Sexta, 26 de maio de 2017
Da Pública
Agência de Reportagem e Jornalismo Investigativo
Posseiros dizem ao Ministério Público que colegas foram rendidos
antes de serem mortos; uma testemunha está desaparecida: teria sido
levada pela polícia no dia dos assassinatos no Pará
Três testemunhas oculares ouvidas
pelo Ministério Público do Pará e pelo Ministério Público Federal deram
depoimentos que reforçam a suspeita do CNDH de que os posseiros mortos
na fazenda Santa Lúcia, no município paraense de Pau D’Arco, foram
executados.
Os posseiros reafirmaram em seus
depoimentos que foram surpreendidos pela polícia na última quarta-feira,
quando as mortes ocorreram. Chovia muito naquela manhã. “Por conta do
barulho da chuva, a Polícia conseguiu se aproximar sem ser ouvida”,
disse à Pública o
presidente do Conselho Nacional de Direitos Humanos (CNDH), Darci Frigo,
que está acompanhando as diligências do MP. Quando perceberam a polícia
se aproximando, alguns posseiros deixaram suas casas.
Segundo os depoimentos, o casal Jane
Julia de Oliveira e Antonio Pereira Milhomem, seus três filhos e dois
sobrinhos se esconderam na mata quando perceberam a aproximação dos
policiais. “De acordo com os relatos, essas pessoas foram rendidas pela
polícia antes da execução”, relatou Frigo. “A polícia conseguiu se
aproximar sem ser ouvida e obter informações de pessoas que conheciam o
local e o acampamento para que pudessem chegar àquelas pessoas mais
precisamente.”
Pertences foram deixados para trás na Fazenda Santa Lúcia, local das 10 mortes (Foto: CNDH)
Nas diligências do MP, surgiram
informações de uma possível coação às testemunhas. Segundo o MP, 28
posseiros estavam na ocupação no momento dos fatos. Uma das testemunhas
vivas – uma posseira identificada apenas pelo apelido de “Baixinha” –
teria sido levada pela polícia no dia do massacre e até agora não foi
encontrada. “Nós estamos fazendo uma busca ativa, mas até o momento essa
senhora, conhecida como Baixinha, não foi localizada. Há outras duas
testemunhas. Fora essas quatro, não sabemos onde estão as outras
testemunhas vivas, pois elas fugiram e estão amedrontadas”, afirmou o
presidente do Conselho Nacional de Direitos Humanos.
O desaparecimento das pessoas foi confirmado pela Pública
com outras fontes que acompanham a investigação. Há relatos
preliminares de que alguns posseiros teriam sido agredidos antes de
serem mortos. O laudo do Instituto Médico Legal só deve ficar pronto
daqui a um mês. A Secretaria de Segurança Pública do Pará (Segup) não
confirma nem desmente a informação. Eles afirmaram que “somente o final
das investigações, com o resultado das perícias, poderá dizer.” O órgão
informou que o Instituto Médico Legal (IML) trabalha com o prazo de 15
dias úteis para finalizar os laudos necroscópicos.
Uma das testemunhas disse ter visto
outras pessoas correrem para a mata no momento dos disparos. A Comissão
de Direitos Humanos da Assembleia Legislativa do Estado do Pará (Alepa)
foi à Fazenda Santa Lúcia na manhã desta sexta-feira e ofereceu proteção
às testemunhas oculares por meio do programa Provita. A Fetagri
(Federação dos Trabalhadores da Agricultura no Estado do Pará) já
programa mobilizações contra a chacina. A Segup deslocou o delegado
Aurélio Paiva para realizar uma investigação paralela à do Ministério
Público. Ele será auxiliado por Silvio Maués, diretor de Polícia
Especializada lotado em Belém.
O MP está colhendo nesta sexta-feira o
depoimento de alguns agentes apontados como responsáveis pelo massacre.
Fotos produzidas nas diligências do MP indicam que a fazenda estava
abandonada.
Em nota, a Segup afirmou que apenas o
resultado final das investigações poderá dizer se os fatos relatados
pelas testemunhas são verídicos.