Imprensa é oposição. O resto é armazém de secos e molhados."

(Millôr Fernandes)

sexta-feira, 9 de setembro de 2011

O Frankenstein do governo Agnelo

Sexta, 9 de setembro de 2011
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Não estou querendo falar aqui sobre a aliança (ou algema?) partidária que dá sustentação ao governo Agnelo/Filippelli, aliança que, por si só, já representa um verdadeiro Frankenstein. É de outro Frankenstein que quero abordar. Na história do livro, o monstro foi construído por um estudante de ciências naturais. Mas poderia muito bem  ser um médico. E até um aprendiz de feiticeiro.

No DF o Frankenstein tem um pouco de cada louco político que o construiu. Esse monstro sobre o qual vou falar teve a sua gestação iniciada no governo daquele que foi apeado do poder e depois preso por um tempinho (60 dias), ou seja, Roberto Arruda, aquele de triste memória para o contribuinte. Mas geralmente todo monstro leva o DNA de várias pessoas. Levou, assim, também, o de Rogério Rosso, o governador-tampão de 2010. Como o monstro é um dos piores que se tenha notícia aqui pela capital do país, também recebeu o DNA do governo do doutor Agnelo Queiroz, ajudado para isso, pelo aprendiz de feiticeiro Geraldo Magela.

Estou falando do PDOT, o monstro que ameaça destruir Brasília. Ele é o Plano Diretor de Ordenamento Territorial. Gerado em laboratório que mais parece de especuladores imobiliários, teve também a contribuição genética de tradicionais invasores de áreas públicas do DF, dentre os quais se encontram presidentes —melhor seria se chamados de “donos”— de algumas “cooperativas” de moradias.

Em 2010, já com todas as deformidades causadas pela sua construção, o monstro foi encaminhado à Câmara Legislativa do DF, como determina a lei. A Casa, chamada por alguns de a “Casa dos Horrores”, conseguiu deformar ainda mais o monstro. Mexeu aqui, buliu ali, cutucou acolá, acrescentou mais adiante, cortou mais embaixo. Fez misérias. Entrou um Frankenstein horroroso e do outro lado saiu um pior ainda.

O monstro queria engolir as áreas verdes de Brasília, destruir áreas de proteção ambiental, deformar o patrimônio urbanístico do DF, fazer misérias com o patrimônio do povo.

Mas o Ministério Público do Distrito Federal (MPDF) monitorava os passos do monstro. Acabado em seus detalhes na CLDF, isso ainda no ano de 2010, estava o Frankenstein pronto para tocar o horror na cidade. Felizmente sofreu o combate do MPDF, que para isso recorreu ao Tribunal de Justiça do Distrito Federal (TJDF), alegando a inconstitucionalidade da “coisa”. O TJDF, infelizmente, não acolheu integralmente o pedido do MPDF, mas declarou inconstitucionais 60 dispositivos da lei que aprovou o Plano Diretor do Distrito Federal (PDOT). Dos males, o menor. E assim mesmo o MPDF recorreu ao Supremo Tribunal Federal (STF) para tentar eliminar o monstro, não apenas as partes amputadas pelo TJDF. O processo ainda não foi julgado na suprema corte.

O PDOT legalmente só pode ser elaborado de dez em dez anos. Revisado fora desse tempo somente se houver relevante interesse público e social. Herdando o monstro dos governos de Arruda e Rosso (e da CLDF, claro), o doutor Agnelo acolheu como sua aquela criatura, determinando uma revisão. Um dos seus auxiliares nessa função é o secretário de Habitação do DF, o deputado federal Geraldo Magela.

E o monstro ressurgiu do laboratório do atual governo pior do que entrou. Apesar das recomendações do Ministério Público do DF para que não constasse do novo projeto do PDOT itens já declarados inconstitucionais pelo TJDF, o governo do doutor Agnelo fez reinserir na proposta do PDOT itens inconstitucionais. É verdade que o governo atual tentou até camuflar a coisa.

Veja-se um exemplo. Quem lê o texto principal da proposta do PDOT que foi encaminhado por Agnelo à CLDF é induzido ao engano de que a área de proteção ambiental do Catetinho ficou de fora da destruição pela nova proposta. Acredita, assim, que por ter sido um dos itens declarado inconstitucional pelo TJDF, o governo do DF havia desistido de criar a tal “Cidade do Catetinho”. Tentando dissimular o absurdo que é a ocupação urbana dessa área, o governo, malandramente, retirou do texto principal. Mas deixou incluído nos anexos e nos mapas. Esperto, não, esses criadores de monstros?


Aqui vale um registro. A “Cidade do Catetinho” é um velho sonho de Geraldo Magela, desde os tempos em que era deputado distrital, e depois secretário de Habitação do governo Cristovam Buarque.

O monstro é um destruidor do meio ambiente.

O monstro (o PDOT, claro), assim, ainda não desistiu de comer a área de proteção ambiental conhecida como Catetinho, localizada entre a cidade do Gama e o velho palácio de madeira em que Juscelino se hospedava quando visitava as obras de construção da nova capital.

Outra recomendação do MPDF ao governo Agnelo foi que não incluísse no projeto do PDOT itens que não constavam na proposta encaminhada à CLDF em 2010, pois não se tratava da elaboração de um novo PDOT, mas tão somente na adequação do projeto anterior às decisões do TJDF.

O MPDF foi claro em suas recomendações. Reinserir itens inconstitucionais ou novos itens dispondo sobre coisa que não havia no projeto do PDOT de 2010 levaria a uma nova ação de inconstitucionalidade na Justiça. E foram muitos esses itens novos. Quase uma centena os itens “emprenhados” no novo projeto de PDOT.

Um exemplo de itens que não constavam no projeto anterior do PDOT e que Agnelo incluiu na proposta recentemente encaminhada à CLDF, e se mantido, sofrerá o combate por uma ação direta de inconstitucionalidade, é o que pretende regularizar as áreas intersticiais entre os conjuntos de casas das quadras residenciais do Gama, Ceilândia e Brazlâdia. Os chamados becos, mas que não são becos, são passagens e áreas verdes.

O TJDF já declarou a inconstitucionalidade das leis que tentavam usurpar do patrimônio do povo, e doar a alguns militares da PM e dos Bombeiros, as referidas áreas verdes, essas passagens de pedestres tão úteis à população. No caso das áreas verdes do Gama há inclusive também a decisão em Ação Popular movida por cidadãos da cidade. A sentença determina que as áreas voltem a ser de uso comum do povo.

A quase centena de itens claramente inconstitucionais tornaria impossível a aprovação do PDOT como veio do governador Agnelo para a CLDF. Em razão disso é que o governador se viu pressionado e retirou o PDOT da CLDF na última sexta-feira (2/9). Deverá fazer muitas mudanças para tornar o projeto de lei mais palatável aos distritais. Mas continua o grande risco de se encontrar novamente pela Câmara Legislativa do Distrito Federal um Frankenstein pior ainda.

É necessário ficar atento. Com monstros não se brinca.