Imprensa é oposição. O resto é armazém de secos e molhados."

(Millôr Fernandes)

quinta-feira, 29 de dezembro de 2016

Janio Ferreira Soares: Auto de Natal no reino da Odebrecht e um Viva a Sergio Moro antes de 2016 acabar

Quinta, 29 de dezembro de 2016
Do Blog Bahia em Pauta

CRÔNICA

Auto de Natal no reino da Odebrecht

Janio Ferreira Soares*
Cena 1 – O Início. Narrador: “Nossa história começa em 1856, quando o jovem alemão Emil Odebrecht deixa o norte da Prússia e chega à região de Santa Catarina. Lá ele se casa com Bertha Bichels, que ao contrário de Maria não recebeu nenhum anjo profetizando o nascimento de seus 15 filhos, 77 netos e dezenas de bisnetos, entre eles Norberto Odebrecht, aquele que veio ao mundo com o destino traçado por betoneiras de grosso calibre.
Nascido em 1920 num Recife cortado de pontes e fontes coloniais, ainda criança Norbertinho deixaria a terra de Dora, rainha do frevo e do maracatu e se mudaria para Salvador, Bahia de São Salvador, a terra do branco mulato, a terra do preto doutor. E sob as bênçãos do Nosso Senhor do Bonfim (e de São Caymmi), em 1944 ele fundou uma empresa que logo aderiu ao é dando que se recebe que reina em Pindorama desde os espelhinhos aos índios, fato que gerou uma nova versão da Oração de São Francisco (entra um coral de executivos com maletas na mão e canta: ‘Governador, fazei de mim um instrumento de vossas licitações; onde houver obras lhe darei 10 milhões; se for hidroelétrica, 50 milhões; e se for Copa do Mundo chegaremos ao bilhão, pois futebol é o ópio da nação’)”.
Cena 2 – O Meio. Narrador: “E enquanto fortunas surgiam a reboque de rapinagens e políticos eram eleitos com dinheiro vadio, 116 anos após o início da saga odebrechtiana, uma jovem paranaense chamada Odete sonha com o Arcanjo Gabriel lhe dizendo que de seu ventre nascerá um enviado que um dia usará uma capa preta e será guiado pela força de sua espada flamejante para fazer valer a lei e a justiça na terra que nunca as teve. E assim, em 1972 veio ao mundo um varão de nome Moro, desde sempre protegido por anjos guerreiros da Capadócia para que seus inimigos tenham pés, mas não lhe alcancem e facas e espadas se quebrem sem o seu corpo tocar, e nem mesmo em pensamento eles possam lhe fazer o mal (todos cantam: ‘Moro é da Capadócia, salve, Moro!’)”.
Cena 3 – O Quase Fim. Narrador: “E munido com a paciência de Jó, passo a passo o enviado curitibano detona o mito de que algemas não combinam com Rolex e depois de orbitar por satélites de pouco facho, finalmente chega ao núcleo da estrela guia, aquela que há 72 anos brilha nos céus do Brasil atraindo Bitelos, Decrépitos e Angorás que, como Reis Magos ao contrário, chegavam sem ouro nem mirra e saíam cheios de dólares e de geniais apelidos inspirados nas suas feições e mungangas (nessa hora um coral de crianças encerra a apresentação cantando Que País É Esse?, enquanto num presépio vivo uma jararaca toda latanhada deseja boas-vindas a emplumados tucanos convenientemente pousados num poleiro todo sujo de Jucá)”. Bom Natal e, por favor, não excomungue o autor.

*Janio Ferreira Soares, cronista, é secretário de Cultura de Paulo Afonso, na beirada baiana do Rio São Francisco.