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(Millôr Fernandes)

domingo, 19 de dezembro de 2010

Auditoria Cidadã da Dívida: O novo Consenso de Washington e os 8 anos do governo Lula

Domingo, 19 de dezembro de 2010

Publicado pela "Auditoria Cidadã da Dívida"
A Folha Online de hoje traz balanço dos 8 anos do governo Lula, cujos aspectos mais bem avaliados em pesquisa Datafolha são o “combate à fome e à miséria” e a “condução da economia”. Na sexta feira, a Folha Online divulgou informação do IBGE, de que as regiões metropolitanas do Rio de Janeiro, Porto Alegre e Belo Horizonte estariam vivendo uma situação de “Pleno Emprego”, pelo fato de apresentarem taxas de desemprego próximas ou inferiores a 5% em novembro. Em tal situação, segundo o IBGE, aqueles que ainda procuram emprego estariam fazendo isso para “testar o mercado” de trabalho, ou estariam “em transição entre um trabalho e outro”. Segundo o IBGE, as vagas temporárias de emprego ofertadas nesta época de fim de ano contribuíram para este resultado.

Tais informações poderiam dar a entender que a política econômica estaria correta, apesar de destinar a maior fatia do orçamento federal para o pagamento de juros e amortizações da dívida.

Porém, tal metodologia de medição do desemprego não considera a qualidade do emprego, ou seja, a sua precariedade, ou o caso de pessoas que deixaram de buscar emprego pois perderam as esperanças de encontrá-lo (o chamado “desemprego oculto pelo desalento”).

A Pesquisa de Emprego e Desemprego do DIEESE, que mede tais variáveis, mostra que em outubro a taxa de desemprego era de 8,2% em Porto Alegre e de 7,2% em Belo Horizonte, ou seja, taxas bem maiores que as medidas pelo IBGE. No Rio de Janeiro, onde não é feita a pesquisa do DIEESE, um dado é revelador: dentre os jovens de 15 a 17 anos, a taxa de desemprego foi de nada menos que 20,4%, segundo o próprio IBGE.

A taxa nacional de desemprego anunciada pelo IBGE em novembro, de 5,7%, representa apenas cerca da metade da taxa geral de desemprego apontada pelo DIEESE em outubro (10,8%), e ainda se encontra acima da taxa observada há 16 anos atrás. Outra variável importante a ser considerada é a renda média do trabalho, que em 2009 ainda se encontrava abaixo da renda observada em 1995.

Em suma: o país sequer retornou a uma situação de 16 anos atrás, quando obviamente a conjuntura era vista como precária por integrantes do atual governo, que criticavam a metodologia da pesquisa do IBGE, exatamente por desconsiderar o desemprego oculto pelo trabalho precário ou pelo desalento.

Esta tendência de queda na taxa de desemprego somente recupera parte das perdas ocorridas no mundo do trabalho após as crises financeiras dos anos 90, e decorre de conjuntura internacional mais favorável. Segundo Relatório da CEPAL (pág 46), esta tendência de queda da taxa de desemprego a partir da década de 2000 ocorre em toda a América Latina.

Ou seja: após as crises financeiras dos anos 90 terem mostrado a falência do neoliberalismo – devido às políticas anti-sociais (ex: aumento das taxas de juros para 40% ao ano) na tentativa de evitar as grandes fugas de capitais para o Norte, o que gerava grande desemprego - o capitalismo global tratou de rever a sua estratégia, passando a combater as crises com trilhões de dólares sendo liberados instantaneamente pelos Bancos Centrais, para socorrer o sistema financeiro e produtivo (às custas do povo) e assim gerar grande fluxo de dinheiro para os países em desenvolvimento. Políticas compensatórias focalizadas para os mais pobres também foram estimuladas (ex: Bolsa Família), no sentido de tentar legitimar o sistema neoliberal, dentro do que se convencionou chamar de “Novo Consenso de Washington”.

Nesta nova situação, os rentistas internacionais continuam ganhando, pois agora aplicam seus dólares em títulos da “dívida interna” nos países do Sul, que pagam juros bem maiores, e cujas moedas estão se valorizando frente ao dólar. Os Banco Centrais compram os dólares dos investidores internacionais e lhes pagam com títulos públicos. Com isso, os Bancos Centrais dos países do Sul acumulam centenas de bilhões de dólares em reservas internacionais, que garantem as fugas de capital, dispensando a subida dos juros (evitando altas no desemprego), mas às custas de uma enorme dívida interna, cujos juros são pagos pelo povo que, por isso, continua sem serviços públicos de qualidade, como saúde e educação.

Desta forma, o neoliberalismo continua reinante, com a ilusão de que estaria superado (o que afasta a hipótese de revoltas populares), porém, aprofundando cada vez mais o endividamento, que agora aparece sob uma nova face – a “dívida interna”.

Enquanto isso, no Norte, as enormes dívidas feitas para salvar o setor financeiro continuam justificando pesadas reformas que retiram direitos dos trabalhadores e aposentados, em um processo que pode significar uma nova rodada de aprofundamento do neoliberalismo em todo o mundo.
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