Imprensa é oposição. O resto é armazém de secos e molhados."

(Millôr Fernandes)

quarta-feira, 10 de outubro de 2018

Meio ambiente. STJ: limites impostos pelo Código Florestal para construções próximas a APPs urbanas devem ser aplicados

Quarta, 10 de outubro de 2018
Do MPF
Decisão segue entendimento da Procuradoria-Geral da República
A Segunda Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) condenou um particular por dano ambiental causado por edificação em área de preservação permanente urbana com influência marítima. A decisão seguiu entendimento da Procuradoria-Geral da República (PGR), que apontou violação ao Código Florestal, considerando a preponderância de suas disposições em relação à Lei de Parcelamento do Solo Urbano.
O tema entrou em debate no julgamento dessa terça-feira (9), do Recurso Especial 1.518.490, no qual o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) questiona acórdão da 3ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF4). O tema envolve disposições conflitantes do Código Florestal e da legislação urbanística, referentes aos limites de áreas de preservação permanente, e se deu com base na discussão do antigo Código Florestal. Com a decisão, o acórdão recorrido foi reformado para determinar o respeito ao limite de 50 metros de área de preservação permanente, devendo particular promover a integral recomposição da Área de Preservação Permanente (APP).

No parecer, o subprocurador-geral da República Nicolao Dino destacou que o antigo Código Florestal (e o atual) determina o respeito das APPs também em zonas urbanas. Além disso, a Lei de Parcelamento do Solo Urbano, ao tratar das faixas não edificáveis às margens de águas correntes e dormentes em loteamentos, determina expressamente que sejam atendidas quaisquer exigências mais severas que existam em leis específicas, no caso, o Código Florestal.
Para o subprocurador-geral, “não se pode interpretar essas normas em descompasso com os parâmetros de proteção fixados de forma mais restritiva na norma geral veiculada pelo Código Florestal, devendo prevalecer aquela que oferecer o nível mais elevado de proteção ambiental”. Dino alertou que nunca deve ocorrer o contrário, sob pena de esvaziamento da finalidade diretiva das normas de caráter geral e, ainda, das obrigações assumidas pelo Brasil, por meio da União, no plano internacional, no tocante à adoção de níveis adequados de proteção ao meio ambiente.
Nicolao Dino assinalou que a redução do tamanho da Área de Preservação Permanente, com base na Lei de Parcelamento do Solo Urbano, em vez de aplicar a norma geral, traduz verdadeiro retrocesso em matéria de proteção ambiental, e mostra-se totalmente desconectada com o princípio da função socioambiental da propriedade, quanto ao que dispõe a Constituição Federal.
Voto do relator – O ministro Og Fernandes, relator do caso, destacou que preservação do meio ambiente integra o rol de direitos humanos, tendo em vista sua essencialidade para a sobrevivência da espécie. “Indubitavelmente, o desenvolvimento econômico deve ser obtido com o devido saneamento do planeta e a com administração inteligente dos recursos naturais. Caso contrário, o suposto desenvolvimento, obliteraria a possibilidade de sobrevivência da espécie humana. Logo, cuida-se de obter um desenvolvimento sustentável que respeite o ecossistema e proporcione um trato adequado, respeitoso para com o Planeta Terra”, comentou.
O ministro destacou que o instituto das áreas de preservação permanente tem objetivos expressos em relação à integridade dos ecossistemas e a qualidade do meio ambiente. Ele assinalou que o sistema normativo brasileiro já protegia claramente as áreas de preservação permanente desde o antigo Código Florestal. "Como se verifica, as APPs têm esse papel de abrigar a biodiversidade e promover a propagação da vida, assegurar a qualidade do solo e garantir o armazenamento de recurso hídrico em condições favoráveis de quantidade e qualidade”, apontou Og Fernandes.
Quanto ao mérito, o ministro argumentou que o ordenamento jurídico ambiental brasileiro foi concebido no intuito de proteger o meio ambiente contra danos de difícil reparação e que certas áreas devem ser guardadas do livre arbítrio de seus proprietários por suas peculiaridades. “O espaço geológico deve ser preservado de maneira que a propriedade da pessoa não danifique a propriedade da outra”, afirmou.
Para Og Fernandes, a Lei de Parcelamento Urbano impôs reforço normativo à proibição de construção às margens dos cursos de água, uma vez que indica mínima proteção à margem imediata, delegando à legislação específica a possibilidade de ampliar os limites de proteção. Segundo ele, aproteção marginal dos cursos de água, em toda sua extensão, tem importante papel de proteção contra o assoreamento.
Por fim, defendeu que mesmo sob a égide do domínio privado podem ser fixadas obrigações para que os proprietários assegurem a utilização de todos os aspectos ambientais, abstendo-se ou mesmo interrompendo qualquer prática ambientalmente insustentável que altere de forma irreversível o bem de uso comum, ou seja, o meio ambiente. “Não é possível assegurar o equilíbrio ecológico diminuindo a área de preservação insculpida na norma infraconstitucional mais protetiva. Logo, afastar na espécie a proteção do código florestal, implicaria notória violação do sistema normativo”, concluiu.