Domingo, 25 de junho de 2023

Obra financiada pelo BNDES en Angola. Foto: BBC Brasil
Por que é urgente descriminalizar o BNDES
Empréstimos do banco a países do Sul Global foram criminalizados pela Lava Jato, mídia e políticos conservadores. Mas são essenciais para a diplomacia, comércio exterior e até a reconstrução da indústria nacional, por meio das exportações
OUTRASPALAVRAS
Por Dante Apolinario, Gabriel Horacio de Jesus Soprijo, Lívia Romano F. da Cruz, Lucas Santiago Portari, Luciana Henrique e Mariana Barboza Cerino, no Observatório da Política Externa e Inserção Internacional do Brasil (OPEB)
Introdução
Ao retornarmos ao processo da Operação Lava-Jato, o BNDES foi uma das instituições duramente acusadas de financiar projetos, fora do país, de companhias envolvidas em denúncias de corrupção. Em virtude disso, foi instaurada a CPI do BNDES em 2015, para investigar a participação do Banco em possíveis esquemas. Dada à luz dos fatos, como consta no próprio site da instituição, as acusações acabaram por revelar-se infundadas. Mas isso não impediu que um certo panorama de incerteza, em relação ao Banco em questão, se construísse.
Já no início do ano de 2023, Lula afirmou, no discurso de posse do novo presidente do BNDES, que o motivo da escolha pelo nome de Aloizio Mercadante era porque o país necessitava de alguém que pensasse em “desenvolvimento” e em “reindustrializar” o país. As oportunidades com uma possível exportação de bens e serviços produzidos no Brasil é a de que aumente a competitividade das empresas brasileiras, entradas de divisas e geração de empregos. Dessa forma, poderia ocorrer uma expansão do mercado brasileiro e o desenvolvimento de novas tecnologias.
Por um lado, alguns dos riscos de tal empreitada, como apontado por Nelson Marconi, da FGV, estão no fato de que esse investimento poderia ser destinado para o próprio país, não para fora. Por outro, o posicionamento de Mercadante no que tange a projeção brasileira não poderia ter sido mais claro. Em entrevista recente no programa Roda Viva, Mercadante enfatizou o lançamento de linhas de crédito para exportação. Isso porque, se não ocorresse uma ajuda por parte do Banco de Desenvolvimento, a indústria brasileira correria sério risco de colapso: “Nós somos 2% da economia mundial. Se as empresas brasileiras não exportarem, e disputarem o mercado internacional, elas não terão futuro, nem eficiência e competitividade. Temos que aumentar a produtividade para disputar, e o BNDES tem que ajudar financiando a exportação de empresas brasileiras.”
O posicionamento reflete o esforço necessário para “limpar a imagem”: segundo o atual presidente da República, o banco foi vítima de um intenso processo difamatório durante os quatro últimos anos. Cabe, portanto, uma análise mais precisa do histórico de atuação do BNDES.
Atuação BNDES
Ao analisarmos os dados fornecidos pelo próprio BNDES, — em seu Livro Verde — observamos que a mesma instituição foi estratégica no combate aos efeitos da Crise de 2008. Anteriormente a ela, entre 2001 e 2007, há um período de estabilidade, os estoques de crédito do BNDES em relação ao PIB giram em torno de uma taxa média de 5,7%. Já entre 2008 e 2010, a taxa sobe para 8,1%, e se mantém em ritmo de crescimento entre 2011 e 2014, chegando a uma nova média de 10,2%. Após 2014, há uma reversão e um processo de queda aos níveis pré-crise. Outros dados interessantes de serem observados, que também confirmam a tendência de queda do gráfico, é a participação do saldo das operações de financiamento do BNDES como proporção da carteira total de crédito da economia ao longo de pouco mais de duas décadas, desde meados de 2000 até 2021:
Uma das ações notáveis de atuação do BNDES, ocorreu ainda durante o primeiro governo Lula, em 2003, com a assim chamada Política Industrial, Tecnológica e de Comércio Exterior, que objetivava o aumento da eficiência econômica e o desenvolvimento de tecnologias com maior potencial de competição no comércio internacional por meio do financiamento do BNDES. Em 2007, os setores tiveram um ganho ainda mais expressivo de participação relativa nas liberações do BNDES, quando as políticas econômicas do governo estavam se adaptando para uma fase anticíclica, e criou-se o Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), que visava incentivar o investimento privado e aumentar o investimento público em infraestrutura. De qualquer modo, em 2011, é substituído pelo Plano Brasil Maior (PBM), com objetivos ligados a investimento, inovação, pequenas empresas e exportação, servindo de base para o futuro e o Plano Nacional de Exportações (2015 até 2018).
Além disso, desde 1991, o BNDES apoiou mais de US$ 96 bilhões em exportações para 45 países, gerando retorno líquido de US$ 4,2 bilhões ao Banco, que representou em média 9,8% do total dos desembolsos entre 2007 e 2017. Os desembolsos representam cerca de 48% do total do orçamento dos projetos e seus financiamentos movimentaram uma rede de 4.044 fornecedores no Brasil, sendo 2.785 micro, pequenas e médias empresas, quais permanecem mais tempo no mercado, demonstrando a efetividade da atuação do BNDES.
Em seu papel, o BNDES financia projetos no exterior que tenham exportações brasileiras de bens e serviços destinados a suas obras. Tem-se, por exemplo, o projeto Cuba, que apresentou benefícios como acesso a um mercado restrito, além de trazer a atuação de aproximadamente 400 empresas brasileiras. As exportações se diferenciam de investimentos no exterior; com os governos estrangeiros / empresas importadoras sendo os responsáveis pelo pagamento das exportações brasileiras, a entrada de divisas subsequentemente viabiliza melhores investimentos no setor produtivo nacional.
Casos mais antigos, como o metrô de Caracas, geram dúvidas na população brasileira, porém, retrata um caso de internacionalização – segundo Eduardo Suplicy, senador de São Paulo na época, “trata-se de um financiamento de US$ 194 milhões para uma construtura brasileira realizar exportações de serviços de engenharia, além de máquinas e equipamentos produzidos no Brasil”, em auxílio à obras que ocorrem no exterior.
Experiência Internacional
No cenário internacional, as grandes economias aproveitam as oportunidades de financiamentos a outros países como meio de estímulo de sua própria dinâmica interna. Ou seja, as operações internacionais do BNDES durante os governos Lula e Dilma seguiram uma prática bem comum no mundo. Seguem três exemplos, do Exim Bank dos EUA, do Banco de Desenvolvimento da China e o UK Export Finance.