Sexta, 21 de fevereiro de 2014
Por Fernanda Morena
SUL21
Ex-deputada federal e uma das fundadoras do PSOL, Luciana Genro é a
pré-candidata à vice-presidência da chapa encabeçada pelo senador
Randolfe Rodrigues (PSOL-AP). Em 2003, Luciana foi expulsa do PT ao lado
de Heloísa Helena, Babá e João Fontes, os parlamentares que votaram
contra a reforma da previdência. Chamados de “radicais” dentro do
Partido dos Trabalhadores, os expulsos formaram o Partido Socialismo e
Liberdade, uma legenda que Luciana diz ser “socialista não só no nome”.
Impossibilitada de concorrer no Rio Grande do Sul em função do seu
pai, Tarso Genro, ser governador do estado, Luciana buscava ser a opção
do PSOL no pleito nacional pela presidência. Acabou perdendo na
convenção partidária em dezembro para Rodrigues, com quem travou fortes
embates pela “diferente visão política”. No último dia 12, publicou uma carta aberta aos militantes do Partido dizendo que aceitava ser vice na chapa com Randolfe.
Em entrevista ao Sul21, a ex-deputada fala sobre sua
visão para o Brasil, as mobilizações sociais, seu futuro na política e a
decepção com Brasília: “às vezes, a política nos causa nojo”, lamenta.
Sul21- Na convenção de dezembro, tu eras oposição ao Randolfe pela liderança da chapa.
Luciana – Sim. A gente fez um embate interno, político, a respeito da
melhor tática pro Psol nessas eleições, até mesmo a respeito de
questões estratégicas. Esse debate segue. E a minha presença na chapa é
uma forma de compor as diferentes visões que existem dentro do partido.
Elas não são visões antagônicas, mas são diferentes; diferem a respeito
de qual a melhor forma de construir um partido de esquerda diante da
situação política do Brasil — particularmente depois do que aconteceu em
junho do ano passado, que é, para nós, um divisor de águas no que está
ocorrendo na situação política.
Sul21- No que tu e o senador Randolfe mais discordam? Chega a um ponto de um ter de ceder para acomodar as visões do outro?
Luciana – Não é uma questão de um ou outro ceder. Digamos que nós
representamos posições políticas que se expressam de formas diferentes
dentro do partido. Isso tem a ver com a discussão de programa de
governo, que a gente ainda não aprofundou no Psol – a gente vai começar
agora com seminários que vão ocorrer nas principais capitais para
chamar militância para debater o programa. Então aí provavelmente vão se
manifestar diferenças. Tivemos diferenças a respeito de políticas de
alianças – os debates foram bastante acirrados neste tema.
Sul 21 – Alguma aliança já determinada?
Luciana – A gente está discutindo com o PSTU e o PCB, os únicos dois
partidos que fazem uma oposição pela esquerda ao PT. Estamos debatendo a
possibilidade de fazer essa aliança. Ainda não se tem uma definição
sobre isso.
Sul21- E essa discussão com o Randolfe? Ele defendeu aliança
com DEM, PSDB no norte do país nas últimas eleições municipais, em 2012.
Luciana – Ele não chega a defender isso, mas ele tem um arco de
aliança mais amplo do que, digamos, aquele que eu defendo. Acho que
agora não é o momento de ressaltar as diferenças. É o momento de
ressaltar a unidade. Foi isso que tentei fazer nessa carta aberta aos
militantes do Psol, enfatizando que a gente tem um grande acordo
político dentro do Psol que envolve todas as correntes: construir uma
alternativa à esquerda do PT. As táticas de construção dessa alternativa
podem se expressar de forma variada, mas termos esse acordo sobre a
construção do partido estar conectada com as ruas, com os movimentos
sociais, com a insatisfação popular e principalmente juvenil com a
política tradicional, é muito importante.
Sul21- Vocês estão de acordo nessas questões?
Luciana – Isso foi o que me animou a aceitar ser vice do Randolfe e a
seguir dentro do Psol — e dentro da própria campanha eleitoral –,
defendendo as minhas ideias e as ideias que eu represento. Podem não ser
exatamente as mesmas [ideias] dele, mas que, a partir desse grande
acordo político, dessa necessidade política, desdobram-se as táticas que
a gente vai aplicando para construir o Psol.
Socialismo não só no nome, mas na política econômica
Sul21 – Como tu vês o Psol no pleito?
Luciana – Minha preocupação nesse documento político, em que aceitei
ser vice, foi o de elencar alguns temas que acredito que são importantes
para que o Psol se diferencie da oposição que, na essência, não é
oposição a Dilma – que é o Eduardo Campos (PSB-PE) e o Aécio Neves
(PSDB-MG). Porque esses dois, e junto com eles a Marina [Silva
(PSB-AC)], representam matizes de um mesmo modelo político e econômico.
Sul21- O que tu, Luciana, levas como programa de governo teu para a chapa?
Luciana- Então, a primeira definição que eu acredito ser necessária é
que o Psol não é um partido socialista só no nome. A política econômica
que o partido vai desenvolver tem que apresentar propostas de transição
para combater a lógica econômica que vigora no Brasil, que é a lógica
capitalista. A lógica da mercadoria se sobrepondo aos interesses do ser
humano. Claro que não se pode propor numa campanha eleitoral que vai se
implantar o socialismo no Brasil. O socialismo não se implanta a partir
de um processo meramente eleitoral. Pode, contudo, comprometer-se com
medidas de transição, que apontam para uma dinâmica de construção
socialista.
Sul21 – Que medidas são essas?
Luciana – Começar, por exemplo, com auditoria e suspensão de
pagamento da dívida pública. Isso me aprece algo que parece ser central
na política de governo do Psol. O exemplo do Equador é eloquente para
mostrar que isso pode ser feito sem que o país se isole completamente da
economia mundial, muito embora a gente saiba que a economia mundial é
capitalista e que o país está submetido aos interesses do capital
financeiro que domina a economia mundial. O fato de o Equador ter feito
uma auditoria, uma suspensão do pagamento e, consequentemente, uma
renegociação da dívida, demonstra que isso pode ser feito, sem cair no
isolamento ou numa crise financeira de grandes proporções. A outra
questão fundamental é o combate à concentração de riqueza. Fala-se muito
que o Brasil e o governo Lula/Dilma criaram uma nova classe média. Isso
é uma mentira deslavada.
Sul21 – Foi a pobreza que diminuiu?
Luciana – É verdade que a pobreza foi reduzida e que setores que
estavam antes completamente excluídos do mercado de consumo conseguiram
ter um nível de consumo mínimo. Mínimo. Esse “sair da miséria”, às
vezes, é ligado a um aumento de R$ 10 no Bolsa Família, que, nos índices
do governo, apontam para uma saída da miséria. Essa saída nem sempre é
real, porque R$ 10 não tiram uma pessoa da miséria efetivamente. Ou
mesmo que sejam R$ 50. São pessoas que saíram de um patamar de miséria
absoluta para uma miséria controlada.
Sul21 – O que acontece com o auxílio?
Luciana – Essas políticas de transferência de renda, como o Bolsa
Família, são necessárias, mas insuficientes. Elas são facilmente
derrubáveis pela situação econômica do país. O país não fez mudanças
estruturais na economia e na concentração de renda. Quer dizer,
continuou o setor financeiro concentrando a maior parte da riqueza do
país. Inclusive é de se notar que, antes do Lula, as 500 maiores
empresas do Brasil concentravam um percentual do PIB igual aos 50
maiores bancos. Depois do Lula, essa diferença aumentou, e os 50 maiores
bancos concentram mais riqueza do que as 500 maiores empresas. Isso
demonstra que não foram feitas mudanças estruturais.
Sul21 – Isso afeta a situação social das famílias que recebem o auxílio?
Luciana – O Brasil fica vulnerável aos humores dos mercados, e esses
ganhos que foram obtidos em termos de política social e aumento do
salário mínimo, eles se perdem quando a situação econômica se agrava.
Indicadores que melhoraram durante o governo Lula em termos de redução
da pobreza já começaram a piorar em 2008 com a crise internacional.
Ricos devem pagar mais impostos
Sul21 - Como se faz essa desconcentração de renda?
Luciana – Essa é uma das propostas mais importantes que eu defendi
quando fui deputada federal, a da reforma tributária. Eu consegui
inclusive aprovar o Projeto de Lei na Comissão de Constituição e
Justiça, mas depois foi engavetado. Fui também parte da Comissão da
Reforma Tributária e apresentei um conjunto de medidas, que não eram
minhas, mas da bancada do Psol, para uma reforma tributária justa.
Sul21 – O que seria um sistema tributário justo?
Luciana – Diminuir a tributação sobre consumo e a renda e aumentar a
tributação sobre a riqueza e a propriedade. Porque o sistema tributário
hoje é totalmente regressivo: quanto menos tu ganhas, mais imposto tu
pagas. Porque tu, como assalariada, consomes tudo aquilo que tu ganhas, e
o imposto sobre o que tu consomes é muito elevado. O imposto de renda
para o assalariado também é muito elevado. Já o empresário, que recebe
dividendos, lucros e rendas de aplicações financeiras, ou que investe na
compra de propriedades, paga muito menos imposto, porque a tributação
nesse setor – o imposto sobre a propriedade e o imposto sobre a riqueza –
é muito menor do que o imposto da renda do assalariado e o consumo.
Sul21 – Essa reforma é possível?
Luciana – Vou levar a questão adiante mostrando, por exemplo, que é
possível atender a demandas de muitos anos da classe média, como por
exemplo a atualização da tabela do imposto de renda. Ele vem há anos
perdendo para a inflação, o que gera uma fonte de aumento cada vez maior
da tributação do assalariado. É possível fazer essa mudança e, ao mesmo
tempo, atender demandas como a tarifa zero no transporte público.
Sul21 – Tirando o dinheiro de onde?
Luciana - Tirando desses setores que têm acumulado bilhões.
Principalmente o setor financeiro. Aumentar muito fortemente a
tributação sobre os bancos. Os bancos nunca lucraram tanto! Com um
imposto maior sobre as grandes fortunas das cinco mil famílias mais
ricas do Brasil, que já possuem uma riqueza bilionária e ainda
enriquecem cada vez mais. Elas aplicam dinheiro nos títulos da dívida
pública, recebendo altas taxas de juros do governo federal. E o dinheiro
[das taxas] sai de onde? Do bolso do assalariado.
Sul21 – E o momento é propício para rever a questão, quando o
mesmo problema reverbera no mundo todo por meio de movimentos como o
Occupy Wall Street.
Luciana – Há uma crise de legitimidade da política, das instituições,
de um modo geral. O modelo econômico capitalista não consegue dar uma
resposta às demandas populares, porque sua lógica, especialmente num
momento de crise como o que a gente vive desde 2008, é uma lógica de
arrocho. Cada vez mais, é de tirar cada vez mais do povo para poder
garantir a acumulação capitalista, garantir os lucros do setor
financeiro e também do setor produtivo. É no salário que se arrocha, é
nos investimentos das áreas sociais que se arrocha. A população, ao
sair de uma situação de miséria absoluta e começar a vislumbrar uma
possibilidade de consumo maior, evidentemente começa a exigir mais.
Começa a exigir um transporte de maior qualidade, exige uma saúde de
melhor qualidade. Ao mesmo tempo, assiste o país gastando milhões em
Copa do Mundo, em grandes estádios, em obras que não vão trazer um
retorno real para a população, e tem que andar em ônibus sem ar
condicionado, como o nosso prefeito está propondo agora em Porto Alegre.
Isso tudo faz com que a população se revolte e não se sinta
representada pela “classe política”. E esse é o grande desafio do Psol:
se diferenciar desse “mais do mesmo” que a gente assiste a cada eleição.
Contra a velha direita e a velha esquerda
Sul21 – Psol entraria contra essa velha direita, essas políticas que favorecem sempre os mais ricos?
Luciana – A velha direita e a velha esquerda, que é onde está o PT. A
velha direita é o PSDB e seus aliados; a velha esquerda é o PT e seus
aliados.
Sul21 – Como o Psol quer se identificar nessa eleição contra a “velha guarda”?
Luciana – O Psol precisa se credenciar como a esquerda conectada com
esse novo momento político do país, que é de negação das instituições
como elas se apresentam. Porque há essa crise de legitimidade que é
resultado de instituições como um parlamento, completamente dissociado
da realidade das pessoas. Brasília é uma ilha da fantasia. Os deputados
lá pouco refletem o que está acontecendo no Brasil real. Então eles
ficam lá debatendo coisas como lei antiterrorismo, como se o terrorismo
fosse um problema real pro país.
Sul21 – Como assim?
Luciana – Na verdade, o que eles querem é impedir que as mobilizações
sociais continuem. A repressão é uma marca desse modelo político que
carece de legitimidade. Em última instância, qual o papel do Estado
enquanto instituição? É garantir a ordem. E quando eles não conseguem
garantir a ordem a partir de uma hegemonia ideológica, que eles exercem
normalmente através da grande mídia, das instituições de um modo geral,
eles precisam recorrer à violência, à repressão. Em última instância, o
Estado é esse braço armado que garante a ordem através da violência, e a
lei antiterrorismo é parte dessa necessidade de reprimir para poder
garantir a ordem.
Tática black bloc afasta o povo
Sul21 – A criminalização do Black Bloc seria uma ferramenta para justificativa desse poder?
Luciana – Eu vejo que a classe dominante precisa acabar com as
mobilizações. E eles estão muito preocupados, principalmente, por causa
da Copa do Mundo, preocupados que a Copa possa ser conturbada pelas
mobilizações sociais.
Sul21 – E não vai ter Copa?
Luciana – Eu acho que essa história é equivocada. Isso como bandeira
não serve. A gente sabe que vai ter Copa, mas vai ter Copa com confusão,
com questionamento a esse modelo que o Brasil escolheu para fazer a
Copa, que é o de obras faraônicas, e não das mudanças que poderiam
trazer melhorias para a população, como reforma do transporte coletivo,
da mobilidade urbana, das estruturas de saúde. Essas obras não
aconteceram.
Sul21 – Tu és a favor da Copa?
Luciana – Se fosse votar agora em ter ou não Copa no Brasil, eu
votaria por não ter Copa. Fazer uma Copa nesses moldes não serve ao povo
brasileiro, que sequer vai ter, em sua ampla maioria, possibilidade de
ver os jogos, até porque os ingressos custam uma fortuna. Então não vejo
que isso traga um retorno real – embora a gente adore futebol e todo
mundo vá torcer pelo Brasil na Copa. Vamos torcer pelo Brasil percebendo
como essa Copa foi utilizada para manipular e para tentar acalmar os
ânimos, aquietar o povo. Junho mostrou isso, que não conseguiram e não
vão conseguir [manipular a população]. Eles acham que precisam acabar
com as manifestações.
Sul21 – E a associação do Psol às mobilizações e ao Black Bloc?
Luciana – Essa associação foi completamente forçada, porque a
intenção do Psol é a mobilização de grandes multidões, e a gente sabe,
qualquer um sabe, que a tática black bloc afasta o povo das
mobilizações. As pessoas ficam com medo. Primeiro elas ficam com medo da
polícia, porque elas sabem que onde tem Black Bloc tem polícia e
repressão. Depois, elas têm medo dos próprios Black Blocs, porque, mesmo
que não tenham a intenção de atingir as pessoas, acabam atingindo.
Então eu vejo que essa associação e essa ênfase que a grande mídia dá
para a tática black bloc é uma tentativa de esvaziar as mobilizações. E a
esquerda socialista, tanto o Psol como o PSTU, não tem nenhuma
associação com essa tática. Porque o que a gente quer realmente é uma
multidão na rua.
Sul21 – Mais gente nas ruas e menos Black Blocs?
Luciana – Junho mostrou que multidão na rua é a melhor coisa que tem
para que o povo interfira na política real. Olha o medo que eles, a
classe dominante e o governo, ficaram em junho. Isso não foi por causa
de meia dúzia quebrando coisa. Eles ficaram com medo da massa na rua.
Anunciaram mil coisas que iam fazer. O povo saiu da rua, e eles não
fizeram nada. Então essa é uma lição que a gente precisa transmitir
durante a campanha eleitoral. Mais gente na rua, mais mobilização. Assim
se tem capacidade de interferir na política e de fazer com que os
representantes institucionais escutem o que as pessoas estão pensando.
Globo é o maior partido da classe dominante
Sul21 – Envolver o nome do deputado Freixo, do Rio de
Janeiro, nessa associação pode ter sido uma forma de afastar a
insegurança trazida pela esquerda? Pois sabemos que Freixo ficou em
segundo lugar na disputa pela prefeitura do Rio de Janeiro.
Luciana – Ficou. Ali houve claramente uma ação orquestrada, onde um
dos principais protagonistas foi a Rede Globo, tanto a televisão, quanto
o jornal O Globo, como também foi aquele advogado das milícias. Eles se
aproveitaram. A Rede Globo, que é, para mim, o maior partido da classe
dominante brasileira, o maior partido em defesa do sistema, aproveitou a
oportunidade surgida. Primeiro, com a idiotice daquela ativista (Sininho),
de ter telefonado para o advogado dos milicianos — ainda que a intenção
dela possa ter sido boa, tirar os meninos da mão desse advogado
picareta. O advogado se aproveitou dessa oportunidade, inventou aquela
história toda que foi comprada pela Rede Globo.
Sul21 – Por que tu achas que isso foi interessante para a Globo?
Luciana – Porque, primeiro, ali surgiu a oportunidade de eles
desmoralizarem as mobilizações, de “mostrarem” que eram mobilizações
manipuladas, financiadas. Isso é totalmente absurdo: nem o Psol nem o
PSTU sequer têm dinheiro para fazer esse tipo de coisa. E, segundo, de
associarem a violência da tática black bloc aos partidos que estão nas
mobilizações, e, ainda, tentar desmoralizar uma figura pública [Freixo]
que, de fato, ameaça os interesses da Rede Globo, enquanto partido da
classe dominante, no Rio de Janeiro. O Freixo tem grande prestígio. Como
deputado estadual, vai ajudar a eleger uma bancada muito numerosa de
deputados estaduais do PSol, que vai ser uma pedra no sapato de qualquer
governo. Além disso, em 2016 tem chances novamente de ser o prefeito do
Rio, coisa que ele quase foi, com quase 30% dos votos, contra o Eduardo
Paes. Então eles aproveitaram uma oportunidade e foram derrotados. Foi
impressionante o Jornal Nacional de segunda-feira dando a notícia
daquele ato de desagravo ao Freixo, dando 40 segundos pro Freixo falar, e
quase que fazendo uma mea culpa envergonhada no final da reportagem.
Isso foi o quê? A força social que está por trás do Freixo e do Psol,
que inclusive se expressou através das redes sociais, um contraponto
importante à mídia tradicional. Isso mostrou que eles erraram na mão,
que eles expuseram demais a sua vontade de distorcer os fatos.
Sul21 – Isso pode vir a afetar o Psol no pleito nacional?
Luciana – Acho que esse episódio acabou virando o jogo, mostrando que
o Psol não tem nada a ver com isso. Nesse sentido, ele foi até bom,
porque oportunizou ao partido ampla audiência para a sua posição, que
nunca teve. De mostrar que não divide a mesma opinião dos Black Blocs,
que não utiliza o método.
Sul21 – Mas também não criminaliza os Black Blocs?
Luciana – Não, porque a gente entende o método black bloc como uma
expressão política equivocada de uma insatisfação. Falo do Black Bloc
autêntico – de quebrar bancos, fazer atos violentos para provocar a
polícia -, não o de saques. Achamos isso altamente equivocado e tivemos
nessa crise toda a oportunidade para deixar isso muito claro.
Futuro na política
Sul21 – Quais os planos para o teu futuro político? Vais seguir na política nacional?
Luciana – Primeiro, tenho uma definição para mim de que política não é
carreira. A minha profissão é de advogada, de professora. Eu encaro a
política como uma atividade essencial para mim como ser humano; uma
atividade que me satisfaz, que me gratifica e da qual eu sinto
necessidade. Quero, de alguma forma, participar e ajudar no processo de
transformação do Brasil. Então eu vou fazer o que for necessário, dentro
das minhas possibilidades.
Sul21 – Mas em nível nacional.
Luciana – Fui impedida de concorrer no RS. Acho isso uma grande
injustiça, mas é a posição da nossa justiça. Fui convidada a concorrer
em São Paulo, porque vou começar a fazer um mestrado lá na USP em março
em Direito. Mas achei que seria artificial uma transferência do meu
domicílio eleitoral para lá, e por isso fiquei no RS, mesmo correndo o
risco de não ser candidata a nada. Se eu perdesse essa indicação para a
candidatura à presidência, eu poderia não ser candidata a nada. E ao ser
convidada para ser vice, eu tenho uma oportunidade de seguir na
política nacional, que é o melhor que posso fazer agora para contribuir
com o Psol e a política brasileira. Ajudar a construir um perfil pro
Psol, que seja um perfil combativo, anticapitalista e conectado com o
sentimento das ruas. É necessário um partido que negue a velha política e
que afirme a necessidade de se construir novas formas de
representatividade.
Sul21 – Tu te sentes decepcionada com a política? Era membro do PT, hoje é contra…
Luciana – É difícil não se decepcionar cotidianamente com as
barbaridades que a gente vê no dia-a-dia. Mas eu sempre tive uma visão
muito crítica da política, e nunca me iludi que através da minha
intervenção, parlamentar, por exemplo, eu poderia conseguir grandes
avanços. Eu diria que sou mais feliz do que decepcionada. Tive uma
oportunidade rara de ser parte de um momento histórico, que foi o
momento da ruptura com o PT. Tenho no meu currículo, com grande
destaque, o fato de ter sido expulsa do PT pelo José Dirceu, pelo
Genoíno, pelo Delúbio, os mesmos que foram condenados como
quadrilheiros. Tive a oportunidade de ser protagonista desse processo de
construção do Psol, junto com a Heloísa Helena em 2006, quando ela foi
candidata à presidência. Fui uma das deputadas federais mais votadas,
com mais de 180 mil votos. Agora tenho a oportunidade de novo de ser
parte e de dar continuidade a esse processo como vice do Randolfe. Nesse
aspecto, eu me sinto privilegiada, de fazer parte de todos esses
momentos tão importantes. Agora, claro que a política, olhada friamente,
não só nos traz decepção, mas muitas vezes ela nos causa nojo.