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(Millôr Fernandes)

sexta-feira, 16 de novembro de 2012

O dinheiro da Saúde

Sexta, 16 de novembro de 2012
Por Ivan de Carvalho
Alcançou esta semana, com grande atraso, a Assembléia Legislativa da Bahia, a coleta de assinaturas que vem sendo feita em âmbito nacional com o objetivo de dar condições legais para a apresentação, ao Congresso Nacional, de projeto de iniciativa popular que visa a modificar a lei complementar que regulamentou a emenda constitucional 29, que trata da saúde pública e dos recursos a ela destinados.

            A lei complementar que se quer modificar estabelece que os Estados devem destinar 12 por cento de sua receita corrente bruta para o setor de saúde, e os municípios, 15 por cento. Essa lei complementar, aprovada pelo Congresso, incluía a obrigatoriedade de destinação de 10 por cento da receita corrente bruta da União para a saúde, mas a presidente Dilma Rousseff vetou tal dispositivo, entre outros.

            Agora, o que se pretende com a proposta de iniciativa parlamentar, para cuja apresentação ao Congresso é necessário 1,5 milhão de assinaturas de eleitores, é introduzir, na lei complementar que regulamenta a Emenda 29, a obrigatoriedade de percentual mínimo de 10 por cento da receita corrente bruta da União para a saúde.

            E evidente que, se tão recentemente se opôs à adoção desse percentual, o governo vai procurar dificultar, como puder, a iniciativa popular, desde a fase de coleta de assinaturas até a eventual e futura tramitação e aprovação da proposta de iniciativa popular no Congresso. O fato dessa proposta, se for adiante, chegar ao Congresso no ano que vem e tramitar enquanto se aproximam as eleições gerais – nas quais, entre outros objetivos, o governo e a coalizão partidária oficial deverão ter o objetivo de reeleger a presidente Dilma Rousseff – poderá abrir uma brecha política para uma aprovação, apesar das dificuldades evidentes.

Mas, se o quase-milagre acontecer, a última palavra será dada pela presidente Dilma, sancionando ou vetando, com o respectivo bônus ou ônus eleitoral. Já para a base parlamentar governista, haverá o ônus se rejeitar a proposta, mas o bônus, se aprovar, será dividido com a oposição, que naturalmente vai votar a favor da proposta de iniciativa popular. Detalhe: a circunstância de ser apresentada por 1,5 milhão de cidadãos, ou até mais, dá certa força política para a proposta, dificultando manobras como a de engavetá-la, fugindo a discussão e votação.

            O Movimento Nacional para a Defesa da Saúde Pública, que patrocina a coleta de assinaturas, foi criado por várias entidades da sociedade civil em 13 de março deste ano. Em 13 de janeiro havia sido sancionada a Lei Complementar 141, que regulamentou a Emenda Constitucional 29 e recebeu 15 vetos da presidente Dilma, inclusive quanto à destinação dos 10 por cento da receita corrente bruta da União para a saúde.

            A coleta de assinaturas já vem se processando há algum tempo, mas prossegue. Aparentemente, está faltando divulgação suficiente, o que é mesmo de estranhar e uma coisa a corrigir vigorosamente. Primeiro, porque a causa é nobre, já que o dinheiro destina-se ao SUS, que está escandalosamente ruim. Segundo, porque se os municípios são obrigados a gastar 15 por cento com saúde (e muitos, sem alternativa, gastam até 25 por cento) e os Estados são obrigados a gastar pelo menos 12 por cento com o setor, então municípios e Estados – depois da população que usa o SUS – são ou deveriam ser os principais interessados em que a União destine à saúde pelo menos os dez por cento a que já deveria estar obrigada.

            Ora, onde estão governadores, prefeitos e secretários de saúde e onde estão as Assembléias Legislativas, que podem atuar na campanha institucionalmente, não só com um de seus deputados ou com a Comissão de Saúde? Será que estão mais preocupados com o olhar enviesado da presidente Dilma ou com a saúde das pessoas que governam, principalmente as pobres?
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Este artigo foi publicado originariamente na Tribuna da Bahia desta sexta.
Ivan de Carvalho é jornalista baiano.
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