Imprensa é oposição. O resto é armazém de secos e molhados."

(Millôr Fernandes)
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sexta-feira, 2 de fevereiro de 2024

Adeus a Samuel Pinheiro Guimarães, um fazedor de Brasil

Sexta, 2 de fevereiro de 2024

 Adeus a Samuel Pinheiro Guimarães, um fazedor de Brasil

Roberto Amaral*

“Um império consiste na organização de um vasto território de Estados por um Estado mais poderoso, uma Metrópole que os submete e cujo objetivo é organizar a produção desses Estados em seu benefício e influir na ação política deles para defesa dos interesses imperiais. Não interessa ao Estado imperial, os EUA, aos grandes Estados desenvolvidos e mesmo aos menos desenvolvidos, nem aos Estados Adversários do Império - a China e a Rússia -, a emergência de uma nova Potência econômica, política e militar, cuja opinião teria de ser levada em conta e cuja ação afetaria seus interesses”.
Samuel Pinheiro Guimarães (O mundo ideal e o mundo real)

Celso Amorim, em síntese admirável, concentra em um adjetivo preciso as tantas qualificações de Samuel Pinheiro Guimarães, definindo-o como indispensável. Assim era o intelectual orgânico que precocemente nos deixa. Precocemente, porque os grandes construtores nos deixam sempre muito cedo, quase sempre quando mais precisamos deles. Como agora, quando, mal saídos do pesadelo protofascista, nos vemos em crise político-institucional que passa ao largo das antecipações e dos cuidados da chamada intelligentsia brasileira e promete aprofundar-se quando a estrutura partidária-ideológica se encontra em seu pior momento republicano, e o movimento sindical perde forças até em suas reivindicações econômicas e corporativas,  anunciando o que está por vir com a fragilização do trabalho nas relações de produção capitalista.

O cenário de hoje é um país em crise política, um governo popular ainda por ser e um mundo em turbulência econômica, política e ética (que dizer do genocídio dos povos do gueto de Gaza?) acicatado pela crise de hegemonia que enseja a multipolaridade de blocos e arranjos  de nações ameaçando o monopólio ocidental, abrindo espaços na política e no comércio e criando desafios para a resposta histórica dos tantos países da periferia capitalista, onde nos encontramos, após 500 anos do experimento reacionário da casa-grande.

 
As circunstâncias e as contingências, abertas pela emergência da Eurásia, impondo-nos desafios, criam condições para um reordenamento político-econômico, que, não sendo para já, parece inevitável nos médio e longo prazos. No panorama de hoje já se pode divisar o fortalecimento de nações periféricas, e a reafirmação dos conceitos de soberania e defesa nacional e regional. Esses são, justamente, alguns pontos da reflexão de Samuel, pensador e formulador militante, um dos mais notáveis num rol de meia dúzia de pensadores estratégicos com que contava a ciência política brasileira que se desenvolve fora dos cânones da academia. Samuel trabalhava esses temas em palestras e conferências Brasil afora, e a partir de seu refúgio brasiliense. Sua reflexão, sua análise da realidade, porém, não se findava na pura contemplação: conhecer a realidade era o ponto de partida de sua intervenção no mundo, visando a modificá-lo, em proveito da agenda social.