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(Millôr Fernandes)

quinta-feira, 1 de junho de 2017

Operação Panatenaico: Sistema de transporte está sob suspeita de fraude

Quinta, 1º de junho de 2017
Operação Panatenaico: Sistema de transporte está sob suspeita de fraude
Delação de ex-executivo da Andrade Gutierrez revela repasses supostamente irregulares para empresas indicadas pelo ex-vice-governador Tadeu Filippelli. Uma delas foi responsável pela licitação de 2011, questionada pelo MP

Por Correio Braziliense Foto: Reprodução/Divulgação
Blog do Sombra


Dois episódios relativos ao transporte público urbano, com supostas irregularidades, se cruzam na trajetória da última gestão do Distrito Federal encabeçada pelo ex-governador Agnelo Queiroz (PT) e pelo ex-vice-governador Tadeu Filippelli (PMDB). O acordo de leniência — uma espécie de delação premiada das empresas — da Andrade Gutierrez apresenta elementos que conectam as fraudes do BRT Sul à consultora Logit, integrante do consórcio responsável pela condução do processo licitatório de 2011 que dividiu a prestação do serviço rodoviário de Brasília em cinco bacias. As empresas Marechal, Piracicabana, Pioneira, Expresso São José e Urbi venceram o certame.
De acordo com o depoimento do ex-diretor da Andrade Gutierrez Rodrigo Ferreira Lopes, em meio às negociações do sistema de transporte expresso, a empreiteira firmou contrato simulado, no valor de R$ 900 mil, com a consultora Logit, a pedido de Filippelli — o acordo serviria para ocultar a verdadeira destinação do montante, ainda em investigação do Ministério Público Federal (MPF).


Sob a justificativa do recebimento de consultorias em engenharia de tráfego e mobilidade urbana, a Andrade Gutierrez realizou o repasse por meio de três boletos de R$ 300 mil, cada. Dois deles mencionam estudos relativos ao “Arco do Tietê, em São Paulo”. A empresa, inclusive, é paulista e fica no bairro de Pinheiros. Firmado em 21 de outubro de 2013, o contrato é assinado pelo delator Rodrigo Ferreira e pelo sócio-proprietário da Logit Wagner Colombini Martins.


Segundo o ex-executivo da Andrade Gutierrez, os contratos simulados eram um dos formatos pelos quais Filippelli recebia propina da empreiteira — os valores indevidos ainda seriam remetidos por meio de doações oficiais ou em espécie. A construtora também firmou acordo com a AB Produções — Canto do cerrado filmes, por R$ 1,6 milhão, indicada pelo ex-vice-governador.

 

Honorários

A participação da Logit era frequente na gestão de Agnelo Queiroz e Tadeu Filippelli. A empresa, assim como a Logitrans, integrou o consórcio responsável pela consultoria necessária à elaboração da licitação do novo sistema de transporte rodoviário. Após a escolha das cinco concessionárias, o certame chegou a ser anulado pela 1ª Vara da Fazenda Pública em razão de indícios de irregularidades. Mas, posteriormente, derrubou-se a decisão.


Era responsabilidade do consórcio Logit/Logitrans a definição dos termos da política tarifária e de integração do transporte; da estrutura financeira e operacional; além dos aspectos jurídicos e institucionais para a gestão, regulamentação e fiscalização do programa; entre outros. À frente do projeto, estava o advogado Sacha Reck, consultor jurídico do quadro técnico do consórcio. A Logitrans tinha, entre os sócios, o pai de Sacha, Garrone Reck, e o irmão, Alexis Reck. A Logit era de propriedade de Wagner Colombini Martins, o mesmo sócio que assinou o contrato entre a empresa e a Andrade Gutierrez, anos depois, no BRT Sul.


O problema era que, à época, Sacha, supostamente, também defendia os interesses da Viação Marechal, empresa para qual havia prestado serviços de advocacia. Além disso, fazia parte do Comissão Permanente de Licitação de Brasília. O Ministério Público do DF e Territórios (MPDFT) acredita que o advogado tenha, assim, ajustado o projeto básico da licitação com base nas necessidades da Marechal.


Na denúncia, o MPDFT detalha que, durante o cumprimento dos mandados de busca e apreensão, foram encontrados comprovantes de pagamentos de honorários advocatícios feitos pela Marechal ao escritório de Sacha. Além disso, o órgão especíifica que, na fase de habilitação, a concessionária teria apresentado documentos em desconformidade com o edital, como documento inidôneo fiscal, atestado de capacidade técnica viciado, balanço patrimonial e demonstração de resultados inidôneos. Ainda assim, a empresa “contou com a ajuda de Sacha, integrante da comissão de licitação, para corrigir os erros”, destaca a petição.


Operação Riquixá

Alvo de 13 ações judiciais na Justiça local e de dois processos no Tribunal de Contas do DF, Reck garantiu aos promotores no Paraná, na Operação Riquixá, que cometeu vários “erros” em sua carreira, mas em Brasília foi diferente (leia Memória). A alegação está descrita em delação premiada, na qual o advogado admite irregularidades em dezenas de estados, como Paraná, Santa Catarina e São Paulo. “Eu não sou mentiroso. É porque lá (no DF) estão caçando um crime que não foi cometido”, afirmou no depoimento prestado aos promotores Vitor Hugo Nicastro Honesko e Leandra Flores, que atuam em Guarapuava (PR). As informações foram prestadas em 13 de julho de 2016.


A Justiça levantou o sigilo da delação depois que o Ministério Público do Paraná apresentou, em março deste ano, denúncia contra o advogado, na qual o aponta como integrante de uma organização criminosa que atuava em vários municípios para fraudar licitações de transporte.


Segundo as investigações, Reck agia desde a formulação do edital direcionado até o julgamento das propostas apresentadas pelas concorrentes, garantindo a contratação da empresa que pagava pelos serviços do seu escritório. As acusações foram confirmadas pelo próprio advogado.


A reportagem não conseguiu contato com a defesa de Tadeu Filippelli. O Correio ligou para o advogado do ex-vice-governador, Alexandre Queiroz, entre as 8h e as 22h de ontem. No entanto, não obteve resposta. Mensagens via WhatsApp foram enviadas ao longo do dia, mas a defesa do peemedebista não retornou até o fechamento desta edição. A reportagem também não conseguiu contato com o advogado Sacha Reck.


Alvo de uma CPI

Em 2015, a CPI do Transporte indiciou o advogado Sacha Reck, o empresário Wagner Colombini Martins, sócio-diretor da empresa Logit, e outras 15 pessoas pelas irregularidades identificadas no processo licitatório relativo à prestação do serviço básico rodoviário, que dividiu o Distrito Federal em cinco bacias. A investigação da comissão começou após o Ministério Público do Distrito Federal e Territórios (MPDFT) pedir à Justiça a suspensão dos contratos com as empresas de ônibus vencedoras do certame. Entre outras medidas, o relatório final recomendou que o MPDFT ajuizasse ações de improbidade administrativa. A votação terminou em três votos favoráveis e dois contrários à aprovação do parecer.