Sexta, 8 de julho de 2016
Do Gabinete do deputado Chico Leite (Rede)
Em entrevista, o deputado da Rede Sustentabilidade, que é
promotor de Justiça de carreira, licenciado para o exercício do quarto
mandato, assegura que é contrário à contratação de OS’s para gerir a
saúde pública do DF.
O senhor é a favor da proposta do GDF de contratar OS’s para a saúde?
Sou contrário à transferência da gestão da saúde pública no DF
desde 2007, quando o governador Arruda tentou, pela primeira vez,
implantar a proposta. Àquela ocasião, como líder da oposição, ajudei a
criar um fórum de defesa do serviço público e a trabalhar um
compromisso, com o apoio de 15 parlamentares, de repúdio à ideia. Depois
disso, pude testemunhar todos os governos, inclusive o do PT, tentando
abrir o debate sobre o tema e não lograr êxito. Até hoje não me
convenceram. ...
Qual a razão do seu posicionamento?
O motivo é simples: um elemento essencial da vida em sociedade,
como a saúde pública, não pode se transformar em algo de que se
suspeite ser mero objeto de lucro. A medicina complementar é legal e
pode ser exercida, não é problema. A questão é a necessidade básica da
população ficar submetida exclusivamente à lógica de mercado. Nessa
linha, a flexibilização de regras trabalhistas, a relativização da
aplicação da Lei de Licitações e a transformação do usuário do sistema
em cliente pode tornar os processos administrativos mais suscetíveis de
desconfiança quanto a desvios ou mal emprego dos recursos públicos e à
eficácia da política. Precisamos mesmo rediscutir o modelo que aí está,
mas com a perspectiva de fazê-lo mais eficaz, valorizando e cobrando o
servidor, racionalizando os procedimentos de compras e priorizando a
atenção primária, e não ampliando o volume de problemas com que a gestão
já convive.
Se o senhor é contrário, no mérito, porque votou pela
inadmissibilidade do projeto que proíbe a contratação de OS’s que
tramita na câmara?
Porque, infelizmente para todos nós que somos contra a entrega
da Saúde Pública às organizações sociais, sob o aspecto jurídico entendo
que a proposta é inconstitucional. A razão da inconstitucionalidade, na
minha modesta opinião, é que a celebração de contratos do Distrito
Federal constitui ato de gestão administrativa próprio do Chefe do
Executivo, conforme dispõe o inciso XXIII do art. 100 da Lei Orgânica do
Distrito Federal, segundo o qual compete privativamente ao Governador
celebrar convênios, ajustes ou acordos com entidades públicas ou
particulares, na forma da legislação em vigor. Assim, na conformidade
constitucional, a Câmara Legislativa não tem competência para proibir o
DF de contratar organizações sociais, como pretende a proposta. Mais que
isso, a CLDF não tem nem mesmo competência para autorizar a
contratação, eis que o GDF nem de autorização para tanto precisa, já que
o STF (ADI 1166) declarou a inconstitucionalidade do inciso XXVI do
art. 60 da Lei
Orgânica. Esse dispositivo, até 2002, estabelecia a competência da
Câmara Legislativa para “autorizar ou aprovar convênios, acordos ou
contratos de que resultem, para o Distrito Federal, encargos não
previstos na lei orçamentária”. Disse a Suprema Corte: “Dispositivo que,
ao submeter à Câmara Legislativa distrital a autorização ou aprovação
de convênios, acordos ou contratos de que resultem encargos não
previstos na lei orçamentária, contraria a separação de poderes,
inscrita no art. 2º da Constituição Federal.” No mesmo sentido,
registre-se, decidiu o STF nas ADI’s 165, 177, 462 e 676. Assim, a
proposta, ao pretender proibir que o Poder Executivo estabeleça contrato
de gestão — que tem natureza jurídica de convênio, como assentou o STF —
com entidade qualificada como Organização Social para prestação de
serviços de saúde, incide em inconstitucionalidade por ofensa ao
princípio da Separação dos Poderes.
E qual a alternativa para combater essa iniciativa do governo?
A reação, para ser honesta, precisa ser no campo político: ato
público com a participação de entidades representativas de servidores e
usuários, de que se extraia documento assinado pela maioria dos
parlamentares da Casa Legislativa com a posição contrária às OS’s;
conscientização e mobilização de todos os interessados; e campanha de
esclarecimento à sociedade, especialmente sobre os serviços, porque a
população espera e almeja serviços de qualidade, seja quem for o
prestador. Uma grande ação política que organize a sociedade contra os
males da terceirização. Se o projeto for a plenário, é evidente que
votarei contrariamente à transferência da gestão da saúde às OS’s,
porque aí o debate já será de mérito - o de admissibilidade foi
realizado na CCJ. Mas não me omitirei em alertar a todos da
possibilidade de questionamento judicial e de derrubada da lei em razão
do julgado do Supremo, para que não se repita a “venda de ilusões”, como
já ocorreu em outros
casos, quando projetos foram aprovados, e por isso hoje há servidores
tendo que devolver diferença salarial, morador vivendo na insegurança
com a casa prestes a ser derrubada, e outras irresponsabilidades que,
colocadas como promessas à população, findam trazendo mais prejuízos a
ela, financeiros e emocionais.