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(Millôr Fernandes)

sábado, 25 de junho de 2022

COMO SERÃO ELEITOS OS PARLAMENTARES EM OUTUBRO DE 2022 – PARTE VI

Sábado, 25 de junho de 2022
Aldemario  Araujo Castro
Advogado
Mestre em Direito
Procurador da Fazenda Nacional
Brasília, 25 de junho de 2022

No primeiro escrito desta série, denominado COMO SERÃO ELEITOS OS PARLAMENTARES EM OUTUBRO DE 2022 – PARTE I, explorei alguns dos procedimentos utilizados nas campanhas eleitorais baseadas no “voto fisiológico”. Mencionei: a) a contratação interesseira de cabos eleitorais e b) a compra de lotes de votos controlados por certas lideranças comunitárias, religiosas e afins. Destaquei, ainda, que paralelamente ao “fisiologismo pesado” (ou hard) convivem fisiologismos “mais leves” (ou soft).

No segundo texto desta série, denominado COMO SERÃO ELEITOS OS PARLAMENTARES EM OUTUBRO DE 2022 – PARTE II, foram analisados três tipos de fisiologismos mais leves e muito comuns no universo das campanhas eleitorais nesta quadra da história do Brasil. São eles: a) os voltados para a formação de grupos políticos; b) os criados a partir da distribuição enviesada de recursos decorrentes de emendas parlamentares e c) aqueles constituídos por forte inspiração corporativa ou institucional, em especial a religiosa.

O terceiro escrito desta série, denominado COMO SERÃO ELEITOS OS PARLAMENTARES EM OUTUBRO DE 2022 – PARTE III, abordou o “voto de opinião”. Anotou-se que, nesse campo, a preferência eleitoral não está baseada na perspectiva de obtenção de vantagens mensuráveis em pecúnia. Em geral, o eleitor busca identificação com propostas programáticas e verifica a trajetória de vida do candidato nos planos profissionais e políticos, notadamente a ocupação de funções públicas (eletivas ou não).

No quarto texto desta série, denominado COMO SERÃO ELEITOS OS PARLAMENTARES EM OUTUBRO DE 2022 – PARTE IV, foram destacadas, no campo do “voto de opinião”, a apresentação de propostas excessivamente genéricas ou proposições típicas da implementação de políticas públicas formatadas e conduzidas pelo Poder Executivo. Ressaltou-se a necessidade de que o candidato (do “voto de opinião”) formule ou apresente um programa de atuação parlamentar mais detalhado ou específico, em linha com a agremiação partidária a que pertença, para que se possa identificar os critérios e valores a serem utilizados no momento do voto ou da decisão no âmbito do exercício do mandato.

No quinto escrito desta série, denominado COMO SERÃO ELEITOS OS PARLAMENTARES EM OUTUBRO DE 2022 – PARTE V, foi registrado que a construção de uma sociedade livre, justa e sustentável exige que o “voto fisiológico” seja minoritário e, no limite, alcance a posição de ser meramente residual. Para tanto, três caminhos foram recusados, inclusive por ineficiência: a) a atuação de mitos, super-heróis, salvadores da Pátria, escolhidos por Deus ou coisa parecida; b) o recurso a golpes ou soluções autoritárias e c) a confiança platônica nas instituições estatais para operar mudanças profundas na realidade social. Apontou-se como único caminho aceitável, embora demorado e trabalhoso, aquele pautado por altas e energéticas doses de conscientização, organização e mobilização políticas, com a utilização de ferramentas educacionais e democratização econômica dos meios de comunicação.

Importa, agora, identificar os principais traços definidores dos critérios para consagração dos parlamentares vitoriosos no pleito eleitoral de outubro de 2022. São dois conjuntos básicos de considerações: a) o financiamento das campanhas e b) como o voto do eleitor será contabilizado.

Em matéria de financiamento, o fundo eleitoral distribuirá recursos com base no tamanho das bancadas parlamentares federais. Para as eleições de 2022 serão utilizados 4,9 bilhões de reais. Percebe-se um excesso considerável para uma boa parte das agremiações políticas contempladas (União Brasil: 782,5 milhões; PT: 503,4 milhões; MDB: 363,2 milhões; PSD: 349,4 milhões; PP: 344,8 milhões, entre outras). O financiamento das campanhas eleitorais deve ser público para evitar a influência indevida do poder econômico, notadamente das empresas de maior porte. Entretanto, o custo das campanhas deveria ser modesto em respeito ao eleitor e a situação financeira do País. Ademais, não há necessidade de campanhas pirotécnicas ou com volumes altos de recursos. Essa situação se presta a todo tipo de malversação, passando por candidaturas meramente formais (para amealhar os recursos financeiros) até as despesas fictícias que escondem desvio das verbas eleitorais.

A verificação dos eleitos é uma questão que envolve várias dificuldades e sensibilidades. Não se utiliza o sistema majoritário (“quem tem mais votos leva”), aplicável para os cargos de Presidente da República, Senadores, Governadores e Prefeitos. E não deve ser usado mesmo. Assim como não é utilizado nas maiores democracias representativas do mundo. O voto para o parlamento não deve ser centrado na pessoa do candidato (“voto personalista”). O chamado sistema proporcional, para escolha de parlamentares, é estruturado para eleger (escolher) visões, projetos e programas voltados para interferir na realidade socioeconômica subjacente.

Assim, é preciso apurar se o partido ou federação atingiu o quociente eleitoral (número de votos válidos dividido pelo número de vagas disponíveis) e quantas vezes atingiu. Por essa via se sabe quantos parlamentares cada partido ou federação ocupará no Poder Legislativo. Oportuno lembrar que não existe mais coligações nas eleições proporcionais. Trata-se de avanço importante para o sentido e a lógica do sistema proporcional e fortalecimento das agremiações partidárias. Evita-se, com essa limitação, que o partido de esquerda A se coligue com o partido de direita B e o eleitor de candidato do partido A termine ajudando a eleger alguém do partido B. Também deve ser registrado que a federação partidária, uma novidade no cenário eleitoral brasileiro não se constitui numa coligação disfarçada. A convivência política por vários anos com a elaboração de programa e direção comuns aproxima semelhantes, não antagônicos.

Voltando a apuração dos eleitos, os mais votados em cada federação ou partido serão vitoriosos segundo o número de vagas conquistadas. Deve ser considerado que o candidato para ser eleito precisa obter pelo menos 10% do quociente eleitoral. Evita-se, por conseguinte, a eleição de alguém com pouquíssimos votos por conta de um “puxador” (um artista, um atleta, uma celebridade ou político muito conhecido). Anote-se que um candidato participa, a rigor, de duas disputas. Ele concorre contra os postulantes de todas os outros partidos e federações e busca, dentro de seu partido ou federação, estar entre os mais votados para ficar com a vaga ou as vagas definidas pelo alcance do quociente eleitoral.

Subsiste o problema dos restos. Essas sobras são frações do quociente eleitoral. Nesse caso, temos uma matemática mais delicada de apuração dos ocupantes das vagas. Em 2022, somente poderão disputas as sobras os partidos ou federações que alcancem no mínimo 80% do quociente eleitoral. Lembrando, ainda, que nesse cenário da contabilização dos restos, somente estará apto o candidato que obtiver uma votação superior a 20% do quociente eleitoral.

Para uma visão mais detalhada da mecânica do sistema proporcional nas eleições de 2022, sobretudo as regras de distribuição das sobras, sugere-se a leitura do artigo “Nova regra complica distribuição de vagas de deputados”, de Jairo Nicolau, disponível no site “poder360.com.br”.

Esse panorama sugere importantes mudanças a serem operadas numa eventual reforma politica. As principais medidas a serem consideradas são: a) estabelecer níveis razoáveis (modestos) e mais igualitários para os valores do fundo eleitoral; b) definir padrões espartanos para os gastos de campanha; c) dar adequado e mais generoso tratamento às minorias na apropriação dos restos eleitorais; d) por fim a hipocrisia das pré-campanhas, admitindo que o eleitor tem condições de discernir adequadamente acerca dos candidatos e seus projetos; e) adotar mecanismos de revogação de mandatos (recall); f) contemplar mecanismos de melhoria da representatividade dos eleitos a partir de experiências envolvendo espaços coletivos de deliberação, horizontalidade e organização em rede; g) ampliação da participação e presença parlamentar das mulheres, negros e indígenas e h) mecanismos de fortalecimento dos partidos, inclusive com normas mais rígidas de fidelidade. Nesse último ponto, sustento a ideia de voto somente nos partidos no primeiro turno e formação da lista dos eleitos, com votos nos candidatos, no segundo turno.

Espero que o atento leitor dessa série de seis textos tenha obtido dados e informações relevantes para a formação de sua convicção no singular momento de realização de suas escolhas, em outubro de 2022, para o preenchimento de vagas nos Parlamentos brasileiros.

Caro eleitor, preste atenção, por favor, em relação aos candidatos: a) na trajetória pessoal, profissional e política; b) na forma de fazer política e, especialmente a campanha eleitoral; c) nas propostas e compromissos apresentados e d) sobretudo, nos interesses socioeconômicos defendidos ou representados (em que “lado” está o postulante).

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O Blog Gama Livre coloca adiante os links para acessar os 5 primeiros artigos da série COMO SERÃO ELEITOS OS PARLAMENTARES EM OUTUBRO DE 2022