Imprensa é oposição. O resto é armazém de secos e molhados."

(Millôr Fernandes)

quarta-feira, 14 de outubro de 2009

Temporada de gafes

Quinta, 14 de outubro de 2009
Por Ivan de Carvalho

 Parece que estamos, aqui na Bahia, imersos em um festival de gafes, de coisas absurdas, mas que mesmo assim acontecem. Parece nunca haver sido mais atual a famosa observação do ex-governador Octávio Mangabeira: “Imagine um absurdo. Na Bahia há precedente”. Diria que pior: se nem mesmo o precedente existe, nós o criamos. Ou, na mais amena das hipóteses, ele é criado. Na Bahia, nem precisa dizer.
    A safra mais recente de absurdos começou com a história do trem. Compraram um trem que não cabia no buraco onde deveria passar. O Estado comprou o trem, a prefeitura de Salvador cavou o buraco. Claro que aí, em tese – se for investigar será certamente possível determinar responsabilidades pela trapalhada – é possível estabelecer uma polêmica a respeito de quem errou, se o Estado ou a prefeitura. O que não suscita dúvida é o fato de que o buraco era mais baixo.
    Passados uns tempos, a população já estava refeita da estupefação e certamente se preparando para uma temporada de sossego quando explode a nova e quase inacreditável trapalhada. Só não é inacreditável porque aconteceu mesmo e foi na Bahia. Um conjunto de residências do programa Minha Casa, financiado pela Caixa Econômica Federal, foi construído e, uma vez pronto, os felizes futuros moradores foram surpreendidos pela espirocada informação de que não poderiam ocupar suas novas residências pois a empresa que as construiu esqueceu – isso mesmo, esqueceu!!! – de construir a rede de esgotos. Mas não há problema: já foi feito um projeto para a implantação da rede de esgotos esquecida, apressou-se a informar uma autoridade.
    Mencionadas autoridades, não convém omitir uma delas, que esteve na Bahia na semana passada. Das mais poderosas, famosas, ultimamente risonhas e, segundo se comenta nos meios políticos, de estilo autoritário, meio ou inteiro para o arrogante. Era o que dela diziam quando era apenas ministra-chefe da Casa Civil e é a imagem que vem buscando desfazer desde que foi lançada pelo presidente Lula como candidata do PT e partidos aliados para sucedê-lo no cargo.
    Coisa estranha. O marqueteiro-consultor do presidente Lula é o jornalista e poderoso publicitário João Santana, que levou dos seus primeiros tempos de jornalismo (na Tribuna da Bahia) o apelido de Patinhas, que foi secretário de Comunicação do prefeito Mário Kertész e que foi chefe da sucursal de O Globo na Bahia, diretor de redação do Jornal da Bahia antes de rumar para Brasília, onde obteve rápida e impressionante ascensão.
    Mas nem todo o gênio de João Santana (não sei quão profundamente está operando na candidatura de Dilma Rousseff, mas de fora é que não está, assessor informal, ainda que eventualmente prefira parecer que não tem, ao menos por enquanto, nada a ver) impediu que a ministra-candidata a presidente cometesse algumas gafes em Salvador.
    Uma delas foi quando, às voltas com as futuras obras da Via Portuária, estranhou o nome Rótula do Abacaxi. Entendeu que abacaxi não é símbolo de nada bom, ninguém gosta, por exemplo, de “descascar o abacaxi”, e então não teve dúvidas: sugeriu a mudança de nome para Rótula da Melancia. Ou ela gosta muito de melancia ou estava preocupada com a popularidade da mulher melancia no momento em que a sua está um pouco em baixa. Alguns políticos importantes que estavam junto parecem não ter gostado, ao ponto de um deles haver sugerido que se rebatizasse o lugar como Rótula do Pepino.
    Mas onde a gafe foi mais profunda e o consultor-marqueteiro, que não podia prever tal coisa, nenhuma utilidade teve foi a respeito das fitas do Senhor do Bonfim. Quiseram colocar uma no pulso dela, ela rejeitou. “Está não, quero esta aqui”, pegando uma fita semelhante, mas que estava amarrada no gradil de metal do adro da Igreja do Bonfim.
    Não sabia que são postas ali por pessoas que já depositaram nelas o seu pedido. A ministra-candidata levou o pedido alheio. Se ela tivesse o Poder do Senhor Jesus, sem problemas...

Este artigo foi publicado originalmente na Tribuna da Bahia de hoje.
Ivan de Carvalho é jornalista baiano.