Quarta, 8 de junho de 2016
Maria Bethânia e Gal: ''Oração a mãe menininha '', composição de Dorival Caymmi
Clementina de Jesus - "Menininha do Gantois"
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Sayonara Moreno – Correspondente da Agência Brasil
A
Mãe de Santo baiana Menininha do Gantois será a homenageada da Escola
de Samba Vai Vai no carnaval paulistano do ano que vem. A escolha foi
feita para marcar os 30 anos de morte da matriarca do candomblé, que
representa a cultura e religiosidade de matriz africana na Bahia
Com enredo já definido – No Xirê do Anhembi, a Oxum mais bonita surgiu. Menininha Mãe da Bahia, Ialorixá do Brasil
– e uma sinopse do desfile, representantes da escola foram à Bahia
pedir oficialmente autorização à Mãe Carmem, filha da homenageada e
atual ialorixá do Terreiro do Gantois, localizado no bairro da
Federação, em Salvador.
“Este ano, exatamente por causa do
aniversário de morte de Mãe Menininha, veio essa vontade do nosso
presidente de fazer a homenagem a essa grande figura, para abordar todo o
legado de amor, de paz, de união, de religiosidade que ela deixou.
Dessa forma, fomos consultar a Mãe Carmem, lá no Gantois, e felizmente
obtivemos isso [a autorização]. A nossa intenção é fazer um grande xirê
[palavra iorubá que significa dança e evocação aos orixás] no palco do
Anhembi e contar a trajetória de doçura dessa ialorixá mais famosa do
mundo”, disse à Agência Brasil a diretora de Carnaval da Vai Vai, Janaína Decarli.
Janaína
contou que a ideia de homenagear a matriarca baiana surgiu em um sonho
do presidente da escola, Darli Silva (Neguitão). Segundo a diretora,
Silva sonhou que a Vai Vai deveria homenagear a Mãe Menininha e propôs
aos demais membros da agremiação, que acataram a sugestão.
“Vamos
levar para a avenida o legado de amor, a doçura, a história de vida com
os orixás, em vida e depois da morte. Quando se lembra de Mãe
Menininha, lembra-se de amor. A gente vai falar dela, pelas veias do
candomblé, por meio dos orixás. Vamos trazer essa bandeira de homenagem
ao candomblé e às religiões de matriz africana. Vamos passar por cima de
todo o preconceito e intolerância que existe contra algumas religiões,
contra orientação sexual, de raça”, acrescentou a representante.
A
proposta da homenagem foi levada diretamente aos envolvidos com o
Terreiro do Gantois e aos familiares da Mãe Menininha, em Salvador. A
filha caçula da homenageada, Mãe Carmem, é a atual ialorixá do terreiro.
Hoje, com 88 anos, ela contou que recebeu com alegria a notícia do tema
do desfile da Vai Vai. Mas o “sim” só pôde ser dado após uma consulta
aos orixás.
“Depois que consultei os orixás, eles aceitaram que
fizessem [a homenagem]. Eu fiquei muito feliz e agradecida, porque é uma
grande homenagem a mamãe, então só tenho a agradecer. Por que não
aceitar isso, com o consentimento dos orixás? Vai sair muita coisa do
candomblé: muita cultura, de tudo um pouco, vai ser uma coisa linda. Eu
não vou participar do desfile porque a homenagem será para mamãe, mas
sei que vai ser muito bonito”, disse a mãe de santo.
Sobre a importância de combater a intolerância religiosa, a ialorixá é taxativa: “nem Deus e nem o Diabo quer [a intolerância]”.
“Eu
fui criada totalmente no candomblé, minha mãe era do candomblé, mas
tivemos muita vivência católica, por exemplo. Ela queria que fôssemos
batizados e fizéssemos a primeira comunhão na Igreja Católica. Então,
dentro do candomblé, não se proíbe nada que é bom. Não há justificativa
[para a intolerância religiosa]. Por que essa intolerância? Só porque é
de preto e pobre? Não pode ser”, afirmou a filha de Mãe Menininha, que
ressalta a importância de mostrar o candomblé como uma religião que
prega o bem e a igualdade.
Para o diretor do Centro de Estudos
Afro Orientais da Universidade Federal da Bahia (UFBA), professor Lívio
Sansone, ligado à área de antropologia, a importância de Mãe Menininha
extrapola a religiosidade e reflete a luta que ela mesma teve em defesa
do candomblé.
“O carnaval é feito de festa e celebração e é bom
que sejam celebradas também as pessoas que tiveram o grande mérito de
preservar as tradições africanas no Brasil e aprenderam a apresentá-la
de maneira interessante a um público muito amplo. Mãe Menininha teve
esse grande mérito, era uma mensageira entre dois mundos: o mundo da
casa de santo e o mundo da sociedade mais ampla. Ela foi visitada por
presidentes, políticos, sempre por pessoas importantes. Ela foi
determinante na luta para tirar o candomblé da marginalidade e
transformá-lo em uma das tantas religiões do Brasil”, disse o
especialista.
Na opinião de Sansone, a escolha da homenageada é
justa e merecida, inclusive como forma de mostrar à população a
importância do respeito à religiosidade. Se o carnaval tem que
homenagear alguém, nada melhor do que Mãe Menininha, sobretudo neste
momento em que é necessário lutar para que a tolerância religiosa seja
uma prática, não somente um lema. Ela é um símbolo grande e é justo que
seja escolhida”, acrescentou.
Em 1976, dez anos antes de morrer,
Mãe Menininha do Gantois foi homenageada pela Escola de samba carioca
Mocidade Independente de Padre Miguel. Ela nasceu em Salvador, em 1894, e
morreu em 1986, aos 92 anos, de causas naturais. Descendente de pessoas
trazidas da Nigéria para serem escravizadas, a mãe de santo foi
escolhida para ser ialorixá do Terreiro da avó, ainda criança. Passou,
oficialmente, a matriarca do local, aos 28 anos.