Imprensa é oposição. O resto é armazém de secos e molhados."

(Millôr Fernandes)

quinta-feira, 31 de dezembro de 2009

Propaganda enganosa

Quinta, 31 de dezembro de 2009
Por Ivan de Carvalho
O governador José Serra, aspirante tucano à presidência da República, atribuiu aos investimentos de sua administração a criação de 800 mil empregos diretos e indiretos em São Paulo, em 2009. O presidente nacional do PT, Ricardo Berzoini, responsabilizou a “aflição” de Serra, ante as eleições que ocorrerão daqui a pouco mais de nove meses, pela declaração do governador.
Segundo Berzoini, a declaração de Serra “é uma tentativa desesperada de ficar sócio do sucesso do PT. A geração de emprego vem da política de estímulo à economia”, afirmou o presidente do PT, explicando didaticamente: a tentativa de Serra, disse, “não resiste à menor análise do que é decisivo. Certamente a ação do governo federal é a parte mais forte da geração de emprego em todo o Brasil”.
Ora, seria bem melhor se os políticos, sejam tucanos ou petistas, governistas ou oposicionistas, fossem sinceros e verdadeiros ao se dirigirem à sociedade para fazerem avaliações de seus próprios governos e dos governos alheios.
A sociedade merece a verdade ou, se ainda não merece, pelo menos tem direito a ela para desacostumar-se da propaganda enganosa, o que acontecerá quando gradualmente aprender – se algum dia aprender, porque já é longa a história humana e até hoje tal aprendizado está apenas engatinhando – a escolher seus líderes políticos. Eventualmente, acertos nessas escolhas têm ocorrido, mas são raros, no Brasil e no mundo.
Serra não tem razão quanto aos 800 mil empregos criados graças, segundo ele, aos investimentos do seu governo. Quem cria os empregos é a economia, não o governo e, para acabar de estraçalhar a gabolice do governador, vale registrar que é a sociedade que paga os tributos que sustentam o Estado e até lhe permitem fazer os investimentos alegados. Estes são mera devolução do que o governo tomou à sociedade, são retirados da própria economia.
Berzoini também não tem razão. O governo federal não é – como ele tolamente supõe, ou quer que todos nós suponhamos, tranformando-nos em bobos alegres, gratos e tietes do presidente Lula e seus auxiliares (inclusive, talvez, também aos “aloprados” e os do Mensalão) “a parte mais forte da geração de emprego em todo o Brasil”.
Na verdade, talvez não existam mais postos de trabalho, muito mais, e melhor remunerados, porque o governo toma da sociedade e da economia quase 40 por cento do PIB com tributos, que, aliás, aplica muito mal – fazendo justiça, fenômeno não exclusivo do governo Lula, mas comum e inerente a quase toda (ou toda?) a história da República. Quanto a Lula, de que se jacta Berzoini, quantos empregos criou, além dos pendurados nos muitos cabides estatais de uma administração severamente inchada pelo acréscimo de pessoal em seu período? Fez, na crise, algumas renúncias fiscais pontuais para facilitar o consumo de algumas linhas de produtos, estimulando o consumo e, assim, ajudando produtores e comerciantes, o que cria vagas. Ora, se pôde operar essas renúncias fiscais é que estava ganhando (e gastando, geralmente mal) prá lá da conta, graças à sufocação da sociedade com a pesada carga tributária.

Este artigo foi publicado originalmente na Tribuna da Bahia desta quinta.
Ivan de Carvalho é jornalista baiano.