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(Millôr Fernandes)

terça-feira, 26 de junho de 2018

PGR defende inconstitucionalidade de dispositivo de lei que ampliou competência da Justiça Militar

Terça, 26 de junho de 2018
Do MPF
Para Raquel Dodge, julgamento de militares que comerem crimes dolosas contra a vida de civis fere a Constituição, além e violar tratados de direitos humanos.
A procuradora-geral da República, Raquel Dodge, enviou manifestação ao Supremo Tribunal Federal (STF) para que seja declarada a inconstitucionalidade de dispositivo incluído no Código Penal Militar. Trata-se do artigo 9º da Lei 13.491/2017, que desloca para a Justiça Militar da União a competência para julgar os crimes dolosos contra a vida praticados por militares das Forças Armadas no casos em que as vítimas são civis. O assunto é objeto de Ação Direita de Inconstitucionalidade (ADI) proposta pelo Partido Socialismo e Liberdade (PSOL). No documento encaminhado à Corte nesta segunda-feira (25), a PGR ressalta que a norma amplia de forma permanente e substancial a competência da Justiça Militar, ao mesmo tempo em que reduz as atribuições constitucionalmente reservadas ao Tribunal do Júri. O entendimento é de que a alteração legislativa contraria diversos preceitos constitucionais e viola tratados de direitos humanos dos quais o Brasil é signatário.

De acordo com o parecer, tanto as CF quanto os tratados, restringem a jurisdição penal militar ao julgamento de crimes envolvendo violação à hierarquia, disciplina militar ou outros valores tipicamente castrenses. “Qualquer tentativa de ampliação da competência da Justiça Militar da União que desconsidere tal essência será indevida e inconstitucional, porque rompe a lógica da especialidade que a justifica”, frisa Raquel Dodge, completando que, ampliar a atuação da Justiça traz impactos sobre a organização constitucional de órgãos do Judiciário e, de modo mais grave, resulta na mitigação da garantia constitucional do Júri.
Em outro trecho do documento, a PGR ressalta o princípio da igualdade como mais um indicativo de inconstitucionalidade do dispositivo. Segundo ela, a mesma lógica que expressamente impôs a competência do Tribunal do Júri para os crimes dolosos contra a vida praticados por militares dos Estados civis deve ser aplicada aos militares federais. A procuradora-geral enfatiza que o tratamento diferenciado - sem fundamento constitucional - institui uma espécie de “foro privilegiado” em razão da natureza do cargo do agente e não do caráter militar da função exercida. “O caráter da atividade define-se pelo que ela de fato é, e não por quem a exerce, sendo ofensivo ao princípio republicano garantir privilégio de foro nessa situação, em que ausente motivação constitucional ou de qualquer outra ordem para tanto”, destacou.
Direitos da vítima - No parecer, Raquel Dodge também destacou que as vítimas de ação militar têm direito à investigação pronta e justa, por órgão independente e imparcial. Esses fatores são considerados fundamentais para evitar a impunidade e para que seja assegurado o devido processo legal para todos os envolvidos. A premissa, que inclui o julgamento justo conduzido pelo juiz natural, está prevista na Constituição , no Pacto Internacional de Direitos Civis e Políticos e na Convenção Americana de Direitos Humanos.
No parecer, a procuradora-geral requereu, também, o aditamento da ADI para que seja considerada inconstitucional o dispositivo que transferiu para a Justiça Militar a competência para julgar acusado de crimes contra a vida praticados por militares da aeronáutica durante ações específicas. Neste caso, a exceção foi incorporada ao Código Penal Militar pela Lei 12.432, aprovada em 2.011, pelo Congresso Nacional.
ADI 5032 - A PGR também enviou, nesta segunda-feira, memorial referente à ADI 5032, apresentada em 2013 pelo Ministério Público Federal (MPF). Neste caso, o questionamento é quanto à constitucionalidade de norma que inseriu na competência da Justiça Militar o julgamento de crimes cometidos no exercício das atribuições subsidiárias das Forças Armadas. Trata-se da atuação militar na chamada Garantia da Lei e Ordem (GLO) , na defesa civil, no patrulhamento de áreas de fronteira e quando requisitadas pelo Tribunal Superior Eleitoral. Utilizando os mesmos argumentos, Raquel Dodge aponta a inconstitucionalidade da atuação da justiça militar nesses casos. De acordo com a PGR, nessas situações específicas a atividade não é tipicamente militar, mas está relacionada à segurança pública, não cabendo a atuação da Justiça Militar.