Imprensa é oposição. O resto é armazém de secos e molhados."

(Millôr Fernandes)

quarta-feira, 14 de setembro de 2011

Finanças indiscretas

Quarta, 14 de setembro de 2011 
Por Ivan de Carvalho
O ministro do Turismo, Pedro Novais, contra cuja pasta pesam acusações sérias, algumas com gênese de administrações anteriores, tem se revelado um especialista em gastar o dinheiro alheio – dos contribuintes – com despesas pessoais que a lei não lhe permite pagar com outra fonte que não seja o suor do próprio rosto. Se é que um ministro que fica refestelado em um gabinete com ar refrigerado, do qual só sai em automóvel oficial com ar condicionado e nunca foi recebido em audiência pela presidente Dilma Rousseff (o que eventualmente podia levá-lo a suar frio) pode produzir algum suor do próprio rosto.

            Talvez seja esta provável impossibilidade que o haja obrigado a pagar a governanta Doralice Bento de Souza como “secretária parlamentar”, com o dinheiro da Câmara dos Deputados, no período de 2003 a 2010, durante o qual exerceu o mandato de deputado federal, segundo reportagem agora publicada pela Folha de S. Paulo.

            Mas o ministro já tinha treino. Quando estava no exercício do mandato, aconteceu uma festa (pode ter sido uma festa de arromba, mas a prudência e a idade de Pedro Novais sugerem cautela nesse tipo de especulação) em um motel e provavelmente ninguém teria noticiado o fato, coisa da esfera privada, se não se houvesse descoberto que o então deputado misturou a citada esfera com a esfera pública, ao requerer que a Câmara dos Deputados pagasse a festança no motel com a verba indenizatória que a lei (votada por ele e seus colegas congressistas) lhe dá direito para cobrir despesas decorrentes do exercício do mandato.

Em um motel, deputado, é possível fazer-se bastante exercício, mas dificilmente alguém poderá mover uma pena em função de mandato popular que haja recebido dos eleitores. Quando a imprensa botou nas ruas a notícia da festa, o já então ministro do Turismo resolveu devolver à Câmara o dinheiro que pedira e com o qual liquidara a fatura da festa. Quanta honestidade!

Mas não está sozinho no ramo de finanças indiscretas o ministro Pedro Novais. Quem não se lembra de José Adalberto Vieira da Silva? Na verdade, quase ninguém se lembra. Mas se escrevo que é o cara dos dólares na cueca, aí todos se lembram, melhor, ninguém esqueceu. Flagrado em São Paulo com R$ 200 mil na sacola e “mais de 100 mil dólares dentro da cueca”, o cearense era assessor de José Nobre Guimarães, líder do PT na Assembléia Legislativa do Ceará, membro do diretório nacional do partido e hoje deputado federal. O site do PT no Ceará dizia que Nobre era o coordenador da campanha de Lula em 2002 no Estado, por indicação do candidato.

Nobre declarou à imprensa que não tinha a menor ideia da razão que teria levado seu assessor a por mais de 100 mil dólares na cueca (sem falar nos 200 mil reais da sacola), do mesmo modo que não sabia o que seu assessor estava fazendo em São Paulo. Em tempo: Nobre é irmão de José Genoíno, na época deputado federal por São Paulo e presidente nacional do PT.

Mas ainda no ramo das finanças indiscretas – em nosso país, vasto como um oceano – temos a registrar a celebre Dança do Mensalão, maravilhosamente criada pela ex-deputada (ela perdeu, gente!) Ângela Guadgnin para comemorar a absolvição do deputado João Magno, acusado de mensaleiro, no autodefensivo plenário da Câmara.

Tem mais, muito mais, é claro. Voltaremos ao assunto. Hoje encerramos com Alberto Fraga, que esteve sob fogo porque era deputado federal pelo DEM do Distrito Federal, e mesmo licenciado para ser secretário de Transportes de Brasília quem pagava a sua faxineira era a Câmara dos Deputados. Ele deixou a conta de sua faxineira para o seu suplente, Osório Adriano, também do DEM-DF. Interessante é que ele afirmou que não vê problema em pagar empregada doméstica com verba do gabinete.

Sinceramente, eu também não vejo problema em dizer que o que ele fez é uma pouca vergonha.
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Este artigo foi publicado originalmente na Tribuna da Bahia desta quarta.
Ivan de Carvalho é jornalista baiano.