Sexta, 22 de
novembro de 2012
Por Ivan de
Carvalho

Como instrumento de
investigação, também, pois não foi criada para fazer qualquer investigação
séria, mas para atingir alguns adversários (como o governador tucano de Goiás)
ou desafetos de Lula e de alguns petistas (como o procurador geral da
República, Roberto Gurgel, que desagradou aos inspiradores da CPI por sua
atuação no processo do Mensalão, e alguns jornalistas).
No capítulo de não fazer
investigação para valer, a CPI do Cachoeira, com sua ampla maioria e seu
comando governistas, olhou na direção em que não estavam os governadores Sérgio
Cabral, do Rio de Janeiro e Agnelo Queiroz, do Distrito Federal. O primeiro do
PMDB, o segundo do PT. E tangenciou a construtora Delta, controlada por
Fernando Cavendish, amigo de festas de Cabral em Paris. A Delta é a segunda
empresa do país em contratos com obras do PAC.
Enquanto a CPI do Cachoeira
desvia-se do principal e seu relator apresenta um relatório que só não é um
fracasso retumbante porque é aquela porcaria mesmo que o relator quer
apresentar, apesar do que isso não evitou – até estimulou – a discórdia que já
forçou dois adiamentos da apreciação do relatório na CPI, uma comissão especial
da Câmara dos Deputados faz coisa muito pior.
Porque essa comissão especial,
composta em grande parte por deputados ligados às polícias, aprovou uma
proposta de emenda constitucional, a PEC 37, que retira do Ministério Público
(e isso valeria ou valerá para o MP federal e os estaduais) o poder de
investigação, tornando-o exclusivo das polícias. A PEC terá de ser votada ainda
em dois turnos na Câmara dos Deputados e ser apreciada, segundo o mesmo rito,
pelo Senado.
Ora, essa exclusividade
policial, como já destacou o promotor de Justiça paulista Arthur Lemos Júnior,
só existe atualmente em Uganda, no Quênia e na Indonésia. O procurador geral da
República, Roberto Gurgel, afirmou ontem que a aprovação dessa PEC seria “um
dos maiores atentados ao Estado Democrático de Direito”.
Já no pronunciamento que fez na solenidade de posse
do ministro Joaquim Barbosa na presidência do STF, o procurador-geral voltou a
defender a manutenção do poder de investigação do Ministério Público e disse
que somente países sem uma democracia plenamente consolidada impedem o MP de
investigar. “A quem interessa retirar o poder de investigação do MP? Seria mais
uma retaliação pelo seu cumprimento de sua missão constitucional? Essa é uma
das perguntas que a sociedade cabe formular”, questionou Gurgel, fazendo uma
referência indireta, mas evidente, à atuação do MP no processo do Mensalão.
É isso e mais alguma coisa. A polícia (federal e
estaduais) frequentemente faz as coisas mal feitas, sob os aspectos legais e
formais, o que inutiliza investigações, ou investiga insuficientemente ou de
modo incompetente, o que deixa crimes encobertos. Mas com frequência a polícia
não gosta de ter o MP conduzindo ou participando de suas investigações e também
não gosta que o MP tome a si a responsabilidade de uma investigação. Esse fato
ou a perspectiva de que venha a ocorrer pode obrigar a polícia a investigar, mesmo
que preferisse não fazê-lo, imitando a CPI do Cachoeira.
E o principal é que o MP é autônomo, independente,
não está subordinado a qualquer dos Três Poderes, enquanto a polícia integra a
estrutura do Poder Executivo. Só isso basta para desqualificar essa reacionária
PEC 37. Tem gente querendo fazer o país andar para trás.
- - - - -
- - - - - - - - - - - - - -
Este
artigo foi publicado originariamente na Tribuna da Bahia desta sexta.
Ivan de
Carvalho é jornalista baiano.