Sexta, 23 de dezembro de 2016
do site Outras Palavras
Por CAUÊ AMENI
Relatório da Oxfam revela
dívidas astronômicas, que, se pagas, assentariam 214 mil famílias; e
governo Temer quer anistiar setor
Por Cauê Seignemartin Ameni
O agronegócio leva nas costas, como alegam seus defensores, as contas do Estado brasileiro? Segundo o relatório Terrenos da desigualdade: terra, agricultura e desigualdade no Brasil rural,
publicado pela Oxfam, não. Dados da Procuradoria-Geral da Fazenda
Nacional mostram que 4.013 pessoas físicas e jurídicas detentoras de
terra devem R$ 906 bilhões, uma dívida maior que o PIB de 26 estados.
O montante é equivalente a metade do que todo o estado brasileiro arrecadou em 2015. Ou aproximadamente 22 petrolões.
Cada um dos 4.013 devedores tem dívidas acima de R$ 50 milhões.
Segundo dados do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra),
há um grupo ainda mais seleto de 729 proprietários que declararam
possuir 4.057 imóveis rurais, somando uma dívida de R$ 200 bilhões. As
terras pertencentes a esse grupo abrangem mais de 6,5 milhões de
hectares, segundo informações cadastradas no Sistema Nacional de
Cadastro Rural.
O Incra estima que com essas terras seria possível assentar 214.827
famílias – considerando o tamanho médio do lote de 30,58 ha/famílias
assentadas. Em outras palavras, seria possível atender, com as terras
dos maiores devedores do Estado brasileiro, o dobro das 120 mil famílias
que estavam acampadas demandando reforma agrária em 2015.
[Clique na imagem para ampliá-la]
Gráfico: Dívida Ativa da União X Reforma agrária
Em vez de cobrar os débitos, porém, o governo Temer editou em junho a
Medida Provisória nº 733, concedendo mais privilégios ao setor. Segundo
o relatório da Oxam, a MP permite que produtores rurais inscritos em
Dívida Ativa da União e com débitos originários das operações de
securitização e Programa Especial de Saneamento de Ativos liquidem o
saldo devedor com bônus entre 60% a 95%. Por exemplo, dívidas acima de
R$ 1 milhão devem ter descontos de 65%.
INJUSTIÇA FISCAL COM DESONERAÇÃO
O relatório aponta outra peculiaridade: a isenção de
diversos impostos. A Lei Kandir, editada em 1996, isentou o pagamento de
ICMS aos produtos primários e produtos industrializados e
semielaborados destinados à exportação. Segundo o relatório, essa
desoneração gera perdas em torno de R$ 22 bilhões por ano aos estados.
Com promessa de ressarcimento. Entretanto, só são ressarcidos 12% da
isenção. Em 2014, a bancada ruralista emplacou mais uma benesse fiscal
para o setor: a isenção de 9,25% na cobrança do PIS e Confins na venda
de soja para todos os fins comerciais.
O relatório alerta também para a ineficácia do Imposto sobre a
Propriedade Territorial Rural (ITR), principal tributo no meio rural
brasileiro. Apesar da progressividade do imposto em relação ao tamanho e
utilização do terreno, a cobrança é responsável por apenas 0,0887% da
carga tributária em 2014, porcentual médio constatado desde os anos
1990.
A injustiça fiscal do ITR fez com que os grandes e médios
proprietários passassem a pagar menos imposto por hectare, caindo a
média de R$ 1,59 por hectare em 2003 para R$ 1,52 em 2010, segundo os
dados das áreas totais cadastradas no SNCR.
Ligada à Universidade de Oxford, a Oxfam está presente em 94 países.
Para ler mais detalhes do relatório Terrenos da desigualdade: terra, agricultura e desigualdade no Brasil rural acesse aqui.