Segunda, 19 de dezembro de 2016
A manifestação foi dada na Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 5599, proposta pelo Partido Socialismo e Liberdade (Psol)
Do MPF
Para Janot, a proposta para reformar o ensino médio
não apresenta os requisitos de relevância e urgência para edição de
Medidas Provisória, além de ferir diversos princípios constitucionais
O procurador-geral da República, Rodrigo Janot,
enviou, nesta segunda-feira, 19 de dezembro, ao Supremo Tribunal
Federal (STF) parecer pela inconstitucionalidade da Medida Provisória
(MP) 746/2016, que busca a reforma da ensino médio. A manifestação foi
dada na Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 5599, proposta pelo
Partido Socialismo e Liberdade (Psol). Para Janot, medida
provisória, por seu próprio rito abreviado, não é instrumento adequado
para reformas estruturais em políticas publicas, menos ainda em esfera
crucial para o desenvolvimento do país, como é a educação.
Segundo o Psol, a norma viola os pressupostos
exigidos pela Constituição para edição de medidas provisórias. O partido
sustenta que seria cristalina a ausência do requisito constitucional da
urgência, além de desrespeitar o acesso amplo à educação e dificultar a
redução de desigualdades, ao promover verdadeiro retrocesso social.
O procurador-geral concordou com os argumentos.
Segundo Janot, há flagrante inobservância dos pressupostos de edição de
medida provisória como urgência e pressuposto de provisoriedade de seus
efeitos jurídicos. “Demonstração concreta de faltar urgência para edição
precipitada da norma está no fato de que, se aprovada pelo Congresso
Nacional ainda em 2016, a reforma só será adotada nas escolas em 2018”,
argumenta Janot.
O PGR destacou que a discussão da Base Nacional Comum
Curricular é complexa e vem sendo feita de maneira participativa há
anos, como deve ser, pois não se pode admitir que projeto dessa
magnitude e relevância seja precipitado. De acordo com ele, o próprio
Ministério da Educação (MEC) demonstra em seu site a complexidade do
projeto e a necessidade de participação democrática e amadurecimento.
“Não parece aceitável nem compatível com
os princípios constitucionais da finalidade, da eficiência e até da
razoabilidade que tal matéria, de forma abrupta, passe a ser objeto de
normas contidas em medida provisória, que atropelam do dia para a noite
esse esforço técnico e gerencial do próprio MEC, em diálogo com
numerosos especialistas e com a comunidade, ao longo de anos”, assinala.
O procurador-geral também aponta que a MP
746/2016 não atende ao requisito da provisoriedade. Ele explica que “o
desfazimento dos efeitos da concretização da reforma do ensino médio
desenhada pela MP 746/2016 conduziria a grave situação de insegurança
jurídica e a severos prejuízos pedagógicos e pessoais para toda a
comunidade”.
Para Janot, mudanças a serem implantadas
em sistema que envolve 28 redes públicas de ensino (União, estados e
Distrito Federal) e ampla rede privada precisam de amadurecimento,
estabilidade e segurança jurídica, que o instrumento da medida
provisória não pode conferir, por estar sujeito a alterações em curto
espaço de tempo pelo Congresso Nacional.
Inconstitucionalidade material – O PGR ainda destaca a inconstitucionalidade material da
Medida Provisória 746/2016. Para ele, a norma fere o direito
fundamental à educação como preparo para a cidadania e para o trabalho,
os princípios constitucionais da educação, em especial o da gestão
democrática, e as determinações da Constituição quanto à gestão
colaborativa dos sistemas de ensino e quanto ao plano nacional de
educação. O objetivo fundamental de redução das desigualdades regionais e
o princípio da igualdade são igualmente violados. Entre as
irregularidades apontadas no parecer, está a supressão indevida do
ensino de Artes e Educação Física. Segundo o procurador-geral, artes e
cultura são dimensões fundamentais para o pleno desenvolvimento humano, na medida em que aprimoram capacidades importantes como empatia, crítica, pensamento criativo e sensibilidade. “Desse
modo, a facultatividade prevista para o ensino da Arte viola,
frontalmente, o artigo 206, II, pois, para largas porções de alunos,
impedirá o exercício da liberdade de aprender 'o pensamento, a arte e o
saber'”, sustenta.
E sobre a Educação Física, o
PGR assinala que também é conteúdo essencial aos processos de
socialização e formação sadia do indivíduo. Ele explica que a medida
provisória, no que se refere a Educação Física, fere o comando expresso
do artigo 217 da Constituição, que torna “dever do Estado fomentar
praticas desportivas formais e não-formais”. “Ao dispensar os
estabelecimentos de ensino médio de oferecer a disciplina, por torná-la
facultativa, a norma atacada segue no sentido exatamente oposto do dever
constitucional de fomento da atividade desportiva”, comenta.
O parecer ainda aborda
outras irregularidades na proposta como a flexibilização na admissão de
profissionais de educação, a supressão do ensino noturno e os
itinerários formativos específicos.
Por fim, Janot comenta que,
sem debate nem amadurecimento, bons propósitos podem comprometer
seriamente todo o arcabouço legislativo relativo a educação. Segundo
ele, tudo isso é, obviamente, incompatível com a urgência das medidas
provisórias e esse requisito também influencia a tramitação do processo
legislativo, que, pela própria concepção dessa espécie legislativa, deve
ser expedita e encerrar-se em no máximo 120 dias. “Esse prazo é
inibidor de debates sérios, consistentes e aprofundados como os que o
tema exige, impede que se convoquem os atores relevantes para apresentar
suas perspectivas, experiências e objetivos. Compromete-se
inevitavelmente a própria tomada de decisão em assunto absolutamente
fundamental para o futuro do pais”, conclui.