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(Millôr Fernandes)

sexta-feira, 7 de julho de 2017

Empresa de amigo de Temer recebeu 33 mil m² no Porto de Santos sem licitação

Sexta, 7 de julho de 2017
Empresa de amigo de Temer recebeu 33 mil m² no Porto de Santos sem licitação
Rodrimar pertence a Antônio Celso Grecco, apontado por delatores da JBS como operador de Michel Temer
Por BuzzFeedNews Foto: Reprodução/Divulgação/Lula Marques/ AGPT 
Blog do Sombra
A empresa de importações Rodrimar acrescentou 33.386 m² à área que ocupa no Porto de Santos, entre 1991 e 2011, sem participar de concorrências e sem assinar contratos novos com a Codesp, estatal federal responsável por administrar o maior porto do país.

A expansão ocorreu por meio de sucessivos aditamentos a dois contratos, assinados originalmente em 1991 e 1993. Os contratos já venceram, mas a Rodrimar continua operando no local graças a decisões provisórias da Justiça.

Antônio Celso Grecco, sócio da Rodrimar, é amigo do presidente da República, Michel Temer (PMDB) — a empresa nega a relação de amizade. O nome dele veio à tona no bojo do escândalo provocado pela delação dos irmãos Joesley e Wesley Batista, donos da JBS.


Na já célebre cena do ex-deputado Rodrigo Rocha Loures (PMDB) correndo com uma mala de dinheiro, gravada no dia 28 de abril, a pessoa inicialmente escalada para receber o dinheiro da JBS em nome de Temer, segundo o delator Ricardo Saud, era Celso — como o dono da Rodrimar é conhecido. Mas um imprevisto fez com que ele não chegasse a tempo, e Rocha Loures teve que ir em seu lugar.

A Codesp se tornou feudo político de Temer nos anos 1990, quando ele liderou a bancada do PMDB e presidiu a Câmara pela primeira vez — em nota, a Presidência da República disse que "Michel Temer não responde pelos atos dos presidentes da Codesp".

Em outubro de 1991, a Rodrimar assinou um contrato com a Codesp para arrendar três armazéns no Porto de Santos, uma área de 34.026 m². Hoje, esse contrato diz respeito a uma área de 61.467,00 m². O segundo contrato foi firmado pouco depois, em julho de 93, para o arrendamento de um terreno no Cais do Saboó que tem 12.350 m² de área. Após seis aditamentos, a área do contrato atualmente é de 18.296 m².

Com o passar dos anos, vários aditamentos foram assinados, na maioria das vezes expandindo a área reservada à empresa do amigo de Temer.

Transcorridos 25 anos desde a assinatura do primeiro contrato, a área arrendada pela Rodrimar cresceu de 46.376 m² para 79.763 m², sem novas concorrências ou novos contratos — ao todo, os contratos assinados com a Codesp foram alterados 16 vezes entre 1993 e 2011 (veja a lista completa ao final da reportagem).

Segundo a empresa, a alteração ocorreu por causa do novo plano de zoneamento do porto. "A mudança ocorreu somente para atender a autoridade portuária", diz a Rodrimar em nota (leia a íntegra ao final da reportagem).

Questionada pela reportagem nesta quarta-feira (5), a Codesp pediu mais tempo para responder, "tendo em vista que a questão envolve consulta às áreas técnica e jurídica".

A validade dos contratos já venceu — a do primeiro em 2011, a do segundo em 2014 —, mas eles continuam em vigor após a empresa conseguir decisões provisórias na Justiça.

Atualmente, a Rodrimar move um processo administrativo na Secretaria de Portos, órgão subordinado à Presidência da República, na tentativa de prorrogar o prazo de arrendamento mais uma vez.

Rocha Loures tratou do assunto com um funcionário da empresa. Em 24 de abril, um dos dias em que encontrou-se com o executivo da JBS Ricardo Saud, o ex-assessor de Temer também se reuniu com o executivo Ricardo Mesquita, da Rodrimar.

Em depoimento ao Ministério Público Federal, Saud disse que a reunião entre Rocha Loures e Mesquita não aconteceu por acaso. "Eles são muito amigos. E o [Antônio] Celso [Grecco] da Rodrimar é muito amigo do Temer há muitos anos", afirmou o delator.

A amizade entre Temer e Grecco também foi mencionada por Rocha Loures, na conversa em que foi gravado por Saud, em 28 de abril. O executivo da JBS se refere à Rodrimar, e o ex-assessor do presidente responde: "Lá tem um amigo… O Celso é muito amigo dele."

Em 4 de maio, uma conversa entre Temer e Rocha Loures, em que falam sobre o setor de portos, foi gravada pela PF com autorização da Justiça.

"Aquela coisa dos 70 anos lá pra todo mundo parece que está acertado aquilo lá", diz o presidente a Rocha Loures. Temer se referia ao Decreto dos Portos, que ele assinaria em 10 de maio. A regra recém-instituída estabelece que empresas podem arrendar áreas nos portos por até 70 anos.

Imediatamente após falar com o presidente, Rocha Loures ligou para Mesquita — e a conversa também foi grampeada. "Falei com o presidente e o presidente me deu essa notícia de que ele não assinou nada", afirma o assessor, acrescentando a informação sobre o prazo máximo de 70 anos para os arrendamentos.

"É isso aí, você é o pai da criança, entendeu?", responde o executivo da Rodrimar.

Em 18 de maio, quando Rocha Loures foi preso na Operação Patmos, policiais federais também cumpriram mandado de busca e apreensão na sede da Rodrimar, em Santos.

Na terça-feira (27) da semana passada, o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, pediu acesso a um inquérito que apurava ligações de Temer com a Rodrimar desde 2001 e havia sido arquivado.

A investigação teve origem durante a ação de divórcio do ex-presidente da Codesp Marcelo de Azeredo, que ocupou o cargo por indicação de Temer, que à época era presidente da Câmara dos Deputados.

A ex-mulher de Azeredo, Erika Santos, anexou planilhas que indicavam pagamentos ilegais de R$ 600 mil da Rodrimar, retiradas do computador do ex-marido. Além do então presidente da Codesp, apareciam na planilha os nomes "MT" e "Lima".

A suspeita é de que "MT" referia-se a Michel Temer e "Lima" ao coronel aposentado da PM João Batista Lima Filho, outro amigo do presidente suspeito de receber propina em nome dele. Agora, segundo revelou a revista Veja, Janot irá reexaminar as provas.

Erika e Azeredo firmaram um acordo — ela não fala mais sobre o assunto —, a ação de divórcio foi extinta. Os autos seguiram à Procuradoria-Geral da República em 2001, mas a investigação deu em nada. Em 2011, o caso foi arquivado.

Como presidente da Codesp, Azeredo assinou 3 dos 16 aditamentos entre a estatal e a Rodrimar. Em dois deles, a empresa do amigo de Temer recebeu um espaço maior do que ocupava antes.

Leia a íntegra da nota da Presidência da República.

Michel Temer não responde por atos dos presidentes da Codesp.

O Decreto dos Portos era uma obrigação, decorrente da alteração na legislação promovida pelo governo Dilma Rousseff.

Diálogos de Rocha Loures mostram que o governo não atendeu reinvindicações da Rodrimar sobre esse período.

Leia a íntegra da nota da Rodrimar.

A Rodrimar afirma que não há relação de amizade entre o dono da empresa e o presidente Temer.
A Rodrimar esclarece que a mudança do objeto ocorreu devido à alteração no plano de zoneamento do Porto de Santos decorrente da lei 8.630 (conhecida como a primeira Lei dos Portos), que proibiu a movimentação de barrilhas e sulfatos no Saboó.

É preciso deixar claro que a mudança ocorreu somente para atender a autoridade portuária.

A empresa ressalta que todos os seus contratos com órgãos governamentais se encontram em situações absolutamente regulares.