Quarta, 5 de setembro de 2012
Por
Ivan de Carvalho

Aliás,
como tantos outros baianos, eu, na minha atividade de jornalista, conheci
suficientemente bem Jorge Hage, tendo com ele contato frequente, por um
período, diariamente, quando ele vivia aqui pela Bahia, como prefeito de
Salvador (por dois anos), deputado estadual e deputado federal. Um home público
para cidadão nenhum botar defeito.
A
Folha de S. Paulo publicou ontem um
artigo de Hage, reproduzido no blog Bahia
em Pauta, graças à sensibilidade jornalística do editor Vitor Hugo Soares.
“A Lei de Acesso à Informação pegou”, diz o título do artigo. E é verdade. O
autor dá exemplos e estatísticas que demonstram isso. E contesta o que chama de
lugar-comum, segundo o qual as leis não mudam nada. Sugere que isto é apenas
uma meia-verdade. E que a verdade completa seria a de que elas mudam, sim,
quando nascem de “um anseio real da sociedade” e encontram “da parte do poder
público, efetiva disposição” para implementá-las. Isso, diz o artigo, aconteceu
com a Lei de Acesso à Informação.
Repito
que é verdade. E também a reconheço na afirmação de que “vem produzindo efeitos
para além dos que decorrem de seu estrito cumprimento”, gerando a “divulgação
espontânea” de informações importantes para a sociedade. Mas isto não significa
que não existam lacunas. Vou dar um exemplo.
O
coronel reformado da Aeronáutica Uyrangê Hollanda foi encontrado morto em sua
casa dois meses depois de a revista UFO publicar uma longa entrevista exclusiva
sua, concedida em 1997, vinte anos após os fatos, na qual relatava coisas da
Operação Prato, que comandou na Amazônia quando ainda era capitão. Ele fora com
um grupo de duas dezenas de militares ou pouco mais, em missão oficial da
Aeronáutica realizada em 1977 e 1978, investigar aparições de UFOs que atacavam
pessoas principalmente no município de Colares, além de outros, vizinhos, todos
no Pará.
A
missão produziu 1.200 páginas de relatórios, 500 fotografias e 16 minutos de
filmagens em 8 milímetros. De todo esse material, estão no Arquivo Nacional,
liberadas para consultas, apenas 200 páginas de relatórios e 100 fotografias.
Das filmagens, nem um segundo. Talvez, se questionado sobre isso, com base na
Lei de Acesso à Informação, o governo diga que não há mais nada, que tudo que
havia foi disponibilizado (o coronel, convenientemente ou coincidentemente,
morreu logo depois da entrevista). Ou talvez, se for sincero, o governo diga
que o material todo não pode ser revelado, mesmo 34 anos após haver sido
produzido.
Das
duas respostas, o governo dará uma. Mas o material integral, não dará. Eu
apostaria sem medo de perder.
Quanto
à relevância – ressaltada por Jorge Hage – da decisão da ministra Carmen Lúcia,
presidente do TSE, de estender para todo o país (já valia numa zona eleitoral
do interior do Maranhão, por decisão do juiz local) a divulgação das doações de
empresas ou pessoas físicas aos candidatos e aos partidos antes das eleições e
não depois, como se fazia, é indiscutível e se insere no “clima” criado com a
Lei de Acesso à Informação.
Só
não concordo com o otimismo do ministro Hage de que a “total vedação do
financiamento empresarial do acesso aos cargos eletivos”, que realmente está na
raiz da corrupção, mas nem de longe é fator exclusivo dela, tenha grande
relevância. Afinal, a vedação não elimina o caixa dois. Este já é vedado e está
aí, inabalável.
= = = = = = = = = = = = = = = = = =
=
Este artigo foi publicado
originalmente na Tribuna da Bahia desta quarta.
Ivan de Carvalho é jornalista
baiano.