Sábado, 13 de março de 2010
Por Ivan de Carvalho

Fariñas, que não está preso, deixou de se alimentar por solidariedade, pela libertação de 27 prisioneiros de consciência (presos políticos). Sua greve de fome foi iniciada logo após a morte, em consequência de greve de fome de 85 dias, do preso político Orlando Zapata Tamayo, de 42 anos, que cumpria pena de 29 anos de prisão. O comportamento do governo cubano no episódio e sua política em relação aos dissidentes do regime comunista provocaram protestos em quase todo o mundo. O mais amplo foi do Parlamento Europeu, que por mais de 500 votos contra apenas 20 condenou, na quinta-feira, a ditadura castrista.
A mesma atitude não teve o presidente do Brasil, Lula da Silva. Nem a diplomacia brasileira. Por um acaso desses que não acontecem por acaso, mas pelo que Carl Jung chamou de sincronicidade – e que sempre têm algum propósito, mesmo que não o idenfiquemos de imediato – Lula estava fazendo sua quarta visita a Cuba desde que assumiu o governo. Claro que ele lamentou a morte de Zapata, mas isso foi só o sinal para o início de uma saraivada de bobagens, impropriedades e coisas alopradas.
Desaconselhou greves de fome, pois já fizera uma quando sindicalista, não gostara e desistira (faltou-lhe, talvez, a fibra de Zapata ou sobrou-lhe a esperteza que este não tinha), disse que não podia fazer emitir conceitos sobre as leis cubanas, mas condenou as greves de fome “a pretexto” de defesa de direitos humanos (!!!) e equiparou os presos de conciência de Cuba com os bandidos presos por crime comum nas penitenciárias brasileiras, nominadamente, as paulistas.
Enfim, contrariando o grande e saudoso mestre do Direito Orlando Gomes, que costumava usar em suas aulas a expressão “obrou bem”, Lula foi na direção inversa e obrou mal. E essa obra foi tão ruim que ele e o governo têm se esforçado na vã tentativa de atrapalhar o entendimento das pessoas a respeito. Mas já está evidente que, nessa obra, quanto mais se mexe, mais fede, como já observei em artigo anterior.
Ora, o jornalista Guillermo Fariñas (jornalista em Cuba deve ser uma profissão martirizante ou vergonhosa, a depender do caráter do profissional) já realizou mais de 20 greves de fome, esteve preso três vezes e sofreu na quinta-feira um choque hipoglicêmico semelhante ao que já sofrera em 3 de março. É a chance de Lula desfazer um pouco do malfeito que praticou em relação à repressão política e aos direitos humanos em Cuba.
Pois Guillermo Fariñas qualificou Lula de “cúmplice da tirania dos Castro”. Que tal, como Jesus recomendou, Lula amar o inimigo e abraçar sua causa justa, passando a defender a libertação dos presos políticos pelos quais Fariñas está se sacrificando?
Ah, e a Federação Nacional dos Jornalistas, a Fenaj? Não tem nada a dizer?
Este artigo foi publicado originalmente na Tribuna da Bahia deste sábado.
Ivan de Carvalho é jornalista baiano.