Quarta, 8 de dezembro de 2010
Por Ivan de Carvalho
A avaliação de um amplo e crescente “aparelhamento” do Estado brasileiro, principalmente pelo PT, mas não exclusivamente, durante os dois mandatos do presidente Lula, tem sido feita com intensidade semelhante tanto por políticos da oposição quanto por analistas independentes, incluindo aí setores da mídia.
Durante a campanha eleitoral, a coligação que sustentava a principal candidatura de oposição, liderada pelo PSDB, insistiu em denunciar esse “aparelhamento” numerosas vezes.
Em uma delas, o candidato a presidente José Serra lembrou que, quando era ministro da Saúde, no segundo governo de FHC, o tempo médio para um laboratório farmacêutico obter a autorização da Anvisa – Agência Nacional de Vigilância Sanitária – para produzir um medicamento genérico era de seis meses.
Agora – disse José Serra – o tempo para se obter autorização para a produção de genéricos havia sido dilatado. Podia-se conseguir a autorização da Anvisa em 12 a 18 meses. O tempo de espera, frisou o então candidato e ex-ministro da Saúde, duplicara ou mesmo triplicara.
Segundo Serra, isso estava não só retardando a oferta de genéricos (mais baratos que os medicamentos de marca e os similares) para o mercado consumidor como desestimulando planos de laboratórios para a produção de novos medicamentos genéricos. Em síntese: uma trava para os genéricos.
Eu estava ouvindo o ataque do candidato e a crítica do ex-ministro, como parte de sua campanha presidencial, e imaginei que ele estava atribuindo ao “aparelhamento” da Anvisa a responsabilidade por uma gestão incompetente, tecnicamente despreparada, o que poderia resultar em um retardamento nos trâmites dos processos de autorização.
Infelizmente, segundo Serra, o buraco estava mais embaixo. O que eu imaginara talvez até pudesse concorrer para retardar os processos, que incluem testes destinados a assegurar a chamada bioequivalência entre o genérico e o medicamento original. Mas Serra deu outra explicação: “Criam dificuldades para vender facilidades”. Conclusão ou verificação dele, mas que não pode ser ignorada.
Agora, no bojo das negociações sobre a composição do futuro governo de Dilma Rousseff, com o Ministério ainda não fechado, mas já delineado, as agências reguladoras e fiscalizadoras são uma das bolas da vez. Na terça-feira, o Diário Oficial da União publicou ato do presidente Lula, pelo qual retira a indicação do médico Eduardo Costa, diretor do Instituto Tecnológico em Fármacos da Fundação Oswaldo Cruz e que tinha o apoio do ministro da Saúde, José Gomes Temporão.
A retirada ocorreu na véspera da data marcada para a sabatina do médico na Comissão de Assuntos Sociais do Senado (a aprovação do Senado é necessária). A indicação de Eduardo Costa foi anunciada em abril – ele iria substituir Agnello Queiroz, do PT, que deixava o posto para concorrer ao governo do Distrito Federal.
Um lobby de indústrias farmacêuticas multinacionais, de petistas e do PMDB – que está cobiçando o comando da Anvisa. O lobby incluiu também o Sindicato Nacional dos Servidores das Agências Nacionais de Regulação. Isto porque, como lembrou em nota o próprio sindicato, Eduardo Costa afirmara que a Anvisa é burocrática, lenta e pouco eficaz.
O líder do governo no Senado, Romero Jucá, do PMDB, segundo os bastidores do Senado, teria garantido ao Palácio do Planalto que, se fosse sabatinado, o médico seria reprovado (sua indicação seria rejeitada pela comissão). Lula resolveu não arriscar – quando se dispunha a fazer uma boa escolha, desistiu. Bem, a Anvisa é o órgão que, entre outras coisas, aprova e fiscaliza medicamentos e alimentos. Nada importante, exceto para quem usa uns ou outros.
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Este artigo foi publicado originalmente da “Tribuna da Bahia” desta quinta.
Ivan de Carvalho é jornalista baiano.
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Este artigo foi publicado originalmente da “Tribuna da Bahia” desta quinta.
Ivan de Carvalho é jornalista baiano.