Quem mentiu para o governador
Rollemberg sobre Organizações Sociais (OSs)?
Rodrigo
Rollemberg, governador do DF, postou na última quinta-feira (24/11) em seu Facebook uma nota
tratando de OSs. Como se verá mais adiante, o governador foi iludido, ou se
esforça para se iludir, sobre o problema de se entregar à saúde pública às
chamadas organizações sociais.
Vejamos
a seguir a postagem de Rollemberg:
“Estive hoje em São Paulo
para acompanhar o lançamento do Instituto Brasileiro das Organizações Sociais
de Saúde (Ibross), que irá reunir entidades do setor de todo o país para
fortalecer e aperfeiçoar o SUS. No evento, Renilson Rehem de Souza tomou posse
como presidente do Ibross. Ele também gerencia o Hospital da Criança, aqui em
Brasília, com muita seriedade e o trabalho reconhecido em todo o país.
Além de mim, os
governadores de São Paulo, Geraldo Alckmim, Pernambuco, Paulo Câmara, e Goiás,
Marconi Perillo, estavam lá para prestigiar a criação do instituto. Os três
estados já têm trabalho com a gestão de unidades de saúde por meio de OS com
resultados positivos. Em todos, há dados comprovando que a adoção da parceria
aumentou a produtividade do sistema e reduziu os custos, garantindo mais
recursos para investimentos em melhorias.”
Feito o
registro, aí acima, da postagem do governador de Brasília, fica a certeza de
que alguém mentiu para ele. Ou...
Bem, foi realizado aqui mesmo em
Brasília no dia 18 de novembro, no auditório do MPDF, o Encontro A Fiscalização das Organizações Sociais pelos Órgãos de
Controle Externo. Portanto
a exatos 7 dias antes do governador Rollemberg compor, em São Paulo, a mesa da
solenidade do lançamento desse tal de Ibross (que não se perca pela sigla) e
também postar em seu Facebook uma defesa das OSs.
Esse encontro realizado no
Auditório do Ministério Público do Distrito Federal (MPDF) teve a duração de
cerca de três horas e 30 minutos. Foram cinco palestrantes, todos profundos
conhecedores dos aspectos que envolvem a atuação das OSs no setor da saúde
pública. Cinco palestrantes que demonstraram detalhadamente e de modo convincente
os males que representam tais organizações, e os vícios que prejudicam o Estado
e os usuários da saúde pública. Adiante o nome dos cinco palestrantes:
1. Cláudia Fernanda de Oliveira
Pereira, procuradora-geral do Ministério Público de Contas do Distrito Federal
2. Nominando Diniz, conselheiro do
Tribunal de Contas do Estado da Paraíba
3. Fernando Aurvalle Krebs, promotor
de Justiça de defesa do patrimônio público do Ministério Público de Goiás
4. Eduardo Moreno, delegado da
Polícia Federal e que atuou no Amazonas, apurando, inclusive, os crimes de OSs
envolvidas na Operação Maus Caminhos (veja aqui)
5. Marici Coelho de Barros Pereira,
procuradora do trabalho em Brasília.
Vamos nos ater nesta postagem de hoje
às afirmações do promotor de justiça de Goiás, Fernando Auvalle Krebs, que
explorou o tema “A Experiência das Organizações Sociais em Goiás” (um dos três
estados citados, e elogiados, na postagem de Rollemberg no Facebook. Ver o
parágrafo segundo daquela postagem).
Em Goiás, o governo está, já há
algum tempo, pois o governador atual exerce o mandato pela quarta vez,
desenvolvendo um processo de privatização de funções básicas do Estado,
passando pela Saúde, Educação e até mesmo a segurança pública, onde chegou a
implantar um famigerado Serviço de Interesse Militar Voluntário Estadual
–SIMVE.
Disse —dentre outra coisas também
interessantes— o promotor Fernando Auvalle Krebs.
Em Goiás em 2012, após uma gestão
catastrófica do Secretário de Saúde, em que, inclusive, ele não fazia
licitação, o Ministério Público de Goiás o processou por improbidade
administrativa. Todos os hospitais públicos estaduais entraram em situação
falimentar, onde, por exemplo, os elevadores não funcionavam para transportar macas e pacientes. Não havia ar-condicionado nos locais em que esse tipo de
recurso era necessário e indispensável.
—Era uma tragédia, uma vergonha.
Alguns interditados pela Vigilância.
— Na minha santa ignorância, eu
imaginava que se roubava pouco, acrescentou o promotor Fernando Aurvalle Krebs.
— Os hospitais que estavam
deteriorados, quando apareceram as OSs, o governo que não aparecia para
reformar os hospitais, apareceu dinheiro e reformou os hospitais.
— A Cruz Vermelha assumiu a
indústria química do Estado e não deu conta de tocar o contrato.
— Só existia uma OS antes do
edital de chamamento, que comandava o Crer de Goiânia [Centro de
Reabilitação e Readaptação, que é um hospital público localizado
em Goiânia].
— Em Goiás as OSs podem atuar em
todo o Estado, em qualquer setor indistintamente.
— No Estado de Goiás, praticamente
todos os hospitais públicos estaduais foram repassados para as OSs. Agora estão
repassando o Hemocentro. Não satisfeitos, querem passar toda a educação para
OSs.
— Nos contratos de gestão, se a OS
cumprir 80 por cento de execução do contrato de gestão, ela tem direito a 100
por cento da remuneração. Então o
contrato é gritantemente lesivo ao erário.
— Não há em Goiás o estudo prévio de economicidade.
Causou espanto aos participantes
do encontro sobra A Fiscalização das
Organizações Sociais pelos Órgãos de Controle Externo, quando o promotor
Fernando Krebs deu um exemplo de como as coisas vêm acontecendo em Goiás, que
tem um governo que está privatizando tudo, e entregando setores importante às
OSs.
Foi quando ele citou um exemplo
vergonhoso. Disse que ‘com o dinheiro da contratação de veículos para a PM em
um ano, daria para comprar toda a frota e ainda sobraria um trocado para a
manutenção’.
Sem estudos e fechando a porteira ao paciente
E foi enfático ao dizer:
— Quanto às OSs, já que não houve
estudos de viabilidade econômica, de economicidade, as OSs se implementaram,
fizeram uma mudança na aparência inegável. E
que elas fizeram? Fecharam as portas dos hospitais. Fecharam a porteira no atendimento único de saúde do município, ou
seja, da rede básica. Eles fecharam
isso, fecharam os portões, colocaram segurança. Você não entra no hospital. Nem
os sindicalistas conseguem entrar no
hospital sem mandado de segurança, sem liminar.
Voltando ao inconstitucional SIMVE
O SIMVE, peça importante na
privatização das funções do Estado em Goiás, era uma espécie de PM temporária,
em que cada homem contratado por processo seletivo simplificado, era treinado
em apenas um mês e recebia uma arma, sendo mandado, logo após, para policiar as
ruas. Interessante é observar que no processo seletivo para esses “PMs” uma das
perguntas da “prova” queria saber do candidato qual era o melhor governador de
Goiás até aquela data. Isso dá uma boa visão de quanto vagabundo e enviesado
era o processo. A pergunta foi anulada, mas o processo continuou com todos os
demais vícios e defeitos.
Com esse ‘modelo’ o governo de
Goiás contratou cerca de 2.500 ‘policiais’ temporários. Segundo bem frisou
Fernando Krebs, essa força policial era “uma espécie de milícia privada”.
Foram muitas as arbitrariedades
cometidas por integrantes desse ‘tipo de milícia’. Os promotores, por entrarem
com uma ação direta de inconstitucionalidade junto ao Supremo Tribunal Federal,
chegaram a receber ameaças, inclusive de tiro na cabeça, especialmente após o
STF ter declarado inconstitucional a lei que implantou o SIMVE, o que forçou o
governador de Goiás a demitir todos os “PMs” temporários. Eles ficariam por
três anos no serviço “voluntário”, quando haveria novo processo ‘seletivo’.
— Não precisa dizer pra vocês a quantidade de abusos que foram praticados
por esses policiais. Alguns deles chegaram a nos ameaçar de dar um tiro na
cabeça, porque conseguimos essa decisão judicial [no STF, por uma ação direta de
inconstitucionalidade] que acabou
exonerando [os ‘policiais’].
O grande objetivo das OSs
— Qual o objetivo das OSs? É acabar com o concurso público e acabar
com a licitação, enfraquecendo o Estado e criando um Estado...assim como Os na
saúde, pode-se falar em escola sem partido. O que é OS na educação? É a escola
com partido. Prova disso que a OS credenciada [para a educação] em Goiás, o dono da
OS, o presidente da OS, é filiado ao PSDB. E nas mídias sociais ele se
manifesta politicamente daquela forma xenófoba a la Trump. Vocês imaginem uma
OS na educação selecionando professores.
— Se o professor não rezar na cartilha, ele não será contratado.
Fato considerado pelo promotor
goiano Fernando Krebs como ‘Estranho,
muito estranho’ foi o que veio a público quando daoperação da PF que prendeu o
presidente do PSDB de Goiás e o presidente da Saneago (empresa de
Saneamento e Água de Goiás e que está sendo privatizada). E no bojo das
investigações se encontrou OSs da saúde recebendo dinheiro da empresa. Para o promotor
uma coisa ainda inexplicável, que ainda não se sabe a razão das OSs que atuam
apenas na saúde, receberem grana da empresa de saneamento e água? “Se suspeita mais de alguma lavagem de
dinheiro”, afirmou o promotor.
Como a Saneago é a empresa de
água...o promotor goiano deve estar certo no seu prognóstico. Lavagem é com
água mesmo.
Materiais reutilizados
Vamos em frente nesta postagem sobre
a indecência que é, geralmente, organizações sociais na saúde.
Como o MP de Goiás não tem
estrutura para fiscalizar todos os hospitais, optou por se valer da Vigilância
Sanitária Estadual para esse trabalho. A Vigilância foi para os hospitais do
interior. Adiante um relato de Fernando Krebs referente ao resultado desse
trabalho da Vigilância.
— Descobrimos várias coisas muito interessantes. Reutilização de
compressas, não cumprimento do contrato de gestão, funcionários de OS de uma
cidade trabalhando em outra, falta de escala, falta de controle de ponto e uma
série de outras irregularidades, inclusive aquelas que são comuns nos hospitais
privados do Brasil, que é a reutilização de equipos cirúrgicos. Essas irregularidades
todas foram encaminhadas ao conhecimento delas [OSs], a quem de direito.
O que foi feito? Nada, nada, absolutamente nada.
Outra colocação grave feita por
Fernando Krebs foi de que:
— Nós temos médicos e profissionais da saúde sobrando no sistema [de Goiás],
em razão da entrada dos celetistas [das OSs]
no sistema, já que não houve
planejamento algum. Resultado: repassaram esse pessoal para uma outra unidade e
lá tem gente sobrando.
— Como o Conselheiro do Tribunal de Contas da Paraíba mencionou, [Nominando Diniz, do TC da Paraíba, que falou
antes do promotor de Goiás], ao
contrário do que se imagina, a OS não é mais econômica do que a gestão direta.
Ela é antieconômica. Por quê? Porque ela custa muito mais caro. Quando os
hospitais estaduais fecharam as porteiras, fecharam as portas ao contrário das
unidades básicas de atendimento dos municípios que vivem lotadas e esses
hospitais também não socorrem os sistemas, pois eles não absorvem o papel, o
resultado disso é que um paciente atendido hoje nos hospitais de OSs, hoje o
das OSs atendem menos do que quando os hospitais eram administração direta, e
por via de consequência ele custa muito mais caro do que no sistema.
—Hoje nós temos servidores quarteirizados das OSs que não recebem. O que
acontece? Cai a qualidade de serviço. Como OSs não podem formar patrimônio
próprio, nós não temos como buscar o dinheiro. E quem vai responder isso será o
Estado que vai ter que pagar duas vezes.
Isso acima é um resumo rápido dos
pontos tratados na palestras do promotor do MP de Goiás, no dia 18 de novembro
de 2016, no encontro A Fiscalização das
Organizações Sociais pelos Órgãos de Controle Externo.
A quem tiver um tempo, 31 minutos,
recomendo ouvir no áudio abaixo postado o relato do promotor Fernando Aurvalle Krebs,
promotor de Justiça de Defesa do Patrimônio Público do Ministério Público de
Goiás. Rico em detalhes e convincente. Pena que o secretário de Saúde do DF,
Humberto Fonseca, tenha abandonado o encontro do dia 18 de novembro logo após
as duas primeiras palestras. Não ouviu o promotor de Goiás. Palestras que, por
sinal, foram fortes cacetadas nessa ideia enviesada, troncha, estranha,
suspeita, que é a adoção (ou doação?) de OSs na saúde pública.
Os cinco palestrantes do Encontro A Fiscalização das Organizações Sociais pelos Órgãos de Controle Externo, demonstraram cabalmente que a adoção de OSs na Saúde derruba a produtividade do sistema e representa a elevação absurda dos custos. É bom lembrar, ainda, que no dia (24/11), dia em que Rollemberg tecia elogios às OSs, o Ministério Público denunciava à Justiça Federal um grupo de 16 pessoas por formação de organização criminosa e por desvio de recursos da saúde, sendo que o dono da OSs, que se encontra atualmente atrás das grades no Amazonas, tentava empurrar seu esquema na saúde do DF.
Voltando à postagem de Rollemberg
no seu Facebook, onde registrou a sua participação no evento de lançamento do
Instituto Brasileiro de Organizações Sociais na Saúde, Ibros (registre-se
mais uma vez, que não se perca pela sigla), bem como elogios rasgados ao “desempenho”
das OSs em três estados, dentre os quais Goiás, forçoso é repetir abaixo o título
dessa postagem do Gama Livre.
Rollemberg mente? Ou quem
mente para o governador sobre Organizações Sociais (OSs)?
Responda
quem souber.
Leia também:
Rollemberg em São Paulo, no lançamento de um tal Ibross, elogia OS de Brasília. Mas importante mesmo é ouvir o áudio da fala da promotora Marisa Izar no encontro realizado no último dia 18/11 e que discutiu OSs na Saúde.
A seguir o áudio com a palestra do promotor Fernando Aurvalle Krebs, do MP de Goiás.