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(Millôr Fernandes)

sábado, 25 de novembro de 2023

Ditadura de 64 —Em conjunto com família de Marçal de Souza, MPF requer anistia política do líder indígena, assassinado há 40 anos

Sábado, 25 de novembro de 2023

Divulgação

Do MPF
Para o procurador da República Marco Antônio Delfino, atos praticados por agentes públicos contra Marçal tiveram motivação política

“Marçal de Souza foi vítima de um crime que não faz senão evidenciar a persistência de um cenário brasileiro marcado por colonização e dominação violenta, no qual a história e a memória dos grupos sociais locais são frequentemente apagadas”. A constatação está presente em pedido de anistia apresentado pelo Ministério Público Federal (MPF) junto da família do líder indígena nesta sexta-feira (24). O pedido foi lido durante o evento Marçal, Presente: Memória dos 40 Anos do Assassinato de Marçal de Souza Tupã’i, que faz referência às quatro décadas do assassinato do indigenista, ocorrido em 25 de novembro de 1983.

O pedido de anistia tem como propósito reparar parte dos prejuízos causados à família de Marçal de Souza pela perseguição praticada por agentes do Estado contra ele. O líder indígena era servidor da Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai) e, além de ameaças e agressões de seus superiores, sofreu arbitrária remoção de sua lotação em razão de seu posicionamento político e ativismo em defesa dos direitos dos povos Guarani e Kaiowa. Ele também foi alvo de permanente e ilegal monitoramento pelos órgãos estatais de inteligência. As provas que compõem o pedido de anistia constam de dossiê da Funai e outras informações de órgãos oficiais que atestam a perseguição sofrida por Marçal de Souza.

De acordo com o procurador da República Marco Antônio Delfino, as provas evidenciam, portanto, a motivação política dos atos administrativos praticados contra o líder indígena, pressuposto para a concessão da anistia. Deste modo, considera urgente que o Estado brasileiro reconheça essas violações e, com base na Lei 10.559/2002, conceda anistia política “post mortem” a Marçal de Souza. Além da concessão de anistia, o MPF também recomenda a reparação econômica aos familiares dele, tendo em vista que os atos de exceção provocaram sua desestruturação, colocando em risco, portanto, os membros de sua família.

Por fim, o MPF requer a implementação de medidas que viabilizem comunicação efetiva e capaz de disseminar a trajetória de Marçal de Souza e sua luta frente a defesa dos direitos fundamentais dos povos originários. “A tragicidade desse evento ressalta a necessidade premente de abordar questões inerentes aos direitos fundamentais, especificamente o direito à memória, verdade, justiça e reparação”, aponta Marco Antônio Delfino.

Anistia – A Lei 10.559/2002, que dispõe sobre o regime do anistiado político, oferece os parâmetros e as diretrizes fundamentais quanto à constituição da anistia e quanto aos seus efeitos. Em seu artigo 8º, a norma prevê que “é concedida anistia aos que, no período de 18 de setembro de 1946 até a data da promulgação da Constituição, foram atingidos, em decorrência de motivação exclusivamente política, por atos de exceção”.

No caso de Marçal de Souza, observa-se que seu ativismo político já era alvo de críticas e ameaças desde, aproximadamente, 1970. De acordo com o MPF, os atos administrativos praticados por agentes públicos para prejudicá-lo constituem abuso de poder. Desse modo, a Lei 10.559/2002 deve ser aplicada para garantir a devida reparação, sob a forma de compensação, aos familiares de Marçal de Souza, defende o MPF.