Quarta, 26 de fevereiro de 2014
Helio Fernandes
Com sua atuação em várias frentes, construiu um padrão,
firmou convicção, acumulou admiração. Entre vários processos, (a Justiça
brasileira não tem passado, Luiz Nogueira luta para que tenha futuro)
destaquemos, pela ordem de tempo, dois deles. 1 – O que envolve a propriedade das
ações da atual TV-Globo ou Organização Globo. 2 – O processo de indenização da
Tribuna da Imprensa contra os “presidentes” Médici e Geisel.
A “impropriedade”
da TV-Globo que pertence a 673 acionistas da TV-Paulista
Desde 1964, antes, durante e depois do golpe, Luiz
Nogueira se empenhou em combater a usurpação e restabelecer o direito desses
673 acionistas da TV-Paulista. A partir de 1976, transferiram a propriedade da
maior televisão do país, recebendo, cada proprietário, um cruzeiro. (Ainda não
eram tempos do Real).
Toda
a campanha de 50 anos, num livro
Esse título é “Manobra Fantástica” e conta uma parte
dessa luta fantástica e ao mesmo tempo gigantesca, enfrentando o grupo de
comunicação, (proporcionalmente) mais poderoso do mundo.
Até 1964/65, esse grupo não existia, não tinha recursos.
Na biografia escrita pelo diretor da TV-Globo, Joe Wallach, “vivia de empréstimos
de Silvio Santos que cobrava de juros, oito e meio por cento ao mês”. Quem é Joe
Wallach? Um dos americanos que vieram com o equipamento da Time-Life.
Roberto Marinho enganou os americanos, ficou com o
equipamento e com esse único funcionário, que foi fundamental no crescimento.
Ele, funcionalmente, e a ditadura com sua formidável
colaboração. Em dinheiro, publicidade, concessões, e cerceamento-impedimento
que outros grupos, fizessem acordo com estrangeiros, como fez a TV-Globo,
usurpada dos 673 acionistas da TV-Paulista.
Um só exemplo: O Jornal do Brasil, um dos mais
importantes na época. Tinha assinado um acordo de cooperação com a CBS. Já havia
mandado para Londres um dos seus melhores quadros jornalísticos, Carlos Lemos.
Estive com ele em vários jogos, na Copa do Mundo da
Inglaterra em 1966. Fez o curso, mas Roberto Marinho conseguiu com a ditadura,
que qualquer outro grupo jornalístico pudesse ter televisão.
Por que nenhum, com jornais poderosos, puderam investir
em televisão? Sabendo que aí estava o futuro da INFORMAÇÃO e da OPINIÃO? Antes
da formidável tecnologia de hoje.
“Manobra
Fantástica” um livro para a História do jornalismo e da advocacia
Já li quase e
quase decorei as 275 páginas. Um documentário ou libelo da maior usurpação da História.
E o resumo de provas que a justiça ignorou, não só pela sua cumplicidade, mas
também como apreço e homenagem a Rui Barbosa, que inscreveu e escreveu para
sempre: “Justiça lenta e tardia, não é justiça”.
No caso da tremenda irregularidade acumulada pela
TV-Globo para manter uma concessão que jamais pertenceu a ela, não haverá justiça,
tardia. Embora lenta ela seja pela própria contagem do tempo.
Para mostrar a importância do processo, transcrevo a
abertura do livro, lógico, de autoria do bravo Luiz Nogueira, advogado
combatente. (Que até hoje não recebeu nem cobrou de ninguém. E pela decorrência
do prazo, nem contrataria alguém). Quem acredita que a Globo possa ser derrotada?
“Manobra
Fantástica”, a abertura libelo do livro
“Para não perder a concessão da TV Globo de São Paulo
S/A, a mais valiosa de todo o país, o empresário Roberto Marinho (1904-2003)
transferiu para o seu nome, em 30 de junho de 1976, as ações de 673 acionistas
fundadores da emissora, depositando em agência bancária Cr$ 1,00 (hum cruzeiro)
por ação, mediante ato societário temerário, como apontado pelo Poder
Judiciário, mas necessário, segundo a interpretação da poderosa organização,
para atender às determinações formuladas pelo Ministério das Comunicações. As
autoridades federais exigiram da empresa a regularização de seu quadro
societário (não cumprida entre 1965 e 1977) e não a exclusão dos acionistas fundadores”.
Tudo que está relatado no documento histórico (“MANOBRA
FANTÁSTICA” – Irregularidades e trapalhadas na transferência do controle da TV
Globo de São Paulo S/A) de autoria do advogado Luiz Nogueira, é rigorosamente
verdadeiro. Falhas administrativas, crimes prescritos, erros judiciários, abuso
de poder. Tudo isso está comprovado em documentos oficiais, que constam do
processo judicial, que se iniciou em 2001 na 41ª Vara Cívil do Fórum Central do
Rio de Janeiro e foi terminar no Supremo Tribunal Federal – STF.
Um processo que não engrandece os até agora vencedores,
o Espólio de Roberto Marinho e a TV Globo. Beneficiaram-se de dispositivo legal
que reconhece a prescrição do direito de ação, com isso convalidando
ilegalidades e fraudes violadoras da lei, como denunciado pelo Ministério
Público Federal. Elas foram cometidas há dezenas de anos, em prejuízo de
legitimo e indiscutível direito de 673 acionistas fundadores da Rádio Televisão
Paulista S/A, sucedida pela TV Globo de São Paulo S/A.
Na Ação Declaratória de inexistência de Ato Jurídico,
cujas petições e ANEXOS transformaram-se neste documento histórico, discute-se
a controvertida “venda” do controle acionário da então Rádio Televisão Paulista
S/A (Canal 5 de São Paulo), depois TV Globo de São Paulo S/A, para o jornalista
Roberto Marinho, entre 1964 e 1977. Sem prévia e obrigatória aprovação da
Administração Federal e por meio de documentos anacrônicos e outros falsos, como
apontado pelo conceituado Instituto Del Picchia de Documentoscopia.
Baseado em documentação falsificada, o ato de transferência
do controle da TV Globo de São Paulo S/A para o jornalista Roberto Marinha
estaria eivado de nulidade absoluta, segundo parecer da Procuradoria da
República, em São Paulo e no meu entender jamais poderia ser alcançado pela
prescrição.
O poderoso canal de TV, localizado em São Paulo e
comandado pelo destacado empresário-jornalista, uma verdadeira lenda, funcionou
por mais de 12 anos sem regularização alguma junto ao governo federal por falta
de fiscalização do Conselho Nacional de Telecomunicações de depois do
Departamento Nacional de Telecomunicações.
As artimanhas e simulações implementadas na “aquisição”
da TV Globo de São Paulo S/A, pelos seus controladores, mediante deliberações
societárias contrárias aos ditames legais e estatutários, como reconhecido pelo
Poder Judiciário, estão resumidas neste importante e corajoso trabalho, que
também transcreve importantes documentos e laudos periciais.
Boa leitura e nenhuma indignação, pois todas as
ilicitudes tardiamente descobertas já estão protegidas pelo manto da prescrição
e aos 673 acionistas fundadores da Rádio Televisão Paulista S/A, depois TV
Globo de São Paulo S/A, vinculada à holding Globo Comunicação e Participações
S/A, que tiveram suas ações transferidas para o empresário Roberto Marinho a
custo zero, ou melhor, Cr$1,00 (hum cruzeiro) por ação, em 30 de junho de 1976.
Não resta outro caminho, se não denunciar esse desrespeito à propriedade às
autoridades da Administração Federal e ao Congresso Nacional e, complementarmente,
se pertinente, à Comissão de Direitos Humanos da OEA, da ONU e à Corte
Internacional de Haia.
Disso encarregar-me-ei na condição de ex-deputado
estadual à Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo por cinco legislaturas
consecutivas e que, em 2002, trouxe ao conhecimento da população esse
verdadeiro atentado perpetrado contra direito fundamental desses acionistas e
respectivos herdeiros. Foram excluídos da TV Globo de São Paulo S/A por ato
assemblear impróprio, ilegal, transformando o responsável por essa deliberação
heterodoxa, o jornalista Roberto Marinho, no controlador absoluto da
organização e o que, é verdade, tomou, de fato, a governança corporativa mais
simples e centralizada. Nesse caso, os meios lícitos justificaram os fins nada
republicanos?
Confira, lendo “MANOBRA FANTÁSTICA” – Irregularidades e
trapalhadas na transferência do controle da TV Globo de São Paulo S/A, produção
baseada, exclusiva e criteriosamente, em autos de processos judiciais que já
entraram para a história.
A
derrota e a derrocada da justiça
Sendo impossível transcrever 275 páginas, cada uma mais
definitiva e conclusiva, uso frase do próprio advogado.
“Não há e não deve haver zonas cinzentas entre o lícito
e o ilícito no âmbito do Estado. Quanto maior o Poder do réu, maior sua
facilidade para esconder o ilícito. O decurso do tempo não convalida o que
nasce invalidado. Pois os atos jurídicos nulos e que atentam contra a
moralidade pública, são imprescritíveis”.
Só isso valeria pelos 50 anos do processo e os 50 anos
de omissão da justiça.
O
processo da Tribuna da Imprensa, na mente e no coração do grande advogado
Terminada a missão de trazer a público a falcatrua e a
omissão da Justiça em relação ao Império da Globo, tenho que escrever, contra a
vontade e sumariamente, a respeito da indenização da Tribuna da Imprensa. Por
dois motivos principais, já que é público e notório, que detesto e desprezo
escrever sobre o assunto.
1 – O que muita gente não sabe, foi a única exigência ou
consideração que fiz a Dario de Almeida Magalhães e Prudente de Moraes, neto,
quando me sugeriram processar a União, por causa das perseguições físicas,
financeiras, econômicas, publicitárias e de toda ordem.
Grandes
advogados, notáveis figuras
Estávamos no escritório do doutor Dario na rua Pedro
Lessa, (o primeiro negro a pertencer ao Supremo), ouvi e respondi
imediatamente: “Concordo com o processo, mas só se for contra os “presidentes”
Médici e Geisel”.
Os dois ao mesmo tempo, me abraçaram: “Puxa, esse será
um processo Histórico”.
Prudente já fora um dos meus advogados, junto com
Sobral Pinto, Adauto Cardoso e Prado Kelly, em 1963, antes do golpe, quando
publiquei uma circular sigilosa e confidencial do Ministro da Guerra.
E o Millôr, genial como sempre, escreveu: “Não quero
defender o Helio por ser meu irmão. Mas um jornalista que recebe circular
sigilosa e confidencial, assinada por um Ministro da Guerra, e não publica, é
melhor que abra um supermercado”.
A
importância de Luiz Nogueira
2 – O outro motivo que me levou a escrever sobre o
assunto, foi a paralisação do processo com a morte de Dario e de Prudente.
Durante mais ou menos 10 anos, Luiz Nogueira estudava o processo da indenização
da Tribuna, com uma “defesa” mais lenta do que a tradicional lentidão da
justiça.
Na dedicatória do livro, Luiz Nogueira traduz
publicamente o que me dizia pessoalmente, antes de receber um “substabelecimento”
para defender a Tribuna: “Ao jornalista Helio Fernandes, a quem acompanho desde
1964”, e vai em frente.
O processo começou a andar, com as restrições de todos
aqueles, CIVIS e MILITARES que se sentem e que se sentiram atingidos.
Se como no processo da Globo, não existe força, de
qualquer espécie, capaz de vencer a força do Poder. Militar, enquanto durou a
ditadura. Civis, depois da ditadura, derrubada pelo tempo. Protetora e
protegida pelos que serviram a ela, e agora pagam o que receberam, mesmo em
proteção post-mortem.
O
artigo de 1º de Dezembro de 2008 e o fim da Tribuna
Hoje se completam 5 anos e três meses, quando resolvi
encerrar as atividades da Tribuna da Imprensa. Por mais de 60 anos, repórter,
colunista, diretor de revistas e jornais esse é o artigo de que mais gosto.
Escrito, diagramado, feito o título, no vendaval de uma redação tensa e
tumultuada, no dia seguinte a repercussão foi impressionante. Se fosse citar as
personalidades de todos os setores, que me cumprimentaram, não acabaria nunca.
Citaram e repetiram o nome de Emílio Zola.
A
repercussão no Supremo
No mesmo dia, reunião dos Ministros. O relator,
inacreditavelmente estava com o processo “engavetado” há 42 meses. E nesse
período, relatara 46 outros processos que chegaram depois. Como foi citado e
condenado pessoalmente, logo se declarou “impedido”, entregou o processo. Nem devia
ter recebido, depois de dois notáveis Procuradores Gerais terem escrito na capa
do processo: “O recurso da União, é protelatório”.
O
plenário condena o relator
De forma inédita, “impedido” o relator era imprescindível
sortear outro. O Plenário indicou o decano para ser relator, por unanimidade.
Não demorou uma semana, também por unanimidade, o plenário aprovou o voto do
relator.
Que nas suas 17 laudas, resume: “O processo de
indenização da Tribuna da Imprensa transitou em julgado. A União tem que pagar
imediatamente a indenização ao jornal”.
A
eternidade da injustiça, o IMEDIATAMENTE que não se cumpre
Desdenharam até da interpretação das palavras. “Transitado
em julgado”, vale apenas em alguns casos. E “imediatamente”, só se o relator
fosse um professor da língua expoente como Sérgio Nogueira (nenhum parentesco
com o notável advogado) ou o também craquíssimo e acadêmico, Ivanildo Bechara.
Luiz
Nogueira continua acreditando e trabalhando
Não parou um dia sequer nos quase 10 anos de defesa da
Tribuna. E nos cinco decorridos depois de “transitado em julgado”, por decisão
do Supremo. Ainda semana passada, no dia 16, protestou junto à notável
desembargadora Federal, Salete Maccalóz. Desembargadora e Corregedora, que há tantos anos, escrevi que
devia estar no Supremo.
Textual: “Volto
a apelar para a elevada sensibilidade de V.Exa. para resolver mais esta pendência,
face às dificuldades vividas pela parte autora (a Tribuna da Imprensa), pelo
seu controlador, dezenas de jornalistas e suas famílias que aguardam a quitação
dessa indenização para receberem seus direitos”.
Última palavra
Como perito
da justiça, mesmo esquecendo o vazio da identidade no Brasil, posso e devo
dizer sumária mas sinceramente: Como profissional, Luiz Nogueira nasceu e viveu
como advogado histórico. Processado 37 vezes pela ditadura, preso, julgado e
absolvido pelo Supremo antes do golpe, tive sempre advogados do primeiro time.
Muitos já entraram
na História. Com lugar garantido, Luiz Nogueira.