Imprensa é oposição. O resto é armazém de secos e molhados."

(Millôr Fernandes)

sexta-feira, 23 de maio de 2014

Brasília, exemplo do fracasso da política rodoviarista

Brasília, 23 de maio de 2014
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Por Mauro Burlamaqui
Brasília é um bom exemplo do fracasso da política rodoviarista. E não é de hoje. É coisa que pode ser contada em décadas. Prova cabal são as gigantescas obras de intervenção no Balão do Aeroporto, na EPTG, na saída Norte e no final da W3 Sul – apenas para citar alguns poucos exemplos –, que mostram como os sucessivos governos locais (todos eles!) só estão preocupados em despejar milhões de reais nas contas das construtoras – talvez como forma de retribuir as gordas doações eleitorais feitas por estas empresas - sem pensar em soluções reais para o problema do trânsito, como as grandes cidades mundo afora estão fazendo.

Essa situação ainda consegue ser agravada por conta das benesses do Estado, que recentemente voltou a facilitar a obtenção de crédito para compra do carro novo, o que garante um volume de vendas crescente para as montadoras de veículos – provavelmente também como forma de retribuir polpudas doações de campanha.

Em termos gerais, em Brasília as obras viárias são grandiosas (diria megalomaníacas). Causam enormes transtornos aos cidadãos enquanto são tocadas. São inauguradas sem estarem concluídas e, quando concluídas, não resolvem em nada a situação do trânsito. Ou por serem mal planejadas ou dimensionadas, ou por conta exatamente do aumento constante da frota de veículos. Ou uma junção desses dois fatores.

As ampliações e alargamento de pistas, a construção de pontes e viadutos, a construção de estacionamentos, por maiores que sejam, não vão resolver o problema. Mais carros virão. Sempre.

A equação é simples, e o resultado, como temos comprovado, é sempre negativo. Obviamente, nossos governantes sabem bem disso. Mas não conseguem se desvencilhar de seus compromissos de campanha com as empresas, que são muito mais importantes do que seus compromissos com nós outros, eleitores. Porque é fácil enganar os eleitores. Já o empresariado, se não receber de volta o que investiu, debanda para o outro lado e vai patrocinar outro candidato. E isso é a morte para o político.

Insisto no tema, porque a situação caminha a passos rápidos para a exaustão. Basta circular pela cidade para ver as ruas cheias, mesmo nos horários que não são de rush, para ver carros parados em cima de calçadas, ao lado de meios-fios, em fila dupla, em balões, em cima de passarelas, em frente aos acessos para cadeirantes. Para ouvir roncos de motos, freadas de carros. Ver acidentes, atropelamentos, mortes no trânsito.

Ou se muda o sistema, incluindo a vedação – ou a limitação – de doação eleitoral por parte de empresas - e a implantação do voto distrital, ou vamos seguir sempre nessa mesma toada, até o esgotamento total do complexo viário de Brasília.

Só aí, creio eu, haverá “liberdade” e espaço para que algum governo de visão mude o rumo das coisas, e passe a investir com a mesma sanha gastadora na mudança completa do sistema, partindo para a concepção de um projeto baseado em transportes coletivos e alternativos de qualidade. 

Enganação 
Mas não chegou ainda esse tempo, e nem esse governo. Por enquanto, continuamos assistindo à glorificação da “cultura do carro”.

E com um agravante. O GDF acoberta o fato de que mantém essa relação promíscua com o empresariado, essa política do “é dando que se se recebe” e a política rodoviarista como prioridade máxima. O governo engana descaradamente a população, travestindo algumas calçadas como ciclovias, construindo alguns poucos quilômetros de faixas exclusivas para bicicletas – para uso exclusivo de lazer ou esporte, e não para mobilidade urbana. E faz minguados e mal planejados investimentos no nosso metrô – um ferrorama com míseros 43 quilômetros em apenas duas linhas. E compra novos ônibus para impressionar o cidadão (eleitor?!), sem estudar mudanças em linhas e horários e sem valorizar a categoria dos rodoviários, ou dar manutenção decente e de qualidade em nosso asfalto.

Faz tudo isso e tem a cara deslavada de produzir caríssimas campanhas publicitárias multimídia (descaradamente eleitoreiras), para passar à população a falsa ideia de que o governo investe em mobilidade urbana, que o DF tem a maior extensão de ciclovias, que se orgulha do seu metrô e que está mudando a cara do transporte público com a aquisição de ônibus novos...

Esse texto foi publicado originalmente em 22/5/2014 no Blog SobreooRodas
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