Imprensa é oposição. O resto é armazém de secos e molhados."

(Millôr Fernandes)

quinta-feira, 8 de setembro de 2011

Contra a Corrupção

Quinta, 8 de setembro de 2011 
Por Ivan de Carvalho
Realizou-se ontem em várias cidades brasileiras, incluindo Salvador, mas com ênfase especial em São Paulo, Rio de Janeiro e especialmente – como recomendava a lógica – em Brasília, a Marcha Contra a Corrupção, primeiro ato de um movimento que pretende mobilizar a população do país para combater a corrupção que está quase acabando com ele. Slogan perfeito, instigante, provocador: “Você aí parado, também foi roubado”.
 
      A idéia e os primeiros passos para convocar os brasileiros para a marcha surgiram de modo espontaneamente nas redes sociais, na Internet, e acabaram conseguindo algumas notícias em jornais e entrevistas de pessoas envolvidas no movimento em umas poucas emissoras de rádio.

       Deve ficar bem claro: a chamada “grande mídia” não demonstrou o menor interesse pela notícia, não participou da divulgação, feita basicamente em sites como o Facebook, o Twitter, Orkut, Youtube, no qual diversos filmes de convocação e agora já mostrando as manifestações de ontem podem ser encontrados.

       Se isto é, por um lado, uma dificuldade, por outro é um estímulo, pois verificou-se que sem essa ajuda da grande mídia conseguiu-se, de um modo geral, êxito neste primeiro ato do movimento contra a corrupão. Um desses êxitos foi a adesão e engajamento de três entidades altamente representativas da sociedade brasileira e de grande influência nela – a Conferência Nacional dos Bispos do Brasil, a Ordem dos Advogados do Brasil e a Associação Brasileira de Imprensa.

       Um envolvimento sério da CNBB, OAB e ABI numa campanha permanente contra a corrupção – como pretende ser o movimento que foi ontem pela primeira vez às ruas e que não vai atuar apenas nelas, mas em outras “instâncias” cívicas – é uma grande conquista.

       Outra é a demonstração de que é possível ir tocando a mobilização e fazendo-a crescer, com o uso dos instrumentos iniciais – as redes sociais da Internet e algumas brechas na mídia, ainda que não na grande mídia – até que aconteça algo que ocorreu com a campanha das Diretas Já: a “grande mídia”, que estava contra e extremamente arisca, que até escondia, foi obrigada a render-se à realidade, a correr atrás do prejuízo, e noticiar (até exagerando em muitos casos o número de manifestantes) o que ocorria nas ruas e o que sua voz rouca proclamava.

       Em Brasília, ponto de partida e núcleo do movimento, muitos dos que compareceram à Marcha contra a Corrupção comentavam depois, com amigos – e não para efeito de propaganda – que esta marcha teve mais gente que a outra, o desfile oficial de Sete de Setembro e público que afluiu para vê-lo. Pode ser que sim, pode ser que não. Mas há coisas a registrar: o Comando da Polícia Militar calculou que os dois eventos juntos mobilizaram 10 mil pessoas. A Secretaria de Segurança do Distrito Federal, à qual a PM é subordinada, indignou-se e estimou o total em 45 a 50 mil pessoas, considerando também as duas manifestações. A BBC Brasil (filial, claro, da BBC inglesa) estimou que a Marcha Contra a Corrupção em Brasília reuniu 25 mil pessoas.

       Sendo assim, sucesso absoluto. Fica de certo modo explicado o que levou a presidente Dilma Rousseff a ir na terça-feira à televisão, pedir o apoio popular à luta contra a corrupção. A presidente dispõe de pesquisas de opinião. Ela tem Abin. Ela tem condições de prever algumas coisas. Ela tinha condições de prever o que aconteceria ontem, principalmente em Brasília.

      E ela tem marqueteiros (Bom dia, João Santana Filho). Os marqueteiros sabem inventar vacinas. O pronunciamento de Dilma na TV foi uma vacina, aplicada de modo a que a mobilização não seja interpretada como tendo, entre outros alvos, o seu governo.

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Este artigo foi publicado originalmente na Tribuna da Bahia desta quinta.
Ivan de Carvalho é jornalista baiano.
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Marcha contra a Corrupção. Esplanada dos Ministérios, em Brasília.
 
Foto: Agência Brasil