Segunda, 26 de dezembro de
2011
Por Ivan de Carvalho

Bem, acabamos de viver o
Natal. O que traz a alguns a lembrança do nascimento e da história de vida,
morte e ressurreição de Jesus. Um bom motivo para perguntar se ele negociou com
o Sinédrio, se deixou de expulsar os mercadores do Templo ou se chegou a algum
acordo com Pôncio Pilatos, trocando verdades e deveres por concessões e
conivências.
Sei que todos que
conhecem a história de Jesus sabem qual a resposta a essa pergunta. E tenho a
impressão que Ele, como Renata Lo Prete prevê no caso de Eliana Calmon, ganhou
a batalha da opinião pública. Isso fez uma grande diferença.
Mesmo que na batalha da
opinião pública a vitória não haja sido total. Mas o próprio Jesus já sabia que
seria assim, o Novo Testamento deixa isso evidente. A vitória completa não
seria mesmo a da opinião pública, pois que de qualidade e não de quantidade, mas
a vitória na “batalha da opinião pública”, ainda que parcial, seria e será
fator importante para a vitória final, a da mudança, que só chegará ao
completar-se, no seu tempo, que não tarda, o drama ainda em curso.
Mas já que do Conselho
Nacional de Justiça passamos ao Natal, cumpre expressar uma observação que há
anos já se tornou um clichê, um lugar comum. Salvo nos templos cristãos, na
transmissão da “missa do galo” pela televisão e em mais alguns lugares
discretos e privilegiados, às vezes secretos para evitar perseguições,
esqueceu-se o Dono do Natal, miseravelmente trocado por um “simpático” velhinho
barbudo com um saco enorme, cheio de atrativos com que a indústria e o comércio
desviam do Aniversariante o coração das crianças e até a atenção dos adultos.
Ah, sim, comemorei o
Natal em companhia de umas 15 a 20 pessoas, além de um cachorro e um papagaio.
Respeitoso, o papagaio não disse nenhuma bobagem, aliás, ficou em total
silêncio, ainda que não seja mudo. Também silente, talvez meditativo, quedou-se
o cachorro.
As pessoas estavam alegres. Trocaram presentes (sem se
darem ao trabalho de lembrar a razão profunda dessa atitude), abraços e beijos,
beberam moderadamente, conversaram, mas o Natal nem o Dono dele foram assunto
em momento algum. Uma delas tocou violão, duas cantaram, outras tentaram
acompanhar, nenhuma música tinha referência com o Natal ou o Aniversariante.
Entre as canções, umas três ou quatro de Roberto Carlos, mas nenhuma daqueles
em que ele fala Nele. Nenhuma rejeição, apenas esquecimento.
Dois de meus netos, crianças, estavam presentes. Havia
um mural com desenhos/pinturas deles e de uma prima sobre o Natal. Papai Noel
estava em destaque em 90 por cento dos “quadros”, em 80 por cento com o saco e
em alguns com o acréscimo daquele ridículo Hô! Hô! Hô! Nos outros, o destaque
eram pinheiros, a “árvore de Natal”.
Chamei o meu neto mais velho (?!), uma linda (por
dentro e por fora) criança-adolescente de 12 anos. “Parece que tem alguma coisa
faltando aí no mural, não é?”, provoquei. “O que, voinho?”, perguntou, depois
de um atento olhar geral. “Quantos Papai Noel tem aí?”, repliquei. Ele contou,
não lembro exatamente, mas eram uns dez. “E árvores de Natal?”, insisti. Havia
umas cinco ou seis. Então dei o golpe final: “E o Dono do Natal, Jesus, quantos
tem?”. Não havia. “Ah, voinho, eu fiz um quadro com Jesus, mas ficou muito
ruim, eu não botei no mural”.
Acho que a intenção dele salvou o mural. Acho que a
intenção (e a coragem) de Eliana salva sua luta, mesmo que algum abutre lhe
devore o fígado ou que o corporativismo nada santo a crucifique.
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Este artigo foi publicado originalmente na Tribuna da Bahia desta
segunda.
Ivan de Carvalho é jornalista baiano.