Imprensa é oposição. O resto é armazém de secos e molhados."

(Millôr Fernandes)

terça-feira, 13 de novembro de 2012

Arranca-rabo no Supremo

Terça, 13 de novembro de 2012
Por Ivan de Carvalho
A Constituição da República determina que o Supremo Tribunal Federal é composto por 11 integrantes. Mas, eventualmente e provisoriamente, pode ter menos. Atualmente, desde a aposentadoria compulsaria do ministro Cezar Peluso – que participou apenas do início do julgamento do Mensalão – o STF vem funcionando com dez ministros. Mas seu presidente, o ministro Carlos Ayres Brito, aposenta-se na sexta-feira. Na quinta-feira, o STF não fará sessão de julgamento do Mensalão nem para qualquer outro fim porque é feriado. Resultado: na melhor das hipóteses, após participar da sessão de ontem, Cayres participará somente de mais uma, amanhã.

            Ontem houve um surpreendente embate entre o ministro-relator Joaquim Barbosa e o ministro-revisor Ricardo Lewandowski. Após acabar o tribunal de dosar as penas dos integrantes do chamado “núcleo publicitário” do Mensalão, o ministro Barbosa, ao contrário do que noticiara a imprensa – de que ontem passariam a ser definidas as penas do núcleo financeiro – colocou em pauta a dosimetria das penas dos integrantes do núcleo político. Aí estão os dois réus de maior significado político de todo o processo – o ex-presidente nacional do PT e ex-ministro-chefe da Casa Civil da Presidência da República no primeiro mandato do ex-presidente Lula, José Dirceu; e o ex-presidente nacional do PT, José Genoíno, além do ex-tesoureiro do PT, Delúbio Soares.

            Imediatamente Lewandowski reagiu à troca da pauta que lera na imprensa, segundo ele mesmo disse. Como ficou evidente pela intervenção do presidente do STF, Ayres Brito, sem nenhuma razão. Mas houve um arranca-rabo no plenário, transmitido para o país pela TV Justiça, entre Barbosa e o relator. Lewandowski insurgia-se contra ser posta para decisão, ainda na sessão de ontem, a dosimetria das penas do núcleo político. No arremate, Lewandowski fez uma malcriação – levantou-se, por pouco deixando de derrubar a poltrona, e retirou-se do plenário. Ele, porém, nem podia votar na dosimetria das penas de Dirceu e Genoíno, porque os absolvera. Voltou após um intervalo, quando começaria a ser definida a pena de Delúbio, cuja condenação se dera também com o seu voto, o que o tornava apto a participar da dosimetria da pena deste réu.

            Mas o que tanto incomodou Lewandowsky, a quem Barbosa acusou de estar fazendo “obstrução”, incluindo haver lido, durante a sessão anterior, “um artigo de jornal”? Na opinião de Barbosa, o ministro-revisor estava claramente querendo retardar o julgamento. Mas com que finalidade? Nessa questão o ministro-relator não entrou. Porque não quis. Se ele não quis, muito menos quer este repórter.

            Mas vamos imaginar, só por exercício mental, a situação que está presente no STF neste momento. O STF está com dez integrantes porque Cezar Peluso, considerado um jurista de profundo conhecimento na área do Direito Penal e com fama de severidade nas condenações e na imposição de penas, aposentou-se pouco após o início do julgamento da Ação Penal 470, vulgo processo do Mensalão.

            Mas o seu sucessor na presidência, ministro Carlos Ayres Brito, revelou-se um juiz severo ao longo do processo, na fase das condenações. E iniciada a dosimetria, não mudou de linha. Ele considerou, como declarou no plenário, extremamente grave a trama do Mensalão, qualificando-a, literalmente, de “golpe” contra o regime democrático.

            Ora. Caso Dirceu, Genoíno e Delúbio não tivessem suas penas definidas ontem ou amanhã, o ministro-presidente Carlos Ayres Brito se aposentaria antes que isso acontecesse. O STF ficaria com apenas nove ministros (já que Peluso ainda não foi substituído). Nos casos de Dirceu e Genoíno, não participam da dosimetria Lewandowski e Dias Toffoli, porque os absolveram. Brito, que seria um voto inconveniente para Dirceu, Genoíno e Delúbio, teria se aposentado. Como já acontecera com Peluso.
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Este artigo foi publicado originariamente na Tribuna da Bahia desta terça.
Ivan de Carvalho é jornalista baiano.