a acusação de co-autoria de
homicídio contra a iraniana e de que a intenção era a de tornar possível seu
fuzilamento, já que o apedrejamento se tornara politicamente incômodo para o
regime.
Dilma tem a chance de
reafirmar sua posição de defesa dos direitos humanos quando decidir se atende ao
que pede a jornalista (blogueira) cubanaYoani Sánchez. Recentemente, ela
divulgou na Internet um vídeo em que pede à presidente do Brasil que interceda
junto ao presidente cubano Raul Castro para que ela possa sair do país.
O Itamaraty vinha alegando
que nenhuma reação poderia ser adotada pelo governo brasileiro por não haver
chegado qualquer pedido formal. É óbvio que se trata de uma resposta
“diplomaticamente correta”, mas uma atitude politicamente absurda. Era um
governo escondendo-se atrás de um trâmite burocrático enquanto se esquivava de
defender um direito humano, o de ir e vir de Yoani, uma conhecida lutadora
pelos direitos humanos e especialmente pela liberdade de expressão em Cuba,
luta que já lhe deu exatamente dez prêmios internacionais.
Ontem, o Itamaraty
finalmente não mais pode esconder-se atrás da burocracia. Admitiu que a
embaixada brasileira em Cuba recebeu uma carta de Yoani, endereçada à
presidente Dilma Rousseff, exatamente uma semana antes de a chefe de Estado
brasileira viajar a Cuba, onde poderá, querendo, abordar com o
presidente-ditador Raul Castro o caso de Yoani.
A jornalista quer vir ao
Brasil participar de festival na cidade baiana de Jequié, onde pretende
assistir ao filme Conexão Honduras Cuba”, dirigido pelo brasileiro Carlos
Galvão Silva. O filme conta a história de blogueiros cubanos e hondurenhos
perseguidos pelos governos de seus países. A obra contém um depoimento de
Yoani.
Yoani disse ter recebido
uma carta-convite no início do ano para vir ao festival e a apresentou às
autoridades cubanas, como parte das providências burocráticas para poder
viajar, mas, segundo afirmou, até agora não recebeu resposta alguma do governo
cubano.
Já a carta de Yoani a Dilma
Rousseff põe a presidente numa saia justa. O governo brasileiro cultiva
relações amorosas com o governo cubano e o ex-presidente Lula é, do lado de cá,
o grande fiador deste romance, enquanto em Cuba esse papel é desempenhado por
Fidel Castro.
Essa gente (excetuando apenas Dilma, da qual não
se tem informação a respeito) não gosta de Yoani nem de pessoas que fazem greve
de fome em Cuba, como o jornalista que morreu fazendo uma no dia em que o
presidente Lula chegou no país dos Castro para uma visita – e aproveitou para
criticar o protesto e comparar o mártir da liberdade a criminosos comuns
brasileiros.
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Este artigo foi publicado originalmente na Tribuna da Bahia desta quarta.
Ivan de Carvalho é jornalista baiano.