Domingo, 17 de abril de 2011
Gilberto Costa
Repórter da Agência Brasil
Duas pesquisas desenvolvidas no Brasil buscam a produção
de medicamentos para diagnóstico e imunização da população contra os
quatro tipos de dengue a partir da modificação genética de plantas.
Na Universidade Estadual do Ceará, o Laboratório de Bioquímica Humana
usa o feijão de corda para produzir a proteína do vírus da dengue e
obter a vacina. Na Universidade de Brasília (UnB), o Departamento de
Biologia Celular tenta produzir uma parte do vírus da dengue com alface e
criar um reagente para detectar a doença.
A intenção dos pesquisadores da UnB é montar um kit para
diagnóstico que seja mais barato do que o de origem animal (camundongo) e
que o Brasil precisa importar parte da Austrália. O kit terá
um reagente produzido com alface na qual foi injetado o gene do vírus da
dengue. A alface transgênica produzirá uma partícula viral defeituosa
que será aproveitada em reagente, a ser misturado ao sangue coletado.
Conforme a reação, o medicamento indicará se o paciente está com os
anticorpos do vírus da dengue.
Segundo o pesquisador Tatsuya Nagata, virologista do Laboratório
de Microscopia, ligado ao Departamento de Biologia Celular da UnB, a
alface é mais eficiente do que bactérias e leveduras tradicionalmente
usadas na produção de vacinas. “Bactérias e leveduras têm um sistema
celular mais primitivo do que o da alface. O sistema celular da planta é
mais próximo do dos seres humanos”, diz.
Nagata afirma que há vantagens em usar um vegetal em vez de
reagentes extraídos diretamente de animais. Primeiro, é o fato de, não
usando animais na pesquisa, não ter de sacrificá-los. A outra vantagem é
que os técnicos de laboratório não correm risco de contaminação no
momento de aplicar a injeção nos camundongos.
A pesquisa com reagentes ainda tem ainda dois anos de prazo, e os
insumos serão testados em sangue infectado pela dengue e já armazenado
pela Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz). As alfaces geneticamente
modificadas são mantidas em local seguro e separado. Nagata não descarta
a hipótese que, no futuro, a própria alface possa ser utilizada como
vacina. “A metodologia está sugerindo isso, mas [a ideia] ainda não é
aceita pelos especialistas em vacinação,porque a dosagem tem que ser
corretamente medida.”
No caso do feijão de corda, o propósito é retirar, diretamente da
planta, a proteína para a vacina. “Nós inserimos em um vetor os genes
que produzem a proteína E do envelope dos quatro sorotipos do vírus da
dengue. Em seguida, os introduzimos dentro das células da planta",
explica a a bioquímica Maria Izabel Florindo Guedes, responsável pela
pesquisa na Universidade Estadual do Ceará.
De acordo com Maria Izabel, à medida que as plantas crescem, as
proteínas do vírus da dengue vão se multiplicando. É como se a planta se
transformasse em uma biofábrica de grandes quantidades de proteínas do
vírus da dengue. Após alguns dias, as plantas são coletadas, trituradas e
as proteínas do vírus são extraídas (purificadas), acrescentou a
bioquímica.
Segundo ela, as proteínas “candidatas vacinais” já foram usadas na
imunização de camundongos. “Os resultados obtidos até o momento mostram
que, devido aos altos títulos de anticorpos induzidos pelas proteínas
heterólogas [compostas] produzidas em plantas, a proposta é viável e
poderá abrir perspectivas para a produção da primeira vacina eficaz e de
baixo custo contra a dengue.”
Como se trata de um medicamento para imunização de pessoas, a vacina
extraída do feijão de corda geneticamente modificado ainda passará por
extenso estudo clínico, que ainda não tem previsão para começar, informa
a pesquisadora responsável. Para ser usado no Brasil, todo medicamento
tem de ser registrado na Agência de Vigilância Sanitária (Anvisa).