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(Millôr Fernandes)

segunda-feira, 19 de abril de 2010

Governador terá que cumprir decisão da Justiça

Segunda, 19 de abril de 2010
O governador-tampão eleito sábado passado, Rogério Rosso, assume hoje às 10 horas na CLDF (Câmara Legislativa do Distrito Federal). Apesar dos 13 votos recebidos de deputados para que ele fosse eleito, vai precisar de muito jogo de cintura para administrar as relações com os distritais.
Vai ter também de enfrentar outros problemas do GDF. A começar pelos contratos suspeitos que o governo mantém com empresas ainda mais suspeitas.
Outro problema que enfrentará, e terá que resolver, é a desocupação das passagens de pedestres das quadras residenciais do Gama. Decisão do Conselho Especial do TJDFT (Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios) declarou a lei 780/2008 inconstitucional com efeitos ex tunc e erga omnes, o que significa que aqueles militares da PM e dos Bombeiros “beneficiados” com a “doação” de tais áreas se encontram em situação totalmente irregular.
A declaração de nulidade da lei 780, em sessão do Conselho Especial do TJDFT, ocorreu com o julgamento de duas Adins (Ações Diretas de Inconstitucionalidade), uma promovida pelo Ministério Público Federal do Distrito Federal e Territórios (MPDFT) e outra pela OAB-DF (Ordem dos Advogados do Brasil). As duas questionavam a lei e pediam a declaração de inconstitucionalidade com efeitos ex tunc e erga omnes.
Como a anulação se deu com efeitos ex tunc, significa que desde o dia 2 de setembro de 2008, data em que o então governador do DF Roberto Arruda a sancionou, a lei é de todo nula. Os documentos emitidos pelo GDF, decisões ou atos de iniciativa do governo que tiveram por base a lei 780, são nulos para todos os efeitos. 
Por ter a declaração de inconstitucionalidade também efeitos erga omnes ela atinge todos os pretensos “beneficiários” da lei.
Arruda, e depois Wilson Lima, se fingiram de mortos e, irresponsavelmente, não cumpriram as decisões da Justiça. Wilson Lima, ainda como governador interino, numa manobra apenas protelatória, entrou, em 8 de março de 2010,  com embargos de declaração no TJDF. Este tipo de medida judicial é um tipo de recursos que é interposto ao próprio julgador, juiz ou desembargador relator, para que seja esclarecido algum ponto da decisão que a parte —no caso o GDF— tenha considerado obscuro, ambíguo ou contraditório. Pede-se ao julgador que se pronuncie sobre alguma questão que uma das partes tenha considerado omitida e que deveria ter sido objeto da decisão.
Mas cristalina foi a decisão do Conselho Especial do TJDF que, em 24 de novembro de 2009, declarou a nulidade da lei desde o seu inicio em 2 de setembro de 2008.
Nos embargos de declaração, o governador Wilson Lima alegou que estavam presentes razões de excepcional interesse social a justificar a aplicação do artigo 27 da Lei nº 9.868/99, a fim de conceder eficácia ex nunc à declaração de inconstitucionalidade, ao menos até a publicação da ata de julgamento da Adin, ocorrida em 3 de dezembro de 2009, portanto apenas sete dias após o julgamento. O governador pediu que os efeitos da declaração de inconstitucionalidade não retroagissem à data de sanção da lei 780/2008 (2 de setembro de 2008). Queria que as passagens já destruídas com a ocupação irregular por militares permanecessem como lotes residenciais. O TJDFT não aceitou e reafirmou sua decisão de novembro.
Tentou, o governador Wilson Lima, convencer o Conselho Especial do TJDFT de que estavam em jogo os comandos constitucionais relacionados a programas habitacionais que materializam o “direito sagrados à moradia e expressam o uso racional de espaços públicos”. Sobre isso já havia se pronunciado o Conselho no julgamento da Adin. Não caberia agora tentar mudar a decisão do TJDF.
Nos seus fracassados embargos de declaração, tentou o governador Wilson Lima que o TJDF mudasse sua decisão, que transformasse a nulidade com efeitos ex tunc para ex nunc (da decisão para frente).
Por unanimidade —14 votos a zero— o Conselho decidiu, em 23 de março de 2010, pela rejeição total dos embargos de declaração interpostos pelo governador. No dia 5 de abril o acórdão sobre tais embargos foram publicados no Diário da Justiça.
Em seu voto no julgamento dos embargos de declaração (em sessão de 23 de março de 2010), o relator do processo, desembargador Octávio Augusto, deixou assinalado que no acórdão da decisão tomada em novembro de 2009 não havia falta de clareza na redação que pudesse eventualmente permitir duplo sentido de interpretação.
Octávio Augusto, o relator, também assinalou que no acórdão embargado (o da decisão de 24 de novembro de 2009) ficou “consignado que a Câmara Legislativa, mesmo após o veto do Sr. Governador do DF ao inciso IV do art. 105 da Lei Complementar nº 728/06, insistiu na promulgação desse dispositivo legal, mantendo-o no bojo do texto legal sem qualquer ressalva ou alteração”. E ainda assinalou em seu relatório: “Vê-se, assim, que, ainda que diante de evidenciada inconstitucionalidade formal desse dispositivo, houve a edição de novo compêndio legal tendente a regulamentar artigo sabidamente inconstitucional, convolado na Lei Complementar nº 780/08, que, por óbvio, também estaria maculado por vício”.

A omissão do DF e da Administração Regional do Gama
O Gama Livre transcreve a seguir, por serem elucidativos da situação, os quatro últimos parágrafos do voto do relator do julgamento dos embargos de declaração apresentado pelo governador Wilson Lima:
                 Ressalte-se, ademais, que a despeito da ciência da decisão nas presentes ações diretas de inconstitucionalidades, alguns beneficiários das normas em xeque, com a omissão do DF e da Administração Regional do Gama, além de continuarem com as construções, aceleraram-nas com o nítido escopo de estabelecer fato consumado, conforme restou noticiado pelo petitório de fls. 2008/210 e fotografias de fls. 212/223.
                Ora, em ralação aos efeitos da declaração de inconstitucionalidade dessas normas, não é, e nem era, imprevisível a gravidade dos prejuízos eventuais decorrentes da nulidade ex tunc dos dispositivos legais, o que significa que deve ser seguida a ordem natural das coisas, direcionada “no sentido de deter-se como regra a retroação da eficácia do acórdão declaratório constitutivo negativo à data da integração da lei proclamada inconstitucional, no arcabouço normativo” (ADI 2.728-ED. Rel. Min. Marco Aurélio, julgamento em 19-10-06, DJ de 5-1007).
               A modulação dos efeitos somente é possível tendo em vista razões de segurança jurídica ou de excepcional interesse social, em conformidade com o que dispõe o artigo 27 da Lei n. 9.868/99, incorrentes na hipótese.
              Nessa conformidade, inexistindo omissão no acórdão a ser sanada na via estreita dos presentes embargos de declaração, ficam esses rejeitados.

Agora a batata quente está nas mãos de Rogério Rosso, o governador de Brasília a partir das 10 horas desta segunda-feira (19/4). Cabe a ele cumprir as decisões da Justiça, coisa que, infelizmente, os dois governadores —o cassado e o que sai hoje— não cumpriram. O não cumprimento de decisão judicial é tipificado como crime de responsabilidade.