Imprensa é oposição. O resto é armazém de secos e molhados."

(Millôr Fernandes)

segunda-feira, 8 de maio de 2017

PM destrói equipamentos de som de moradores em favela da zona norte do Rio

Segunda, 8 de maio de 2017
Da Ponte
Direitos Humanos, Justiça, Segurança Pública

Moradores comemoravam em uma pizzaria, na comunidade do Mandela, em Manguinhos, a vitória do Flamengo, na noite de ontem (7/5), quando policiais jogaram o blindado contra os equipamentos. É o quarto caso desde março

A bordo do Caveirão (veículo blindado da corporação), policiais militares destruíram equipamentos de som em uma pizzaria na favela do Mandela, no conjunto de Manguinhos, na zona norte do Rio de Janeiro, por volta das 18h30 deste domingo (7/5), quando moradores iam começar a comemorar a vitória do Flamengo no campeonato carioca de futebol. É o quarto caso de repressão cultural em favela pela PM utilizando o Caveirão em menos de dois meses.

Em vídeos recebidos pelo DefeZap, serviço que permite o envio de vídeos-denúncias de violações de direitos praticadas por agentes do Estado e encaminha as denúncias aos órgãos competentes, é possível ver o momento em que os PMs usam o Caveirão para derrubar os equipamentos.

Tudo o que havia tocado até aquele momento era o Hino do Flamengo. O evento, pago com uma “vaquinha” entre os comerciantes de uma pizzaria e uma churrascaria da comunidade, seria uma confraternização da torcida do Flamengo, no qual se apresentaria um grupo de pagode e haveria músicas de outros gêneros nos intervalos, como relata à Ponte o proprietário dos equipamentos destruídos pela PM.
Momento em que o caveirão da
PM arrasta os equipamentos de som
Foto: Reprodução
“Logo que terminou o jogo, eu toquei o Hino do Flamengo e o Caveirão veio, bateu nas caixas e caiu tudo. Eles não se contentaram com isso, deram a volta, entraram de novo e acabaram de quebrar o resto”, conta o proprietário dos equipamentos de som, que não será identificado para sua segurança. “Me causou um grande prejuízo, de tweeter, cornetas, alto-falantes, caixas de som, cabos etc. Fora o constrangimento, de você estar ali para se divertir, pra poder levar seu ganha pão pra casa, e ver seu material todo destruído”, lamenta ele, que teve um prejuízo de cerca de R$ 8 mil.

Proprietário de equipamentos e produtor de eventos há 25 anos, ele afirma que esse tipo de repressão violenta por parte da PM é recorrente. “Infelizmente isso acontece não é de hoje. Há décadas, a gente que é dono de equipe de som sempre sofre esse tipo de represália da parte da Polícia Militar. Infelizmente não foi a última vez, outras vezes acontecerão até que alguém se posicione contra isso. É dano ao patrimônio. E não dá em nada. Eles estão sempre quebrando, achando que a gente faz baile para traficante”, diz.

Leia também:
Polícia reprime com Caveirão cultura da favela no Rio de Janeiro Cultura do Funk está sendo exterminada com a ponta do fuzil, diz Mc Leonardo


Casos foram levados ao Ministério Público e à Secretaria de Segurança do Estado

A equipe do DefeZap encaminhou, já nesta segunda-feira (8/5), os vídeos-denúncias para o MPRJ (Ministério Público) e para a Seseg (Secretaria de Segurança Pública) do Estado do Rio de Janeiro, para que o caso seja investigado e os policiais sejam responsabilizados.
Equipamentos que foram atingidos
pelo carro da PM do RJ 
Foto: Reprodução
“Esse tipo de ocorrência, que não é pontual, acontece em várias partes da cidade e é uma prática comum da Polícia Militar do Rio de Janeiro, precisa acabar. Então, que essas investigações integradas com os outros casos”, afirma o advogado e integrante do DefeZap, Guilherme Pimentel. “Nós conseguimos abrir procedimentos de investigação e apuração no Ministério Público em três outros casos, esse já é o quarto, e em todos os casos nós não apenas comunicamos o fato como lembramos os procedimentos abertos anteriormente, porque nós queremos que essas investigações sejam feitas de forma integrada. Não são fatos isolados, é uma prática no estado, em diferentes batalhões e policiais, que utilizam o blindado para esse tipo de abuso”, completa.

Ele critica o fato de não se tratar de uma ação policial de combate à criminalidade, uma vez que as situações nas quais PMs agiram da mesma forma não representavam atividades criminosas, mas eventos culturais de funk, pagode e, no caso de ontem, uma confraternização em uma pizzaria.

Outro lado
Questionado pela reportagem sobre o fato, o Comando de Polícia Pacificadora, por meio de sua assessoria de imprensa, limitou-se a afirmar que, segundo o comando da UPP (Unidade de Polícia Pacificadora) Arará / Mandela, “no local citado estava sendo realizado um baile sem autorização, sendo necessária a intervenção policial. Cabe dizer que um policial da UPP havia sido baleado nesse mesmo local horas antes, em confronto com criminosos”. Nada foi dito sobre a prática da PM de destruir equipamentos com o veículo blindado.