Imprensa é oposição. O resto é armazém de secos e molhados."

(Millôr Fernandes)

terça-feira, 2 de maio de 2017

Nota de esclarecimento: posição da 2ª Prosus (MPDFT) sobre a administração do Hospital da Criança de Brasília

Terça, 2 de maio de 2017

Do MPDF
Em relação às recentes matérias jornalísticas sobre o Hospital da Criança de Brasília (HCB) e o perigo de um vazio assistencial, preocupa o Ministério Público a exposição e a utilização de imagens de crianças portadoras de câncer em tratamento em uma tentativa de sensibilizar a opinião pública.
É preciso esclarecer que o HCB foi construído com grande parte dos recursos do Fundo da Infância e Juventude. Trata-se de dinheiro público e de um hospital 100% público. Quanto ao suposto risco de descontinuidade do atendimento em razão do afastamento do dirigente Renilson Rehem, indicado pela Organização Social que administra o hospital, e a intenção desta, ainda não formalizada, de não mais administrar o HCB, deve-se observar que os diretores-gerais de todos os hospitais públicos são e devem ser os diretores técnicos, na forma prevista nas normas do Conselho Federal de Medicina. A diretora técnica do HCB é a médica Isis Magalhães, servidora da Secretaria de Saúde desde 1983, pediatra especialista em hematologia oncológica e gestão. Ela participou de toda a criação do hospital, desde os planos de sua implantação no Distrito Federal.
Por essa razão, não se pode falar em “vazio” na gestão do HCB somente porque o Judiciário determinou cautelarmente o afastamento do superintendente executivo do hospital. Indaga-se, até mesmo, qual é a função do superintendente afastado que justifique seu salário mensal de R$ 32 mil, uma vez que há uma diretora técnica. Causa espanto que a Secretaria de Saúde esteja se esquivando de nomear um diretor para o HCB, que é, repita-se, um hospital público.
Por outro lado, o Ministério Público não é contra toda e qualquer organização social. As organizações sociais recebem recursos públicos e devem atuar de forma complementar à rede pública, ou seja, deve haver serviços do Estado e, concomitantemente, serviços prestados pelas organizações sociais para que não ocorram vazios na prestação de assistência. Além disso, as organizações sociais devem prestar contas dos recursos recebidos de forma pormenorizada, agir com transparência e ser escolhidas a partir de sua expertise na respectiva área técnica, em um processo de seleção em que todas possam concorrer.

O Icipe, organização social escolhida sem concorrência para administrar o HCB, foi criado às vésperas de sua contratação pela Secretaria de Saúde. Por isso, não se pode falar em experiência técnica prévia que justifique sua escolha. Quanto à Abrace, que criou o Icipe, embora se destaque na área oncológica, não tem e nunca teve experiência na assistência médica a pacientes, mas sim na área de assistência social e psicológica, prestando atendimentos dessa natureza ao apoiá-los no processo de recuperação. Tanto é assim que a maioria dos médicos que atuam no HCB são da própria rede pública de saúde e não do Icipe, assim como sua diretora técnica.
Na atualidade, o hospital que vem sendo sucateado, por razões que se desconhece, é o Hospital Materno Infantil de Brasília, que recebe recursos ínfimos perto do que recebe o HCB, mas também cuida de pacientes portadores de câncer, notadamente, na área cirúrgica. O hospital, que atende em regime de pronto-socorro e possui UTI, teve suas atividades suspensas por falta de insumos básicos.
O HCB, por sua vez, precisa da retaguarda de hospitais como o Hospital de Base e de ambulâncias para remover pacientes mais graves, não possui leitos de UTI e não atende em regime de pronto-socorro. Nem todas as crianças atendidas na rede pública tem a sorte de poder contar com os serviços do HCB, enquanto o Hospital de Base e o Hospital Materno Infantil jamais poderiam negar-lhes atendimento. Dessa forma, não se pode comparar a gestão de um hospital abastado em recursos como o HCB com outro mantido completamente à míngua, como o Hospital Materno Infantil.
Apenas a título de exemplo, no caso da alimentação dos pacientes, o valor pago pelo HCB a seu fornecedor, que é o mesmo que fornece alimentação à Secretaria de Saúde, é muito mais alto. Essa diferença deveria ser direcionada a despesas essenciais do SUS, pois faltam diversos medicamentos e insumos, especialmente no Hospital Materno Infantil.
Como então se falar em gestão de excelência se são consumidos mais recursos sem justificativa, em detrimento do que deveria ser direcionado aos outros hospitais? Recursos públicos que poderiam ser aplicados no resto da rede que se encontra sucateada?
Nesse cenário, sempre é oportuno lembrar o exemplo do Hospital Regional de Santa Maria, cuja gestão foi retomada pela Secretaria de Saúde sem qualquer interrupção, com gestores nomeados pela própria Secretaria, sem nenhuma hesitação.
2ª Promotoria de Justiça de Defesa da Saúde (Prosus)