Quinta, 15 de maio de 2014
Juíza
reconheceu que crimes são contra a humanidade e imprescritíveis
Fonte: MPF no Rio de Janeiro
A Justiça Federal aceitou na última terça-feira, 13 de
maio, a denúncia do Ministério Público Federal no Rio de Janeiro (MPF/RJ)
contra seis pessoas por envolvimento no atentado a bomba no Riocentro, em
Jacarepaguá, no dia 30 de abril de 1981, durante a realização de um show para
comemorar o Dia do Trabalhador. Com a decisão, pela primeira vez na história
uma denúncia criminal relativa ao atentado no Riocentro será processada e irá a
julgamento.
A partir da decisão, o coronel reformado Wilson Luiz
Chaves Machado, o ex-delegado Claudio Antonio Guerra e os generais reformados
Nilton de Albuquerque Cerqueira e Newton Araujo de Oliveira e Cruz respondem
pelos crimes de homicídio doloso tentado (duplamente qualificado por motivo
torpe e uso de explosivo), por associação criminosa armada e por transporte de
explosivo. Newton Cruz responde ainda pelo crime de favorecimento pessoal. Já o
general reformado Edson Sá Rocha responde por associação criminosa armada e o
major reformado Divany Carvalho Barros por fraude processual. (Processo nº
0017766-09.2014.4.02.5101)
A juíza da 6ª Vara Federal Criminal, Ana Paula Vieira de
Carvalho, considerou que os crimes denunciados pelo MPF configuram-se, em tese,
como crimes contra a humanidade e, por isso, imprescritíveis para todos os Estados,
segundo o direito internacional. Segundo a juíza, "os fatos narrados na
denúncia encontram-se, em tese, dentro deste contexto, na medida em que,
segundo a tese ministerial, a ser submetida ao contraditório, o atentado a
bomba descrito fazia parte de uma série de outros quarenta atentados a bomba
semelhantes ocorridos no período de um ano e meio, direcionados à população
civil, com o objetivo de retardar a reabertura política que naquele momento já
se desenhava. Não por acaso teriam sido escolhidas as festividades do dia 1º de
maio, no Riocentro, tidas como símbolo dos movimentos contrários à ditadura.
Também a referendar essa ideia está a suposta tentativa de atribuir o atentado
a movimentos de esquerda, narrada na inicial acusatória."
Ainda segundo a decisão da Justiça Federal, "passados
50 anos do golpe militar de 1964, já não se ignora mais que a prática de
tortura e homicídios contra dissidentes políticos naquele período fazia parte
de uma política de Estado, conhecida, desejada e coordenada pela mais alta
cúpula governamental."
Para os procuradores da República do Grupo de Trabalho
Justiça de Transição do MPF no Rio, "a decisão, além de reafirmar o
compromisso do Estado brasileiro com as normas do direito internacional,
reforça a compreensão disseminada na sociedade brasileira de que os crimes
cometidos na época da ditadura militar devem ser punidos. O Ministério Público
Federal tem renovada confiança de que o Judiciário condenará os culpados”.
Em sua decisão, atendendo a pedido do MPF, a Justiça
Federal determinou ao Exército Brasileiro que encaminhe as folhas de alterações
dos denunciados e das testemunhas arroladas no prazo máximo de 10 dias, sob
pena de ser expedido mandado de busca e apreensão.
Denúncia do MPF - Na denúncia feita à Justiça em
fevereiro desse ano, o MPF, através do Grupo de Trabalho Justiça de Transição,
apresentou novos documentos e testemunhas que permitiram a identificação de
várias pessoas envolvidas no atentado a bomba no Riocentro, revelaram diversos
codinomes de militares e civis e trouxeram elementos de prova novos. As
investigações do MPF duraram quase dois anos e envolveram a análise de 38
volumes de documentos. Foram tomados depoimentos de 42 testemunhas e
investigados, num total de 36 horas de gravação. Foram expedidos 86 intimações
e 79 ofícios requisitando informações, além de três pedidos de cooperação
internacional para França, Bélgica e Argélia. As investigações identificaram o
envolvimento dos seis denunciados, além de outros nove envolvidos que já faleceram.
De acordo com as investigações do MPF, os denunciados
planejaram minuciosamente o ataque desde de um ano antes até o dia do show,
tendo praticado o crime com a participação decisiva de outros militares já
falecidos. Para execução do atentado, a organização criminosa tinha um núcleo
de planejamento e um núcleo operacional (também denominado "Grupo
Secreto").
O MPF pede que Wilson Machado, Claudio Guerra e Nilton
Cerqueira sejam condenados a penas não inferiores a 36 anos de reclusão; Newton
Cruz a pena de pelo menos 36 anos e 6 meses de reclusão; Sá Rocha a pena não
inferior a 2 anos e 6 meses e Divany Barros a no mínimo 1 ano de detenção. O
MPF requer ainda que os denunciados sejam condenados à perda do cargo público,
com o cancelamento de aposentadoria, à perda de medalhas e condecorações
obtidas e a pagar indenização por dano moral coletivo no valor de R$ 500 mil, a
ser divido pelos denunciados.
Para acessar a íntegra da denúncia e da decisão
judicial, clique aqui