Domingo, 24 de julho de 2016

Do Blog do Vlad
Por Vladimir Aras
Na luta contra empresas, brasileiras ou estrangeiras, que descumprem ordens judiciais destinadas à persecução de crimes graves, é necessário observar um escalonamento de providências, na forma do Marco Civil da Internet e do CPC.
O congelamento de contas bancárias é a medida mais eficaz para alcançar o efeito pretendido e a menos danosa à coletividade, um binômio desejável no que tange a serviços de acesso público, especialmente aplicações de Internet.
O Facebook tem operações publicitárias de grande monta no
Brasil, devido aos posts patrocinados. A empresa vende publicidade para
microempresas (o sujeito entra lá e paga com cartão de crédito) e também
opera grandes campanhas, como anúncios na página principal e outras
modalidades mais caras de marketing, inclusive para pessoas físicas. Anuncia também para governos.
Caso haja desobediência a ordem judicial para fornecimento de informações (especialmente metadados) sobre possíveis criminosos, o mais saudável juridicamente é bloquear todas as contas e operações de cartão de crédito que tenham como recebedor a empresa controladora da aplicação.
Diga-se, porém, que o bloqueio de aplicações como o WhatsApp é legal
(artigo 12, III, do Marco Civil) e parece eficaz. O problema está nos
efeitos colaterais que atingem grande massa de terceiros. Por isso, deve
ser apenas a última opção do Ministério Público, no pedido, ou da
autoridade judiciária, na decisão.
Não se pode negar que hoje temos centenas de meios de comunicação.
Mas não é adequado bloquear um serviço e simplesmente dizer ao usuário
habitual que passe a utilizar o concorrente. SMS não é opção barata no
Brasil. Ademais, a disponibilidade da aplicação WhatsApp ou de qualquer
outro app é um valor a ser preservado também em proveito do usuário.
O usuário tem direito ao serviço que escolheu. Não pode ser compelido a abandoná-lo sem a máxima razão (suficiente) nem compelido a migrar para outro serviço ou provedor, sem que se observem todas as condições legais. Disponibilidade é um dos elementos fundamentais de qualquer aplicação de internet. É ciberdireito.
Todos devem lembrar do tumulto que o primeiro bloqueio judicial do
WhatsApp causou. Até o Telegram sofreu impacto – e seus usuários também –
devido ao aumento do fluxo de mensagens nos provedores desse
aplicativo. A decisão sobrecarregou um serviço ao bloquear o
concorrente. Numa sociedade em que a presteza e a prontidão são fatores
essenciais a vários setores da economia, negócios podem ser perdidos
durante os dias ou horas de bloqueio, um dos quais foi cassado em julho
de 2016 pelo STF em decisão na ADPF 403.
Por isso, insisto que o bloqueio de contas ou a interdição total do mercado publicitário brasileiro
para o Facebook seriam providências judiciais muito eficazes. Contas
bloqueadas, agências impedidas de veicular no Facebook.
No mais, somente uma alteração legislativa nos ajudaria. Tornar o crime de desobediência (art.
330 do CP) a ordem judicial uma coisa séria, como é nos EUA, país de
origem das companhias em questão. Hoje não passa de uma infração penal
de menor potencial ofensivo e não admite flagrante.
Estaríamos em melhor situação também se houvesse um fast track na cooperação internacional com os Estados Unidos em matéria de cibercrime, mediante um protocolo adicional ao tratado bilateral de assistência em matéria penal que vigora desde 2001.
Bom também seria se as redes internacionais de trocas de dados em base 24/7 tivessem capacidade operacional para atender a todos os órgãos de persecução criminal, em proveito das vítimas de cibercrimes.
Também teríamos um quadro mais favorável se realmente funcionassem os serviços de congelamento de metadados,
para custódia em favor de investigações criminais, serviços estes que
são oferecidos pelas próprias empresas de aplicações de internet.
Metadados são fundamentais para localização e identificação de vítimas e
criminosos e compreensão da dinâmica de condutas criminosas.
Por último, quem sabe o novo governo (interino) avança na questão da adesão do Brasil à Convenção de Budapeste.
Concluída em 2001 pelo Conselho da Europa (CoE), este tratado é o mais
importante do mundo na luta contra a cibercriminalidade. Contudo, desde
2003, o governo brasileiro se recusa a aderir à ETS 185, alinhando-se
com Rússia e China neste quesito.
Enfim, o congelamento de contas é medida suficiente, creio, para fazer cessar desobediências, sempre que a ordem judicial puder realmente ser cumprida. Nem sempre é o caso. E aqui já entraríamos na questão do conteúdo criptografado por oposição aos acesso aos metadados, estes facilmente entregáveis.
E os dados de conteúdo, os diálogos? Bem, para acesso a estes há várias técnicas especiais de investigação que podem ser empregadas pela Polícia e pelo Ministério Público.
Numa economia capitalista, o dinheiro move o mundo. Nada se move sem ele. Bloquear o bolso ou a bolsa. O investidor não dará “joinha”.