Segunda, 12 de março de 2012
Por
Ivan de Carvalho

A comissão de “juristas”, por
seu relator geral, o procurador Luiz Carlos Gonçalves, explicou que “há setores
que defendem a descriminalização e há setores que defendem a permanência
atual”, que ambos os segmentos “são dignos de respeito” e, ambos ouvidos, “a
solução que encontramos foi a intermediária”.
A “solução intermediária” entre
a vida e a morte encontrada e que tem sido divulgada pela mídia – mas não ainda
com a intensidade e o didatismo necessários à sua exata compreensão pela maior
parte da população – é a senha para a matança, cruel e covarde, dos inocentes
indefesos. Aos milhões. Mais um Holocausto.
Mantém-se a permissão do
código vigente para o aborto em caso de estupro (o que é inadequado e está no
Código Penal de 1940 porque foi elaborado numa época em que ser estuprada era
uma desonra para a mulher, mais do que para o estuprador). Podia-se dar outra
solução: assistência médica, psicológica e, se for o caso, financeira também, para
a gestante até o parto e, não querendo ela a criança, o estado assumiria e
seria responsável por ela até uma adoção ou até a maioridade civil. Matar, no
entanto, deve ser um pouco mais fácil, mais barato e menos trabalhoso.
A outra permissão dada pelo código atual – quando
a gravidez implique em gravíssimo risco para a vida da mãe – é substituída no
anteprojeto por simples “risco à vida ou à saúde da gestante”. O que é esse
risco (que nem precisa ser grave) à vida? E o esotérico “risco à saúde” é um
descriminalizador de amplo espectro, tanto mais amplo quanto forem
condescendentes com o aborto o médico ou o juiz. Vai ficar muito fácil matar
legalmente, em um país em que não existe a pena de morte, mas tanto já se mata
ilegalmente, sejam os nascituros, sejam os já nascidos.
Inovações para permissão do aborto são os casos
de anencefalia, de inseminação artificial não consentida (o nascituro, neste
caso, pagará com a vida a falta de ética de alguém já nascido) e de eugenia – esta,
representada pelos casos em que o feto padeça “de graves e incuráveis anomalias
que inviabilizem a vida independente”, conforme atestado por dois médicos.
Imagem da internet

Em tempo. Em 2007, o instituto de pesquisas
Datafolha apurou que 65 por cento dos brasileiros acreditam que a atual
legislação sobre o aborto não deve ser alterada. O instituto Vox Populi, também
em 2007, indicou que só 16 por cento da população do país é favorável à prática
do aborto em caso de “gravidez indesejada”. Em 2010, a oposição popular à
facilitação legislativa do aborto já era bem maior. Medida pelo Vox Populi,
atingia 82 por cento. Parece que a “solução intermediária” inventada pela
comissão de doutos e sábios que elaboram o anteprojeto do novo Código Penal está,
explicitamente, na contramão da opinião da grande maioria da população. Não que
a maioria tenha sempre razão. Mas é um dado a ser muito considerado.
Os doutos ainda não contaminaram o povo com a
ideologia da morte.
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Este artigo foi publicado originalmente na Tribuna da Bahia desta segunda.
Ivan de Carvalho é jornalista baiano.