Imprensa é oposição. O resto é armazém de secos e molhados."

(Millôr Fernandes)

quinta-feira, 12 de julho de 2012

Mudança de percepção


Quinta, 12 de julho de 2012
Por Ivan de Carvalho
Depois dos oito anos de mandato de Lula e já transcorrido ano e meio do mandato da presidente Dilma Roussef, alguns observadores começam a identificar o que se poderia chamar, numa classificação simplista, de fadiga em relação ao PT.

            Mas não se trataria somente de uma fadiga devido ao já longo tempo de mando petista e da certeza de que este mando vai, no mínimo, chegar aos 12 anos.

            Seria o início de uma conscientização, em segmento da sociedade que esteve e pode ainda parcialmente estar sensibilizado pelo PT e suas lideranças, de que este partido já não exibe em relação aos demais o diferencial que apresentava antes de chegar ao poder e que foi, gradualmente, atraindo simpatias.

            Em outras palavras, ganha terreno uma mudança percepção: o PT de hoje não é o mesmo dos tempos em que estava na oposição. Ele, em muitas coisas, tornou-se igual àqueles partidos aos quais se opunha ou com os quais concorria. E, quanto a outras coisas, até acrescentou algumas inovações que podem ser consideradas defeituosas e que os outros partidos não apresentavam, pelo menos publicamente.

            Um exemplo marcante quanto a esta última ordem de coisas é a mobilização que vem sendo feita e, mais do que isso, a que já vem sendo anunciada para defender os réus do Mensalão, o maior escândalo de corrupção da história brasileira. Essa mobilização ocorre, organicamente, dentro do PT, como também em seus braços sindical e de movimentos sociais, comandados geralmente por filiados ao partido. A Central Única dos Trabalhadores (CUT) anunciou que vai às ruas defender a absolvição dos réus a serem julgados a partir do dia 2 de agosto pelo Supremo Tribunal Federal.

            Parece que a CUT – e não demora para aparecerem na mesma esdrúxula mobilização também o MST dos sem-terra e o MST dos sem teto, entre outros – está considerando o julgamento pela mais alta corte de justiça do país alguma espécie de Fla-Flu, sem qualquer preocupação sobre a culpabilidade ou não dos réus. Se a CUT e o PT (pela voz de tantos, mais recentemente do seu presidente nacional, Rui Falcão) já os julgaram, o que há de querer, então, o STF metendo o bedelho no caso?

            Essas coisas podem estar começando a saturar uma opinião pública que via no PT uma alternativa ética e já começa a convencer-se de que o partido perdeu o seu foco anterior à chegada ao poder federal. Isso se reflete nos Estados, naturalmente e a esta dificuldade somam-se outras, eventuais. Os ventos que sopravam a favor na economia em quase todo o governo Lula – e que lhe permitiram transformar os reflexos da crise norte-americana em uma “marolinha” um pouco mais forte do que foi apresentada pelo governo – agora sopram contra.

            Dificuldades com retração no consumo, com inflação, com inadimplência, com a queda nas projeções de crescimento do PIB, com o custo da dívida pública, com alguns orçamentos estaduais – como ocorre na Bahia, onde leva à impossibilidade de atender expectativas da população e reivindicações setoriais – tudo isso soma-se àquela percepção de âmbito nacional sobre o desvio do partido do governo quanto a seu antigo foco ético.

            Considere-se, para completar o quadro, a perspectiva de uma longa crise econômica na “zona do euro” que, somando-se à lenta e reticente recuperação norte-americana, já afeta economias como as da China, Rússia e Índia. Isso não é bom para o Brasil nem para quem o esteja governando.
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Este artigo foi publicado originalmente na Tribuna da Bahia desta quinta.
Ivan de Carvalho é jornalista baiano.