Terça, 13 de março de 2012
*Por Marcello Barra
O ato da Advocacia-Geral da União (AGU)
em relação ao twitter da lei seca é de censura à liberdade de expressão e
à inovação. O impacto se dá sobre a possibilidade de democracia e
desenvolvimento econômico. Concretamente, tenta-se censurar a internet,
tornando ilegal o que é legal, colocando-se uma sombra de
semi-legalidade sobre o conjunto do conteúdo da rede.
A medida da AGU não está isolada da
realidade internacional. A censura que a AGU tenta, como órgão da
Administração e, portanto, com baixo grau de legitimidade democrática,
impor à sociedade está no contexto do SOPA, a chamada “Lei de Combate à
Pirataria Online”, nos EUA, do ACTA, o “Acordo Comercial
Anticontrafação” e da prisão de Julian Assange, do WikiLeaks. De modo
desigual, no Brasil, a ação é capitaneada pelo ex-senador, reeleito
depois apenas como deputado, Eduardo Azeredo (PSDB).
Há duas contradições centrais no caso da censura ao Twitter: limitar o avanço da produtividade da economia no meio da crise do capitalismo e o avanço da maneira como o homem produz sua vida, com retrocessos nas relações entre os homens, como este representado pela AGU.
Em primeiro lugar, os maiores defensores
dessa tecnologia são as empresas de telecomunicações e de redes
sociais, como o Twitter, que são justamente os setores econômicos que
mais crescem de valor na bolsa de valores e mais ampliam a produtividade
da economia. A velha mídia burguesa e os porta-vozes do neoliberalismo
falam muito em inovação tecnológica (exclusivamente para o mercado),
inclusive defendem as empresas fisicamente dentro das universidades, e
com isso criaram outra lei, que essa mídia tradicional chamou de “Lei do
Bem”. Mas, quando surgem inovações pela própria dinâmica do
desenvolvimento econômico do capitalismo, pretende-se proibi-las. Em
segundo lugar, os setores que mais criticam o avanço das tecnologias da
informação e comunicação (TICs) são justamente aqueles que têm os
maiores prejuízos e vêem seus modelos de negócio se mostrarem inviáveis,
ou seja, as empresas da velha economia.
Essa contradição, somada à perseguição à
liberdade na internet que os governantes e poderosos empreendem, revela
algo muito maior: a ameaça que a internet representa ao monopólio do
poder do Estado. Em outras palavras, o medo do Poder Dual. Todas as
revoluções da história dividiram o Poder, constituindo-se a dualidade do
Poder, ou seja, destrói-se o monopólio do Estado, com seus aparelhos
ideológicos. As revoluções começam a surgir quando se derruba tal
monopólio.
*
Com a construção da lei ocorrendo de uma
maneira nada legítima para a democracia, através de um órgão da
Administração, a AGU, é ainda mais necessário se perguntar para que e a
quem serve a lei, em outras palavras, a lei está a serviço de quem? Se a
lei é feita pelos homens, então a quem a lei vai beneficiar e
prejudicar? A Lei deve impedir o desenvolvimento tecnológico ou o
desenvolvimento social? Por que se discute a criação de uma nova
legislação e não se debate a fiscalização e cumprimento de outras leis
do trânsito, como o respeito à sinalização, setas, faixas de pedestre,
semáforos? Por que se prefere discutir algo que cerceia a liberdade?
Se os cânones da academia (burguesa) não
conseguem mais responder à realidade, dever-se-ia punir a realidade? Ou
a formação que suporta os homens da Lei se tornou obsoleta para este
mundo? Ou mesmo os conteúdos que a universidade transmite à sociedade
foram ultrapassados pela velocidade da história?
Há um avanço da tecnologia, que muda o
modo como o homem produz sua vida. No entanto, quer se limitar e proibir
esse avanço da tecnologia, ao invés de se avançar na compreensão do
fenômeno objetivo. Há, portanto, um problema central na geração de
conhecimento. O surgimento das redes, bem como a censura delas, está
situado no campo das tecnologias e do saber. Portanto, fazer a reflexão
sobre a censura ao twitter da lei seca é usar a arma da crítica em
relação à geração do conhecimento e à formação dos homens. Mais: trazer o
conhecimento gerado pela classe trabalhadora para a própria classe. Apenas assim se pode dar o salto da classe em si à classe para si, isto é, se pode alcançar a liberdade e a emancipação.
Deve-se recorrer ao maior autor
“esquecido”, negligenciado, escondido mesmo (Freitas, 2005; Robaina,
2011). Aquele que precisa ser “resgatado” é Vladimir Ilich Ulianov, o
Lenin. Maquiavel é o grande pensador da união italiana, mas era tão
somente um conselheiro do Príncipe. O avanço do processo histórico levou
a uma síntese do conhecimento com a ação. Lenin é essa personificação, o
gênio da classe proletária que, além de intelectual, era político. A
síntese entre saber e política.
As figuras clássicas no saber e na
política são o filósofo-rei socrático e o político demagogo weberiano.
Lenin representa a ruptura e a possibilidade da falência histórica
desses dois tipos com o advento da revolução. É justamente a existência
de Lenin que demonstra a possibilidade da mudança. Lenin é a revolução.
Todavia, a genialidade de Lenin tem estado hoje sob o monopólio político
da direita e da classe burguesa. Como pode ser usado por pessoas como
Sarney e não constar nas bibliografias da universidade? Como que pode
Lenin não ser lido pela juventude e pelos trabalhadores? É um verdadeiro
crime de lesa-humanidade o gênio da classe trabalhadora ser escondido
da própria classe!
Avanços no cerceamento a liberdades,
tolhendo-se o que há de democracia formal, resultado de séculos de luta
dos trabalhadores, levantam o questionamento: vivemos em uma democracia
de verdade? @s indignad@s da Espanha, que no dia 15 de outubro de 2011
se internacionalizaram com manifestações em 89 países, dizem que não.
Por isso, a palavra de ordem da geração da internet livre é Democracia
real já!
* Marcello Barra é sociólogo e militante do PSOL
BibliografiaFREITAS, Francisco Máuri de Carvalho. Lenin e a educação política: domesticação impossível, resgate necessário. Tese (doutorado) – Faculdade de Educação, Universidade Estadual de Campinas – Unicamp, Campinas, 2005. Disponível em: <http://www.bibliotecadigital.
ROBAINA, Roberto. Em defesa do leninismo: algumas considerações sobre a teoria da revolução em Lenin. Rio de Janeiro: Fundação Lauro Campos, 2011. Disponível em: <http://www.socialismo.org.br/