Imprensa é oposição. O resto é armazém de secos e molhados."

(Millôr Fernandes)

quinta-feira, 3 de setembro de 2009

As opções de Protógenes

Por Ivan de Carvalho                                  
     
O delegado da Polícia Federal Protógenes Queiroz, empunhando a bandeira do combate à corrupção, integra, neste momento, a extremamente escassa categoria dos heróis nacionais por sua coragem e caráter pessoais, somados a duas circunstâncias:
1. A espetacular ação contra o banqueiro Daniel Dantas – já por causa disto com uma condenação judicial em primeira instância –, o mega-especulador Naji Nahas e o ex-prefeito de São Paulo Celso Pita, todos atualmente em liberdade, mas aos quais o delegado Protógenes impôs algemas ao cumprir o mandado de prisão resultante das investigações que presidira.
O episódio levou o Supremo Tribunal Federal a regular um assunto polêmico, o uso de algemas na efetuação de prisões, decisão que contribui para um aperfeiçoamento no sistema jurídico e na ação policial, pois todos são inocentes até serem julgados culpados e não devem ser expostos a humilhação pública desnecessariamente, mas somente quando reagirem à prisão ou existirem fundadas razões de risco para policiais, outras pessoas ou para o próprio preso em caso de não serem usadas algemas.
A espetaculosidade criticada pelo STF no uso de algemas esteve presente (com algemas e TV) em todo o desfecho da Operação Satiagraha, a obra-prima do delegado Protógenes Queiroz. Ele seguiu a prática que vinha sendo adotada pela Polícia Federal em outros casos, e, embora não se tratando ela de uma boa prática, o delegado Protógenes foi indireta e involuntariamente responsável por uma parte da decisão do STF, portanto, co-responsável involuntário por uma melhoria normativa das práticas relacionadas ao uso de algemas. E ainda, por conta do arranca-rabo das algemas, ganhou simpatia dos que acham que este uso deve ser uma regra, sob quaisquer circunstâncias, especialmente quando feito contra suspeitos de crimes do “colarinho branco”.
2. Se a Operação Satiagraha e até o modo midiático que envolveu a prisão de seus principais alvos foi a primeira das duas circunstâncias responsáveis pela elevação de Protógenes à categoria de herói nacional (temporário, tudo indica, mas só o futuro dirá), a outra foi a reação do governo Lula e do presidente do STF e do Conselho Nacional de Justiça, ministro Gilmar Mendes, à ação de Protógenes e do juiz De Sanctis, que por duas vezes expediu mandado de prisão contra Daniel Dantas – a segunda, depois de uma liminar do próprio Gilmar Mendes mandar soltar o banqueiro.
A reação do presidente do STF (não discuto nem questiono aqui o seu mérito) contribuiu de forma importante para ampliar a projeção do delegado Protógenes na opinião pública. Essa obra de marketing político a favor de Protógenes sem que ele a encomendasse ou desejasse foi reforçada extraordinariamente pelo governo Lula, ao qual está subordinada a Polícia Federal, órgão vinculado ao Ministério da Justiça.
Ministério comandado por um petista de proa, até ex-presidente do PT, o ministro Tarso Genro, duas vezes prefeito de Porto Alegre e uma vez candidato a governador do Rio Grande do Sul. A mesma pessoa que apressadamente entregou ao regime totalitário de Fidel Castro os dois pugilistas cubanos que fugiram da delegação de seu país nos Jogos Panamericanos, no Rio de Janeiro – reeditando, suavizada, mas moralmente equivalente, a atitude de Filinto Müller, que na ditadura do Estado Novo comandada por Getúlio Vargas entregou Olga Benário Prestes ao governo nazista de Hitler e à morte certa. Os dois pugilistas não morreram, já fugiram de novo, graças a Deus.
Entendo que Protógenes haja recusado o PSOL e o PV, por – eu suponho – não ter visto nestes partidos um ideário atraente, mas dominação por preocupações eleitorais. O que não entendo é que, depois de todo esse histórico de sua atuação relacionada com a Operação Satiagraha, de seu afastamento da presidência do inquérito e de qualquer participação na investigação, um chega-prá-lá até brutal, ele, Protógenes, haja encontrado motivo para querer ingressar em um partido que apoiasse Lula. Ora, não é Lula quem decide quem manda no Ministério da Justiça e na Polícia Federal? Quanto à opção do delegado Protógenes pelo PC do B, paciência. O delegado é tecnicamente muito competente, mas ele mesmo é quem diz que “é caminhando que se aprende a caminhar”. Pois então que caminhe, pois tem muito a aprender ou, melhor dizendo, a compreender.
Este artigo foi originalmente publicado no jornal Tribuna da Baha desta quinta-feira.
Ivan de Carvalho é jornalista baiano