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quarta-feira, 23 de agosto de 2023

Ocidente, Oriente: comunicação e energia

Quarta, 23 de agosto de 2023

Por Pedro Augusto Pinho*

Publicado originalmente no Monitor Mercantil — 22 de agosto de 2023

 

Arqueólogos identificam, na China, 3 mil anos antes da Era Cristã, uma civilização refinada, com sistema político bem elaborado, correspondendo à dinastia, um tanto mítica, dos Xia. Seguiu-se, até o século 8 a.C., o que se denomina a “cultura arcaica” dos Shang e dos Zhou, dando a ideia de que o fluxo civilizacional não é de contínuo aperfeiçoamento, mas sequências de avanços e recuos.


Por volta do século 3 d.C., um autor romano anônimo deixou gravada esta mensagem:


É preciso que se saiba que o Império Romano contém, por toda parte, a fúria das nações que uivam à sua volta, e que a barbárie, protegida pela natureza dos lugares, cobiça de todos os lados as nossas fronteiras.


Oriente e ocidente construíram seus primeiros passos como distintas civilizações pelas invasões das civilizações vizinhas, quase sempre qualificadas como bárbaras, tendo resultados, como os percebemos, bastante diferentes.


Os territórios da China e da Europa, excluindo a Rússia, ocupam, respectivamente, 9.596.961 km² e 6.630.000 km². Ou seja, uma Argentina separa a Europa (sem a Rússia) da China no espaço territorial. Quanto à população, a Europa (também excluída a Rússia) possui (dados da Organização das Nações Unidas (ONU) para 2023) 605 milhões de habitantes, enquanto a China é povoada por 1.425 milhões de pessoas.


No entanto, a maior desigualdade é a civilizacional. Europa e China caminharam para lados opostos. A Europa submeteu-se ao Consenso de Washington (1989) e retrocede desde o final do século 20. A República Popular da China encontrou seu socialismo com características chinesas e, a partir de então, transformou-se no país mais avançado deste século 21.


As grandes guerras da primeira metade do século 20 deram poder às civilizações industriais, quer no campo capitalista, quer no socialista, parecendo fazer surgir universalmente um novo conceito de sociedade.


No entanto, a sociedade fundiária financeira, que era preponderante desde o final da Idade Média até o início do século 20, inconformada com sua derrota, iniciou a reconquista do poder, utilizando os recursos tecnológicos que então despontavam, fortemente calcados na materialidade do tratamento da informação, que se denominou cibernética – comunicação e controle nos animais e máquinas – e nas emergentes fontes primárias de energia – o petróleo, desde o final do século 19, e a termonuclear, criada na 2ª Grande Guerra.


Reflexões civilizacionais

A longevidade encontrada na frase citada no início deste artigo, do romano anônimo do período de Diocleciano, pode estar na argúcia com que percebeu que a “natureza dos lugares” era a origem das diferenças que moldavam e fortaleciam Roma. E concluímos que a destruiu ao se homogeneizar numa ideologia: o cristianismo, que superou a repartição do Império e se impôs a ambas as metades.


As civilizações crescem, se desenvolvem, na medida em que processam e incorporam diversidades. O grande malefício trazido pelo Consenso de Washington foi o “fim da História”, a globalização ideológica do neoliberalismo.


E esta ideologia levará à decadência do ocidente e à resposta nacionalista encontrada pela China para o seu desenvolvimento.


Essas reflexões poderiam se espalhar por diversos nichos de pensamento e diversas ciências, mas iremos nos restringir à comunicação e à energia, que o Consenso de Washington buscou dominar e unificar.


A comunicação vai além da transmissão de informações; ela cria mecanismos de raciocínio que denominamos “pedagogia colonial”. O mesmo fato, materialmente apresentado em foto, filme, dissertação ou qualquer modo de transmissão, pode ser entendido de maneiras diferentes, conforme a base de raciocínio que encontre para sua tradução. Essa construção é mais profunda do que a ensinada no processo educacional. Ela se forma nas convivências sociais, nos alimentos e nos afetos, nas relações impostas ou induzidas, nos comportamentos desejados, esperados e permitidos. Assim, o pobre apoia quem o mantém pobre, o escravo apoia aquele que o escraviza e todos, ao final, se acomodam na incapacidade da autonomia.


A energia impulsiona a vida e as sociedades. O principal indicador de uma nação, de uma civilização, é a quantidade de energia que aplica; a energia per capita não carrega as deformações do produto interno bruto, que pode ser inflado pela especulação, pela exportação de produtos primários, por gerar renda para fora e não para o país.


A reconquista do poder pelas finanças teve a compreensão de que só teria sucesso se dominasse as fontes de energia. E desencadeou, sem que houvesse carência ou abundância de energia, as falsas crises dos anos 1970 (crises do petróleo de 1973 e 1978), imputando aos países árabes suas responsabilidades. Estariam já seus planejadores e estrategistas prenunciando a farsa do terrorismo islâmico?


O ocidente é a Europa colonizadora e sua colônia que se tornou potência industrial-militar, os Estados Unidos da América (EUA). O oriente é a milenar civilização chinesa, que soube evitar a sujeição ideológica religiosa e, mesmo colonizada, manteve o idioma e a identidade. As Américas, excluindo os EUA, a África, todo o restante da Ásia e a Oceania colocaram-se no balcão das colônias, perderam seus deuses, suas origens, suas individualidades.


Decadência ocidental

A Rússia, excluída territorialmente e em termos de população, não poderia ser afastada das disputas civilizacionais. Primeiro, por ser o maior país do mundo, participando tanto do ocidente quanto do oriente. Porém, mais relevante ainda, é ter desenvolvido, a partir da revolução de 1917, sua própria tecnologia e modelo de industrialização, ou seja, pela contingência histórica de ter sido o primeiro país socialista, foi obrigada a caminhar com seus próprios pés. E sem poder falhar!