Terça, 6 de março de 2012
Por
Ivan de Carvalho

Mas a cigana estava
determinada, insistiu, levantou a voz, falando em espanhol, mas plenamente
compreensível para a desembargadora baiana o que aqui já vai traduzido: “Você
tem uma aura muito forte sobre sua cabeça, venha cá!”.
A magistrada, ex-comunista
que faz tempo fez sua revisão mental, acredita em milagres e em todos os
santos, rendeu-se ao apelo. Foi. A cigana olhou umas cartas, fez uma leitura
silenciosa de uma das mãos de Sara, voltou às cartas e afinal anunciou sua
sentença à desembargadora, que naturalmente não lhe havia falado de sua
ocupação profissional: “A senhora vai concorrer a uma eleição no seu trabalho,
vai ter muita coisa contra, mas a senhora vai ganhar”.
Sara achou que a cigana
havia errado. Considerou que ela estaria se referindo a uma eleição que
disputara, sem êxito, para uma posição na Mesa do Tribunal de Justiça. Mesmo
assim, resolveu mostrar uma fotografia à cigana. “Ele não está mais aqui. Mas
vocês se amaram, foram felizes”. A fotografia era do advogado Pedro Milton de
Brito, ex-presidente da OAB da Bahia e ex-membro do Conselho Federal da OAB,
mas, para Sara, principalmente seu marido e pai de suas duas filhas, Natassia e
Catarina. Pedro Milton “não está mais aqui”, como disse a cigana, desde 4 de
dezembro de 2000.
A desembargadora, talvez
emocionada, pegou uma nota de 100 pesos para dar à cigana, sob a censura da
irmã Esmeralda, que achou um exagero: “Que é isso? Você ficou doida?”. E Sara:
“Não, eu gostei dela. Ela nem acertou sobre a eleição... mas eu gostei dela”. E
deu os 100 pesos, despediu-se, foi saindo, alguns passos. Então a cigana falou
alto, dando a última palavra: “Eu só quero que, quando acontecer, a senhora se
lembre quem fez a previsão”.
Hoje, às 17 horas, a
desembargadora Sara Silva de Brito toma posse numa das cadeiras destinadas a
desembargadores no Tribunal Regional Eleitoral. Conquistou a vaga, como já
mencionado, em 18 de janeiro, numa difícil disputa com a desembargadora Daisy
Lago, a quem venceu por um voto – 18 a 17 – no pleno do Tribunal de Justiça,
uma vitória obtida apesar de “muita coisa contra”, como advertira a cigana. A
desembargadora Sara Silva de Brito está convencida de que, ao contrário do que
avaliou inicialmente, a cigana acertou.
Bem, se eu fosse ela, iria
com urgência dar outro passeio na Calle Florida. Quem sabe a cigana tem alguma
outra boa revelação a fazer...
A posse de Sara no TRE será prestigiada pela
ministra do Superior Tribunal de Justiça e corregedora nacional de Justiça,
Eliana Calmon, que fará um discurso na solenidade. A ministra e corregedora do
Conselho Nacional de Justiça será também a palestrante de hoje no Café da Manhã
com Empresários, promovido pelo Instituto Miguel Calmon, com apoio da
Associação Comercial e da OAB, seção da Bahia. Na palestra, o tema é o CNJ.
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Este artigo foi publicado originalmente na Tribuna da Bahia desta terça.
Ivan de Carvalho é jornalista baiano.